Por Celso Vicenzi

 

Celso Vicenzi – Quais os primeiros registros das lutas dos trabalhadores no Brasil?

Vito Giannotti – A primeira greve que eu conheço é a dos gráficos de dois jornais da capital, Rio de janeiro, em 1858. O que achei interessante é que durante a greve , os trabalhadores criaram seu próprio jornal, o Jornal dos Tipógrafos. Esse fato me lembra de outro muito importante. Em 1919, no Brasil, existiram dois jornais diários. Em São Paulo foi A Plebe, e no Recife A Hora Social. Durante mais de um mês, os dois foram vendidos em banca e logo em seguida, o governo e os patrões mandaram a polícia invadi-los e fechá-los. Mas ficou a lição da grande importância que já os primeiros operários, no Brasil, como no resto do mundo, davam à comunicação das suas idéias.

 

Celso – Quais foram as principais mudanças nas formas de enfrentar o grande capital?

Vito – Os trabalhadores lutavam conforme o momento exigia. No começo da industrialização, o liberalismo dominante entre a classe burguesa, não admitia nenhum tipo de lei. A doutrina era deixar “totalmente livres” as forças produtivas, isto é o capital e o trabalho. Na prática era liberdade de exploração total. Na fase seguinte, após-30, com Getúlio Vargas, a prática da burguesia mudou. Passou a fazer um monte de leis, mas junto com elas vinha o controle dos sindicatos pelo governo. Os trabalhadores lutaram de maneira diferente nesta nova conjuntura.

Mas o que importa é que sempre lutaram contra a exploração capitalista nas mais variadas situações.

 

Celso – O mundo moderno trouxe a divisão do trabalho e, atualmente, cresce a substituição da mão-de-obra humana por máquinas informatizadas. Como será a luta dos trabalhadores neste contexto?

Vito – Primeiro quero combater a idéia bastante difundida pela classe dominante, de que hoje, nesta nova situação, “o trabalho acabou”, “a classe operária acabou” “, os trabalhadores estão desaparecendo”. Por trás destas idéias há uma visão ideológica de que a luta de classe acabou, o capitalismo venceu e os trabalhadores devem aceitar de cabeça baixa a lei do capital.

 

Este é o caminho para justificar  discurso do que o socialismo acabou, o capitalismo venceu e a única coisa que temos que fazer é aceitar esta situação e se contentar com as migalhas que as chamadas “elites” vão deixar cair de suas fartas mesas.

Primeiro precisamos entender muito claramente que nos últimos 50 anos o capitalismo e o modo de produção capitalista se modificou grandemente.

 

Novas máquinas, novas matérias primas, novos métodos de gerenciamento do trabalho. É o que chamamos de reestruturação produtiva. Esse fato novo trouxe enormes mudanças seja nos métodos de produção, na organização do trabalho e também na mentalidade, isto é na ideologia dos trabalhadores.

 

Mas não podemos nos iludir: o trabalho, mesmo com todas as máquinas moderníssimas, continua. Mudaram muito as profissões, toda a estrutura do trabalho, é verdade.

 

Mudaram as profissões, os métodos de trabalho, a remuneração, muita coisa, enfim. Mas o que fica cada vez mais claro pé que o capital precisa de milhões e milhões de miseráveis que façam funcionar toda a máquina capitalista nos milhares de funções que se criaram. O que fica claro é que o neoliberalismo reinante hoje em dia é mais cruel do que antes. O liberalismo de hoje não é nada mais do que o velho capitalismo livre para oprimir e explorar a vonta, graças ao enfraquecimento cda classe trabalhadora, de seus partidos e dos próprios sindicatos.

 

A luta dos trabalhadores certamente será bem mais dura. E já é mais difícil. Mas é preciso buscar retomar os fundamentos desta sociedade capitalista e aplicá-los às mudanças de hoje e ver como combater o inimigo de classe. Ele mudou a cara, se disfarçou, muitas vezes, mas continua o mesmo inimigo de sempre. Uma das principais tarefas das lideranças sindicais e de esquerda, neste momento, é exatamente ter este papel de formação, de reflexão com a classe trabalhadora e preparar os novos combates.

 

Celso –  O que o brasileiro não sabe ou esqueceu sobre a luta dos trabalhadores de seu país?

Vito – Na verdade nós todos sabemos muito pouco. A gente lê muito pouco, estuda pouco. Primeiro pela tradição geral do nosso país. Em segundo lugar porque as lideranças se deixam tomar pelo ativismo. Fazer isso e aquilo e não refletir. Não estudar a história da nossa classe, no Brasil e no Mundo. Quer ver duas lições que a gente pode tirar do estudo? Em 1919, no Rio de Janeiro, os trabalhadores da capital fizeram uma manifestação do 1º de Maio, com mais de 60 mil pessoas, reunidas na Praça Mauá.

 

Veja só, o Rio tinha pouco mais de 600 mil habitantes. Isto significa que havia naquele 1º de Maio, 10% da população da capital na manifestação. E hoje, a quantas andam nossos 1º de Maio? E preste atenção, não havia nem Zezé de Camargo e nem Zeca Pagodinho para chamar o povo. Era manifestação de verdade.

Outra lição da história mundial. Em 1886, na véspera do 1aio de 1886, em Chicago (EUA) um panfleto foi colocado clandestinamente debaixo das portas dos operários daquela cidade. Estava começando uma dura greve para conquistar as 8 horas diárias. Pois bem, no panfleto estava escrito: “A partir de hoje, nenhum operário deve trabalhar mais do que 8 horas por dia. 8 horas de trabalho, 8 para o descanso e 8 para a educação”. Veja só. Não estava escrito para lazer e sim, “para educação”. Olha que lição podemos tirar? Estes são dois exemplos das centenas de lições a tirar da nossa história, se a gente se dispuser a conhecê-la.