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Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil.

 

[Remi Barroux, Le Monde / Tradução de Clarisse Meireles/Carta Maior – 22.03.2017]    O exercício é sempre delicado: destacar os progressos realizados nas últimas décadas no que diz respeito ao desenvolvimento humano no nível global e, ao mesmo tempo, alertar sobre os novos perigos que o ameaçam. No “Relatório do Desenvolvimento Humano 2016”, apresentado nesta terça-feira, 21 de março, em Estocolmo, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) tenta dar conta, na justa medida, das duas coisas.

 

“Temos que mirar nos avanços para encorajar aqueles que tomam iniciativas e adotam boas políticas públicas, por exemplo, mas é preciso assinalar os riscos significativos, os elementos de ruptura”, explica Magdy Martínez-Soliman, Subsecretário Geral das Nações Unidas e Administrador Assistente do PNUD. “É preciso reconhecer que, para um grande número de pessoas, a globalização é um fracasso”.

 

A edição de 2016 do relatório também permite verificar o cumprimento dos compromissos assumidos no âmbito dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (2000) e dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (2015).

 

Progresso durante 25 anos

Os autores lembram, primeiramente, os inegáveis progressos em termos de desenvolvimento humano alcançados nos últimos 25 anos: recuo da mortalidade infantil em mais de 50%, com 43 mortes por mil nascimentos em 2015 contra 91, em 1990; redução da pobreza extrema, com a saída de um bilhão de pessoas da categoria, redução na incidência do vírus da AIDS, da malária e da tuberculose, entre outros. Tantos avanços comprovam, lembra o PNUD, que “mudanças fundamentais são possíveis.”

 

Mas estes progresso não conseguem esconder as novas ameaças. “Alguns desafios permanecem (as privações), outros se agravam (as desigualdades), e outros surgem (os extremismos violentos), mas a maioria se reforça mutuamente”, escrevem os autores. “As mudanças climáticas, por exemplo, comprometem a segurança alimentar, e a rápida urbanização marginaliza os pobres das cidades.”
Em todos os países, sejam economias avançadas ou emergentes, grupos populacionais inteiros continuam à margem das metas de desenvolvimento. Magdy Martínez-Soliman identificou sete: “Para as mulheres, em geral, a igualdade de gênero está longe de ser alcançada no que diz respeito ao acesso à educação e aos salários e, acima de tudo, não conseguimos erradicar uma violência sexista cada vez  mais acentuada “, observa.
Os povos indígenas e as minorias étnicas também são vítimas de discriminação, muitas vezes excluídos do sistema educacional, do emprego, das funções administrativas e políticas. “Em 2012, 51% dos das minorias étnicas do Vietnã viviam na pobreza multidimensional, para apenas 16,5% dos grupos étnicos majoritários (Kinh [Viets] ou Hoa)”, indica o PNUD.

 

Conflitos regionais e intranacionais

Somam-se a estes grupos mais de um bilhão de pessoas portadoras de deficiências, “muitas vezes privados dos direitos mais básicos”, os refugiados e os migrantes – 244 milhões de pessoas no mundo vivem fora do seu país natal e 65 milhões vivem em situação de deslocamento forçado – e as comunidades lésbicas, gays, bissexuais e transexuais (LGBT), também em situações de exclusão. “Em uma dúzia de países, as pessoas LGBT correm risco de pena de morte”, lembrou o Administrador Adjunto do PNUD.

 

Os desafios permanecem, portanto, colossais. Mas, globalmente, o principal risco em 2016 parece ter sido o aumento da violência, marcada por conflitos regionais, mas também as tensões intranacionais. “O mecanismo de exclusão mais direto é, sem dúvida, a violência. Ela pode ser motivada pela consolidação do poder político, pela proteção do bem-estar das elites, pelo controle da distribuição dos recursos, pela tomada de territórios e de recursos e pela promoção de ideologias baseadas na supremacia de uma identidade e de um conjunto de valores”, escreve o PNUD.
A prioridade, para além do desenvolvimento econômico, que já não é sinônimo de bem-estar para a ONU, consiste em garantir a autonomia e as oportunidades de expressão a estes grupos marginalizados e excluídos da globalização. É preciso garantir o crescimento para todos e promover a inclusão, mas dando-lhes, como precisa o PNUD, “a possibilidade de serem ouvidos, para reivindicar seus direitos”.
Mais concretamente, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento apresenta algumas ideias de investimentos prioritários, tais como “programas de refeições escolares”. Eles estão no cerne de questões tanto de segurança alimentar quanto de nutrição e proteção social. “Pode ser um forte incentivo à escolarização infantil, como demonstrado por inúmeros programas na África”, afirmam os autores do relatório.

 

Ameaça das mudanças climáticas

O relatório dedica parte importante à necessidade de combater as alterações climáticas, que “ameaçam as vidas e os meios de subsistência das populações pobres ou marginalizadas”. “As mudanças climáticas são a maior ameaça à raça humana”, explica Juan Manuel Santos, presidente da Colômbia e Prêmio Nobel da Paz de 2016, em contribuição especial anexa ao relatório, destacando o investimento de seu país no crescimento verde.
O PNUD insiste, por sua vez, na necessidade de incentivar políticas de tarificação do carbono, de supressão de subsídios às energias fósseis ou ainda da definição de um “custo social do carbono”. Essas políticas não podem, no entanto, ser reduzidas a cálculos de tarifas ou subsídios. É necessário planejar as políticas de transporte, de urbanização, do uso do solo, a eficiência energética e as técnicas agrícolas inteligentes do ponto de vista do clima.
E como explicar às populações vulneráveis, %u20B%u20Bnos países atingidos pela crise, a contribuição que a chegada de migrantes pode representar? O relatório sugere que as políticas nacionais sejam complementadas por ações globais, para que as paixões possam ser superadas.