danielblake

[Por Sérgio Domingues] Ken Loach tem 80 anos, 30 filmes e muita coerência política. Suas produções procuram denunciar as contradições e crueldades do capitalismo, sem serem aborrecidas ou apocalípticas. Além disso, ele sabe colocar o dedo em algumas feridas da esquerda socialista, com sua tendência ao autoritarismo e burocratização.

Loach gosta de lembrar um ditado inglês segundo o qual “você não pode ficar neutro entre os bombeiros e o fogo” para dizer que, muitas vezes, é preciso ficar do lado do fogo. É o que mais uma vez ele demonstra com “Eu, Daniel Blake”, filme que recebeu uma Palma de Ouro em Cannes.

A trama mostra o calvário vivido por um marceneiro veterano diante do sistema de seguridade inglês em tempos neoliberais. Impossibilitado de trabalhar por problemas cardíacos, Daniel é jogado num labirinto burocrático que o impede de fazer valer seus direitos. Viúvo e sem descendentes, o que o alivia de seus tormentos é a convivência com uma mãe solteira e seus filhos, para quem se torna pai e avô.

Se o final é triste, não é pessimista. Em meio a tantas dificuldades e injustiças, Daniel e sua família de adoção ainda encontram várias pessoas solidárias na medida de suas possibilidades. São pontos iluminados que abrandam a escuridão que oprime. Alguns povos antigos achavam que as estrelas eram buracos na casca negra da noite. Por eles, a luz diurna continuava a vazar insistentemente. É assim que brilha o cinema de Ken Loach.