Esses comentários foram colhidos de um grupo de dez pessoas de 30 a 50 anos, recrutadas na periferia de São Paulo, com renda de até dois salários mínimos. Estavam indefinidos em relação à disputa de outubro. Mal conheciam Geraldo Alckmin e não tinham qualquer predisposição contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva até serem expostos à edição de um curto programa eleitoral de televisão montado a partir de imagens da propaganda partidária dos dois candidatos exibidas ao longo do ano.

Apesar do tom crítico durante o debate que se seguiu à exibição do programa de mentirinha, nenhum deles se declarou indiferente às eleições. O grupo é uma amostra das dificuldades que a campanha dos dois candidatos terá a partir da próxima terça-feira, quando se iniciará a propaganda eleitoral gratuita.

O interesse, medido pelo Datafolha, está abaixo da última campanha presidencial e no mesmo patamar da de 1998, a outra com reeleição. O cientista político Luiz Lourenço, pesquisador do Iuperj e estudioso do tema, tem os dados: naquele ano e hoje, metade dos entrevistados demonstravam algum interesse pelo horário eleitoral. Em 2002, disputa marcada pelo discurso da mudança, esse patamar subiu para 70%.

A disposição para assistir o programa, no entanto, é superior ao interesse demonstrado. O horário eleitoral gratuito, sustenta Lourenço, é um dos programas de maior audiência da televisão brasileira. Tem mantido o patamar do Jornal Nacional, na faixa dos 40% de audiência.

Apenas três em cada dez entrevistados pelo Datafolha disseram que não pretendem parar uma única vez em frente à TV nesse período. O eleitor típico, até porque presume o que vai encontrar, não está morrendo de interesse, mas vai assistir. O eleitor de Lula está mais ligado na perspectiva do horário eleitoral do que o de Alckmin. O da senadora Heloísa Helena é o mais desinteressado dos três.

A prevalecer o padrão da eleição de 1998, as perspectivas parecem mais favoráveis ao candidato da situação. Naquele ano, o número de indecisos teve uma queda diária de um ponto percentual nos dez primeiros dias do horário eleitoral. Quase todos foram para o então presidente e candidato à reeleição Fernando Henrique Cardoso, que também viu a avaliação de seu governo melhorar nesse período.

Há duas diferenças que desautorizam a transposição daquela campanha para a atual. A primeira, que incensa Lula, é que a economia brasileira ao final do primeiro mandato FHC estava praticamente estacionada, tendo fechado o ano com um crescimento do PIB em 0,1%. Este ano, o Banco Central prevê 4% de crescimento. A segunda, que incensa a oposição, é que a corrupção não foi tema central de campanha como tem sido nesta.

É aí que entra a maior incógnita do palanque televisivo. Há poucas dúvidas de que a campanha negativa será fartamente usada nesta campanha. Foi assim que, em 2002, José Serra desidratou Ciro na TV. Foi assim também que Mário Covas, quatro anos antes, bateu Paulo Maluf no segundo turno para o governo de São Paulo.

A diferença é que, apesar de a corrupção vir sendo fartamente explorada há 15 meses, as curvas de popularidade do governo e da candidatura Lula são ascendentes.

A evolução das intenções do candidato da situação parecem guardar uma relação mais estreita com a avaliação de governo do que com qualquer outra variável. A proporção de pessoas que avalia o governo Lula como ótimo/bom é duas vezes superior àquela que, neste mesmo período do ano (ver gráfico abaixo), o faziam em relação ao governo FHC.

Se a insatisfação com FHC foi o motor da vitória de Lula em 2002, a avaliação de seu governo também ajuda a explicar a curva do candidato de oposição. A última pesquisa Datafolha não tem uma única boa notícia para Alckmin e ainda abre brechas para piorar – o Sul, única região em que o tucano bate Lula, emerge com o eleitorado menos definido de toda a campanha. Vem daí a percepção de que o horário eleitoral gratuito talvez não tenha escapatória. Não faz o gênero do candidato nem de seus estrategistas, mas eles têm pouco a perder na arriscada aventura da pancadaria.