O jornalista e professor Luiz Momesso acaba de relançar José Duarte – Um maquinista da história. O livro traça o percurso de lutas deste ferroviário comunista e militante do movimento operário que teve 36 prisões políticas, passando quase 17 dos seus 83 anos de vida encarcerado. A atuação de José Duarte se destacou tanto na organização sindical, nas primeiras décadas de militância, como também na luta contra a repressão, já no período da ditadura civil-militar. Nesta entrevista exclusiva ao Boletim NPC, Luiz Momesso nos conta sobre a vida de José Duarte, sobre o processo de construção e os objetivos deste livro.
Lançado pela primeira vez em 1988, esta segunda edição traz o depoimento de Henrique Francé, médico que cuidou de José Duarte no final de sua vida. Já aconteceram lançamentos em Goiânia, São Paulo e Rio de Janeiro. Nesta sexta-feira, 24, José Duarte – Um maquinista da história será lançado na Escola Popular Orocílio Martins Gonçalves, em Belo Horizonte, às 18h30. O livro está à venda na Livraria Antonio Gramsci, no Rio de Janeiro, por R$ 20. Informações pelo e-mail livraria@piratininga.org.br ou telefone (21) 2220 4623.
[Publicado em 22.05.13 – Por Marina Schneider – NPC]
O jornalista e professor Luiz Momesso acaba de relançar José Duarte – Um maquinista da história. O livro traça o percurso de lutas deste ferroviário comunista e militante do movimento operário que teve 36 prisões políticas, passando quase 17 dos seus 83 anos de vida encarcerado. A atuação de José Duarte se destacou tanto na organização sindical, nas primeiras décadas de militância, como também na luta contra a repressão, já no período da ditadura civil-militar. Organizou sindicatos em São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Ceará, liderando.
Nesta entrevista exclusiva ao Boletim NPC, Luiz Momesso nos conta sobre a vida de José Duarte, sobre o processo de construção e os objetivos deste livro. O autor explica as razões e o contexto das lutas das quais José Duarte participou para que se possa ter uma visão mais geral das lutas dos trabalhadores no século XX. “A ótica que eu tinha era fazer um livro não para exaltar uma figura, mas fazer um trabalho político”, explica. “Escrevi o livro em torno de uma vida que precisava ser preservada, mas é um trabalho com um objetivo político, uma tarefa política. Na minha ótica, a gente vai construindo a história e cada geração tem que assumir o que recebeu e colocar a coisa para frente. Estamos na nossa vez, construindo a história. José Duarte também construiu, foi um dirigente, um condutor. O conhecimento dessa história é importante para que as novas gerações continuem construindo a história. Temos que estar sempre recuperando a história das lutas”, afirma.
Luiz Momesso fala também sobre seu livro Comunicação Sindical: limites, contradições, perspectivas, lançado em 1997 e que está no prelo e deve sair em breve. “O jornalista tem que estar sintonizado com os diretores e entendendo que o trabalho dele não ser realiza sem a militância e o trabalho de “pé de ouvido”, como se chama na fábrica”, destaca.
Lançado pela primeira vez em 1988, esta segunda edição traz o depoimento de Henrique Francé, médico que cuidou de José Duarte no final de sua vida. Já aconteceram lançamentos em Goiânia, São Paulo e Rio de Janeiro. Nesta sexta-feira, 24, José Duarte – Um maquinista da história será lançado na Escola Popular Orocílio Martins Gonçalves, em Belo Horizonte, às 18h30. O livro está à venda na Livraria Antonio Gramsci, no Rio de Janeiro, por R$ 20. Informações pelo e-mail livraria@piratininga.org.br ou telefone (21) 2220 4623.
Marina e Vito – NPC – Quem foi José Duarte? Por que narrar sua história e relançar este livro neste momento, 25 anos depois da primeira edição?
Luiz Momesso – José Duarte era filho de portugueses e seu pai era vinculado aos anarquistas. Primeiro trabalharam em ferrovia em Santos e, depois, foram para a [Estrada de Ferro] Noroeste do Brasil, em Bauru, no interior de São Paulo. É um lugar onde se juntou uma classe operária e uma pequena burguesia ligadas à ferrovia muito cedo. José Duarte começou a trabalhar na ferrovia bem jovem e, a partir do contato com os anarquistas, com o jornal A Lanterna, entre outros, ele vai se integrando à luta dos trabalhadores. É no período antes da Segunda Guerra que ele começa a militar no movimento sindical. Torna-se um líder na fundação de sindicatos – não só de ferroviários -, mas de muitos sindicatos de outras categorias naquela região e é preso inúmeras vezes. Se liga ao Partido Comunista em 1924, ainda bem jovem, aos 17 anos. Era uma pessoa muito disposta, alegre, de luta, de enfrentamento e muito inteligente. A forma como ele combatia uma série de coisas era muito interessante, sempre muito ligado à vida e à prática e com o tempo foi se destacando. Quando houve o golpe de Getúlio Vargas ele foi chamado várias vezes pelo próprio Getúlio, que queria corrompê-lo, mas nunca conseguiu.
