Por Marina Schneider-NPC

A lembrança do papel informativo e de formação política da  revista Cadernos do Terceiro Mundo emocionou muitos participantes do 19o Curso Anual de Comunicação do NPC na noite do dia 20. A jornalista Beatriz Bissio, uma das fundadoras, diretoras e editoras da revista, fez uma apresentação com base na experiência da publicação, que existiu de 1974 a 2006 e foi pioneira na inversão dos fluxos comunicativos, promovendo uma aproximação e um conhecimento mútuo entre os “países do Sul” – da América Latina, da África e da Ásia. Bissio participou da mesa “A mídia da burguesia, a nossa e a formação das ideias” ao lado do também jornalista Gilberto Maringoni.

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 “Cadernos do Terceiro Mundo marcou um jornalismo de combate às ditaduras, mas era uma revista carregada de todo um ideário que queria contestar não somente as próprias ditaduras, mas sobretudo a forma como chegava a nós – e continua chegar – a visão de mundo”, apontou a jornalista.  Ela lembrou o contexto dos anos 1970 em que, no marco do movimento dos países não alinhados, passou a ser discutido o tema da eliminação das assimetrias dos fluxos informativos e se fortaleceu a crítica à falta de pluralidade das agências de notícias dos países ricos.

Este cenário foi detectado por meio de uma pesquisa extensa, ratificada pela Unesco em 1980 com a publicação do Relatório MacBride “Relatório MacBride – um mundo, muitas vozes”. O texto já destacava a importância de que países da África, América do Sul e Ásia pudessem mostrar as suas visões de mundo para que houvesse diversidade de informação. “O relatório é uma referencia com a qual ainda podemos trabalhar, não precisamos  reinventar a roda”, apontou, lembrando que ainda é extremamente necessário democratizar as comunicações no Brasil e no mundo.

A mídia da burguesia e a disputa pela democratização

Em sua exposição, o jornalista Gilberto Maringoni fez uma análise sobre a mídia da burguesia e discutiu o atual estágio da luta pela democratização da comunicação.  Ele apontou que a mídia burguesa tem grande capacidade de produzir sua comunicação, tanto porque tem recursos financeiros para isso, como também por ser detentora da imensa maioria dos veículos. “Eles passam a impressão de que estão defendendo a sociedade inteira quando de fato estão defendendo os interesses da burguesia”, avalia.

Maringoni lembrou que há programas de grande qualidade informativa em alguns veículos desta mídia e que isto acontece justamente para que ela possa se legitimar e, ao mesmo tempo, impor uma linha editorial sem que fique explícito para a maior parte da sociedade que ela está defendendo os interesses da classe dominante. O jornalista apontou, ainda, que não existe mídia burguesa sem o Estado, que concede financiamentos, isenções fiscais e ainda investe em publicidade nesses veículos. “A mídia privada no Brasil vai muito bem porque os governos sempre deram todo o apoio a ela”, disse.

Apesar deste contexto, Maringoni avalia que vivemos hoje uma janela de oportunidade para avançar na luta pela democratização da mídia. Ele explica que a queda de audiência da televisão e da tiragem dos veículos impressos, os meios comerciais estão trilhando uma grande disputa por verbas que pode virar uma oportunidade para ampliar as mídias populares e abrir a discussão da democratização da comunicação. Mas o protagonismo da sociedade civil, no entanto, é fundamental para que isto ocorra. “Se formos contar com Paulo Bernardo ou Helena Chagas a democratização da comunicação não vai adiante. Precisamos fazer a campanha sabendo que não vamos contar com o apoio do Estado”, alertou.