rene_silva

[Por Daiene Mendes e Cecilia Olliveira (The Intercept)] – Dois jornalistas do veículo independente Voz da Comunidade foram detidos na manhã do sábado (01/10) quando cobriam a violenta remoção da Favelinha da Skol, no Complexo do Alemão, zona norte do Rio de Janeiro. Rene Silva e Renato Moura, claramente identificados como repórteres, não cumpriram a ordem dos policiais militares de desligar os equipamentos e foram enquadrados por desacato e desobediência e levados para 45ª Delegacia.

 

Os policiais estavam retirando moradores que tinham reocupado o terreno onde suas casas foram demolidas pelo estado, depois de pararem de receber o aluguel social que foi acordado para que saíssem da área. No vídeo do Voz da Comunidade é possível ver os soldados botando fogo nos pertences dos moradores. Uma testemunha não nomeada relata que os policiais bateram nos moradores e usaram gás de pimenta durante a remoção. Questionados pelo The Intercept Brasil sobre a truculência da ação a PM respondeu que “após rápida negociação, as pessoas se retiraram sem a necessidade de uso progressivo da força e ou armamento não letal”, mas se recusou a informar se tinham mandado de reintegração de posse.

Logo depois, policiais irritados com a presença dos jornalistas e com a insistência destes em cumprir o que lhes é garantido pela lei de liberdade de expressão — e imprensa —, deram um tapa no celular de Rene Silva, no momento em que ele realizava uma transmissão ao vivo pela página do jornal. A denúncia da prisão foi feita ao vivo na página de Facebook do Coletivo Papo Reto.

“Eu sabia que não estava fazendo nada de errado. O policial jogou o meu celular no chão, com um tapa, e depois ficou com o aparelho. No momento que eu tentei pegar meu telefone para continuar a transmissão ao vivo, ele me deu voz de prisão por desobediência e me algemou. Quando eu já estava imobilizado, um outro policial disparou spray de pimenta na direção dos meus olhos”, conta Silva ao The Intercept Brasil.

A prisão dos jornalistas foi totalmente arbitrária e mostra que a polícia vem usando desta tática para coibir que seus atos ilegais sejam veiculados, nota o advogado Luan Cordeiro, que vem atuando junto à manifestações populares desde 2013. “Os policiais militares deram voz de prisão aos jornalistas sobre a justificativa de desobediência e desacato”, relata Cordeiro. “O que na verdade ocorreu, foi uma clara violação à dois direitos essenciais em uma democracia: o da liberdade de expressão, das pessoas que estavam protestando contra a desocupação e é o da liberdade de imprensa que cobria a operação da Polícia Militar.”

Outros jornalistas que estavam no local e continuaram gravando na hora em que Silva e Moura foram detidos não foram presos. Após quatro horas, os dois foram liberados. Rene Silva e Renato Moura vão responder por crime de desobediência e serão investigados por esbulho possessório (invasão de propriedade), conforme o relato do delegado Fábio Asty, titular da 45ª DP, ao jornal O Globo.

“É urgente frear essa situação bizarra de perseguição à quem atua nos campos da comunicação independente e direitos humanos.”

Logo após a liberação dos jornalistas, a tensão no lugar voltou, com a polícia jogando gás de pimenta e usando balas de borracha para dispersar as pessoas. Carlos Coutinho, videojornalista e membro do Coletivo Papo Reto, foi atingido por duas balas de borracha, uma na perna e outra na costela, de acordo com ele, por um policial que tinha o ameaçado em frente à delegacia, quando ele filmava a soltura dos detidos.

“Quando chegamos na delegacia, alguns policiais, tanto da militar quanto da civil, perguntaram se a gente era do Coletivo [Papo Reto], se trabalhávamos com o Raull [Santiago]”, disse Silva, que fundou o Voz da Comunidade há 11 anos e atua como editor-chefe.