[Por Marina Schneider]

Vito Giannotti, Pedrinho Guareschi, Cristian Goes, Reginaldo José e Kleber Mendonça

Vito Giannotti, Pedrinho Guareschi, Cristian Goes, Reginaldo José e Kleber Mendonça

Críticas ao jornalismo sensacionalista, poder de influência das novelas e rádio comunitária como alternativa de veículo realmente informativo foram os principais temas da mesa que discutiu Indústria Cultural na tarde de quinta-feira (22.11), durante o 18º Curso Anual de Comunicação. Participaram da mesa o jornalista de Sergipe, Cristian Góes, o professor da PUC do Rio Grande do Sul, Pedrinho Guareschi, o comunicador da Rádio Heliópolis, de São Paulo, Reginaldo Gonçalves, e o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), Kléber Mendonça.

Cristian Goes

Cristian Goes

 

Cristian Góes, que participou do primeiro curso do NPC, em 1994, quando ainda era recém-formado, dividiu com a plateia as ideias e conhecimentos obtidos a partir da pesquisa acadêmica que realiza sobre o sensacionalismo na imprensa. Segundo ele, o sensacionalismo compõe um processo de seleção, narrativa e forma de exposição para atrair, ampliar e manter a audiência, mas vai além de uma simples técnica de redação, forma específica de cobertura ou estratégia para aumentar vendas. Para Cristian, um dos tipos de sensacionalismo é o que ele chamou de sensacionalismo de classe, “aquele que atua no controle, na moral econômica e na punição das pessoas pobres”.

Telejornais policiais

Como exemplo deste tipo de sensacionalismo ele citou diversos jornais policiais cujos trechos de matérias foram exibidos durante a mesa. “Estes jornais têm altíssimas audiências nas camadas populares, onde não conseguimos chegar”, lamentou. O jornalista questionou hipótese de que os meios de comunicação invisibilizam a pobreza. “Na verdade temos uma visibilidade programada para criminalizar. Os pobres estão encarcerados nos nossos jornais, têm páginas e programas específicos: os policiais” criticou. “Nestes programas nós não vemos ricos. Vemos pobres. É um recorte de classe”, completou. Na avaliação de Cristian é preciso entender a mídia comercial como um aparelho ideológico de controle das classes mais pobres. “Precisamos participar do processo de rejeição a esses programas que criminalizam a pobreza”, concluiu.

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Kleber Mendonça

Também fazendo uma análise sobre programas policiais, o professor da UFF Kléber Mendonça, avaliou que o Linha Direta, programa que exibido pela Rede Globo, era uma mescla de produto informativo com entretenimento e ficção, já que relatava fatos reais, utilizava trilhas sonoras e encenações. “O programa acabou, mas a proposta discursiva dele se mantém em outros programas”, explicou, lembrando que o jornalismo constrói seus efeitos de verdade utilizando uma trilha sonora e a figura centralizadora de um apresentador reacionário, por exemplo. Atualmente Kléber estuda o RJ TV, telejornal local transmitido diariamente também pela Rede Globo ao meio dia. De acordo com o professor, o programa comemora a chamada pacificação das favelas do Rio de Janeiro, mas silencia sobre os problemas decorrentes desse processo. “O comentarista de segurança pública Rodrigo Pimentel participa do jornal para legitimar, como especialista, as ações do Estado”, constatou. Segundo ele, o jornal quer nortear a forma como as questões vão ser discutidas, mas devido ao fato de muitas matérias serem feitas ao vivo há brechas para que as fontes fujam do condicionamento da pauta previsto pelos jornalistas. Kléber defende que além de produzirmos nossos próprios conteúdos também precisamos desconstruir por dentro estas coberturas através da interação discursiva.

Pedrinho Guareschi: Nunca uma novela é neutra

Pedrinho Guareschi

Pedrinho Guareschi

“Quem diz que não é influenciado pela mídia está mentindo, pois nós somos um misto das interações que vivemos”, afirmou o professor da PUC-RS, Pedrinho Guareschi. Lembrando que a mídia constrói a realidade com valores e pauta a agenda, ele aproveitou para criticar o monopólio dos meios de comunicação no Brasil. “Cerca de 80% de tudo o que o gaúcho vê, ouve ou lê vem de uma única família”, disse, se referindo ao grupo RBS, que pertence à família Sirotsky e atinge Santa Catarina e Rio Grande do Sul com emissoras de TV e rádio, jornais e portal de internet. “Se a mídia continuar nas mãos de poucos vai continuar tendo o poder de dizer o que é ou não realidade”, advertiu. Após a exibição de um trecho de capítulo da atual novela das 20h da TV Globo, Salve, Jorge!, Pedrinho ressaltou que na novela o cotidiano das pessoas é mais elaborado, o que a transforma em uma forte ferramenta de construção de valores. “Nunca uma novela é neutra. Se pararmos para pensar um pouco veremos o que há por trás”, disse. Para ele, a exaltação do Exército nesta novela, por exemplo, está servindo como uma resposta à criação da Comissão da Verdade. Pedrinho aposta que em breve será veiculada alguma novela construída para tentar legitimar também as ações da Aeronáutica, setor muito violento durante a ditadura militar no Brasil. Segundo ele, é preciso começar a se admirar diante das coisas mais que são aparentemente simples. “Vivemos cercados de mídia por todos os lados e precisamos refletir sobre ela”, concluiu.

Em contraposição à indústria cultural tradicional, a experiência positiva da Rádio Comunitária Heliópolis

Reginaldo José

Reginaldo José

O comunicador Reginaldo Gonçalves, da Rádio Comunitária Heliópolis fez um histórico da trajetória da emissora, que nasceu em 1992 ainda no sistema de rádio corneta, com transmissão da programação por alto faltantes espalhados por Heliópolis, maior favela do Brasil. “A rádio surgiu para ampliar o debate sobre a qualidade de vida na comunidade, que estava crescendo muito”, recordou Reginaldo. Em 1997 a rádio foi reinaugurada no sistema de dial, com frequência. Reginaldo contou que o que possibilitou isso foi uma visita de um grupo de alemães que achou muito interessante a forma com que a rádio conseguia articular a população e doou dinheiro para que pudessem começar a montar a rádio. “Hoje ainda é muito caro ter uma rádio comunitária por causa dos equipamentos”, lamenta. Como a maior parte das rádios comunitárias do país, pelo fato de ainda não ter outorga para funcionar, em 2006 a rádio foi fechada pela Anatel apesar de prestar serviços à comunidade e já ter se tornado uma referência. Hoje a situação da rádio já está legalizada e eles contam com 28 locutores, 90% deles moradores de Heliópolis. Hoje a rádio é transmitida na frequência 87,5 FM. “Todas as rádios comunitárias são obrigadas a ter essa mesma frequência e daqui a pouco vamos brigar entre nós. Isso é tudo o que o governo e a grande mídia querem”, lamentou Reginaldo.

“É através da rádio que a gente articula, organiza e realiza o debate sobre a comunidade com a própria comunidade. A rádio tem que informar a comunidade de seus direitos e deveres de cidadão”, destacou Reginaldo. Para ele, valorizar os artistas locais e divulgar os eventos da comunidade são ações fundamentais para a rádio comunitária. “A rádio tem que ser apartidária e não pode ter padrinho político. A programação tem que ter informação e prestação de serviços”, alertou Reginaldo. A rádio Heliópolis pode ser ouvida pela Internet no endereço http://www.heliopolisfm.com.br/.