[Por Sheila Jacob]
A violência simbólica contra as mulheres e a física contra os homossexuais foram algumas questões abordadas na noite de quinta-feira, 22 de novembro, durante o 18 Curso Anual do NPC. Participaram do debate Nalu Faria (Marcha Mundial das Mulheres) e Luiz Mott (Grupo Gay da Bahia). Nalu ressaltou que falar da discriminação e do estereótipo das mulheres, hoje, às vezes é difícil porque se criou uma estereotipação do próprio feminismo. “Parece que nós feministas não somos mulheres. Ou então, no caso do Brasil, como temos agora uma presidenta mulher parece que as críticas da ausência das mulheres no espaço público parecem infundadas”, observou.
A partir das reflexões de Luc Boltanski no livro O novo espírito do capitalismo, ela ressaltou que o capitalismo, em tempo de crise, procura incorporar elementos da crítica feita contra ele, ressignificando-os. “Em relação às mulheres, isso é muito visível. Um exemplo é a dimensão do trabalho e do salário. Houve uma crítica justa àquela imagem de que as mulheres deveriam ficar em casa e depender economicamente dos homens. Aí as mulheres foram incorporadas pelo mercado de trabalho, mas não com os mesmos direitos. São submetidas a rotinas desgastantes, têm que conciliar com as atividades domésticas, salários desiguais etc”. Para ela, é necessário lembrar que o patriarcado ainda é uma realidade. Ou seja: os homens têm poder e oprimem as mulheres, interferindo em seu trabalho, no seu corpo e na sua sexualidade. E, segundo ela, essa questão não pode ser desvinculada da sociedade de mercado na qual estamos inseridos, tempo em que as relações sociais e relações de trabalho são pautadas pela subordinação e coisificação das mulheres. “Continuamos a ser tratadas como objeto e como mercadoria”, ressaltou.
Segundo Nalu, os meios de comunicação são agentes estruturantes do patriarcado moderno. “Somos objetos de um discurso midiático que procura manter em sua centralidade essa ideia de subordinação e que também define as características da feminilidade: agradar, cuidar, dar prazer e ser competente”, ressaltou. Ela lembrou que a publicidade trabalha muito isso: reproduz a ideia de que a mulher tem que ser útil. Ela trabalha em casa o dia inteiro e à noite tem que estar “pronta e linda” esperando seu homem. “Esse é um discurso muitas vezes incompatível com a realidade, pois é essa mulher que tem que ser mãe, cuidar dos filhos. Agora que as mulheres se tornaram consumidoras, o mercado se voltou para elas, sempre com a ideia de um corpo que precisa ser constantemente ajustado. Os meios de comunicação têm sido o principal agente nessa construção”, observou. Ela lembrou como os programas humorísticos reforçam a imagem de mulher imbecilizada, que não raciocina. Para completar, disse que além de criticar a abordagem da mídia comercial, as mulheres que têm pensamento crítico sobre o assunto devem construir seus próprios meios, com sua linguagem própria e divulgando suas lutas. “Dizem que queremos acabar com a liberdade de expressão, mas sabemos que nessa situação de monopólio da mídia pelos setores dominantes tudo o que não temos é liberdade. Achamos importante gerarmos capacidade crítica de construirmos nossos próprios meios, pois a luta pela representação da mulher na mídia passa, antes, pela desmercantilização dos meios de comunicação”, concluiu.
Brasil é campeão em mortes de homossexuais
Luiz Mott abordou os desafios do combate à homofobia no Brasil, lembrando que a homossexualidade é tão antiga quanto a humanidade. “Ela é natural e universal, ou seja, existe na natureza, em todas as sociedades”, afirmou, citando várias sociedades que não eram homofóbicas, como os egípcios e os romanos da Antiguidade, além de povos africanos. O termo homofobia, segundo ele, só foi criado na década de 1960. “A homofobia é tão perversa que muitas vezes impede que um homossexual se assuma como tal. Gera também uma resistência à convivência social com um homossexual e causa inclusive violência física”. Ele explicou que esse preconceito vem de uma interpretação errada do texto bíblico de Sodoma e Gomorra. “Essa homofobia bíblica prende os gays no armário, marginaliza e extermina”. Como exemplos recentes ele citou o deputado Jair Bolsonaro, que afirmou que prefere ter um filho morto a ter um filho gay. “Também um pastor nos Estados Unidos disse que o furacão Sandy era castigo de Deus por causa dos homossexuais”, citou.
A questão fica séria quando essa homofobia resulta em morte. E o Brasil é campeão mundial de homocídios. No ano passado foram 266, e neste ano já são 301. “Esses são os números oficiais, sem contar aqueles que não foram denunciados. Infelizmente o governo não tem sabido agir com esse problema. Nossa sobrevivência está sendo ameaçada por falta de políticas públicas eficientes”, afirmou. Ele apresentou algumas soluções para erradicar esse problema: a criminalização da homofobia; promoção de políticas públicas afirmativas para a comunidade LGBT; e a superação da homofobia internalizada. “Os gays precisam sair do armário e afirmar sua identidade sexual”, ressaltou.
Durante a mesa foi feita uma singela homenagem a Lucas Fortuna, um jornalista de 28 anos encontrado morto recentemente no Cabo de Santo Agostinho (PE). Com marcas de espancamento, tudo indica que o jovem foi vítima da homofobia que ele tanto combateu.