Então ele teve essa fase do trabalho, era uma pessoa que valorizava muito o trabalho, se orgulhava de ser um bom maquinista. Depois, com o golpe de 1964, ele passa à luta política mais geral e se torna um quadro do partido de extrema confiança e capacidade na área sindical. Orientou a formação de uma infinidade de sindicatos e nós nem temos ainda informações sobre a real dimensão desse trabalho. O Sindicato dos Metroviários de São Pulo, por exemplo, foi ele quem orientou a criação. Organizou também a fundação de sindicatos na Bahia, Minas, Ceará. Há muitos relatos concretos da atividade dele. Quando chegava em um lugar que não conhecia, por exemplo, ia ao bar conhecer as pessoas…
Com as 36 prisões são quase 17 anos passados em cadeias José Duarte se destaca muito como organizador da classe trabalhadora e na luta contra a repressão. Os torturadores nunca conseguiram uma informação dele. E ele sempre via a prisão como uma trincheira onde tinha que derrotar o inimigo. Ao invés de ser desmoralizado era ele quem desmoralizava os torturadores. A vida dele é impressionante. Amelinha [Maria Amélia de Almeida Teles, militante do PCdoB que foi presa e torturada durante e ditadura] conheceu José Duarte dentro da Operação Bandeirantes e disse que a liderança dele parecia “coisa de cinema”. O título do livro – José Duarte, um maquinista da história – foi dado pelo César [Teles, marido de Maria Amélia, que também foi preso durante a repressão].
Tentei trazer nesse percurso as lutas das quais ele participou, mas não só as lutas. Procurei explicar também o que eram essas lutas e por que estavam acontecendo, de forma que saísse uma visão geral das lutas dos trabalhadores no século XX. A ótica que eu tinha era fazer um livro não para exaltar uma figura, mas fazer um trabalho político.
NPC – Como você chegou a todas essas informações?
Luiz Momesso – Primeiro a partir de uma série de entrevistas com ele. Depois, fui entrevistar pessoas que conviveram com ele praticamente desde a infância. Nessa nova edição eu coloquei o depoimento do médico que o atendeu até o momento em que morreu. Peguei muito o lado humano, emocional e como as pessoas viam José Duarte. A partir daí eu confrontava com a visão dele, perguntava para ele mesmo. Esse era o jogo para construir a figura de José Duarte. Eu morava perto dele, em São Paulo, e quando ia a casa dele com mais pessoas ficava quieto, observando.
Fui a Bauru, onde ele começou a vida de trabalho. Para um marxista o trabalho é central, então eu valorizei muito o trabalho neste livro. Ficava na Vila dos Ferroviários, onde entrevistei várias pessoas. Lá encontrei um foguista que trabalhou com ele, o médico que cuidou dele… Fui lá entender a vida dos ferroviários. Depois, vários deles leram e se emocionaram, dizendo que o livro retratou um pouco da vida e do clima em que eles viviam. Os ferroviários em geral eram muito orgulhosos da profissão. A pesquisa, a escrita e a publicação foram feitas no ano de 1988.
NPC – Qual a importância de registrar esta e outras histórias das lutas de trabalhadores e de outros movimentos sociais?
Luiz Momesso – As classes dominantes trabalham o tempo inteiro para apagar a memória dos trabalhadores e uma pessoa sem memória não sabe quem ela é. O conhecimento da história é fundamental para a formação da consciência, da identidade de classe. Então uma coisa é levantar a história e outra é o próprio conhecimento dos acontecimentos e das lutas do povo brasileiro. Na questão da ditadura eu faço muitas descrições, às vezes detalhadas, sobre como era a tortura. Nós vamos, inclusive, passar as informações para a Comissão da Verdade porque ele citava muitos nomes quando dizia que foi torturado. Tentei passar também a subjetividade da pessoa que foi torturada, passar um pouco esse ambiente da tortura. O que é tortura? Lendo este livro dá para se ter uma noção.
Escrevi o livro em torno de uma vida que precisava ser preservada, mas é um trabalho com um objetivo político, uma tarefa política. Na minha ótica, a gente vai construindo a história e cada geração tem que assumir o que recebeu e colocar a coisa para frente. Estamos na nossa vez, construindo a história. José Duarte também construiu, foi um dirigente, um condutor. O conhecimento dessa história é importante para que as novas gerações continuem construindo a história. Temos que estar sempre recuperando a história das lutas.
NPC – Você escreveu também o livro Comunicação Sindical: limites, contradições, perspectivas, lançado em 1997. Em linhas gerais, o que você aponta neste livro? Pretende relança-lo ou atualizá-lo?
Luiz Momesso – O livro está no prelo e vai ser relançado. Eu comecei a trabalhar em comunicação sindical em 1966, quando era metalúrgico. E estudava também, para entender a realidade. Vários livros que li na fábrica voltei a ler na pós-graduação. Quando a ditadura estava implantando todos os meios de comunicação, de “conquista das mentes” e eu fiz uma análise política de que a comunicação seria uma das coisas mais importantes das décadas seguintes. Eu já tinha uma ligação com a comunicação dos trabalhadores e resolvi estudar a comunicação. Primeiro fui estudar a propaganda, mas vi que não tinha nada a ver. Depois estudei jornalismo em São Paulo, trabalhei dois anos na grande imprensa, fui para o movimento popular e, então, para o sindicato dos professores da rede pública em São Paulo (Apeoesp), onde trabalhei como assessor de imprensa, já no final da década de 1980. Nessa época eu já tinha mestrado e, depois fui apresentado a Nazaré Ferreira, professora da USP que estudava comunicação sindical e fui fazer o doutorado lá. Não tinha nenhuma pretensão de ser professor, queria aprender. E lá havia um grupo bom de alunos estudando a comunicação sindical.
NPC – Da sua tese de doutorado saiu o livro?
Luiz Momesso – Isso. Em 1978, 79 começou a profissionalização da comunicação sindical, que antes era feita pelos próprios trabalhadores. Fui estudar esse processo e suas implicações. Por exemplo, como um jornalista formado para a imprensa comercial se encaixa em um sindicato? Usei a dialética para entender essas contradições e daí surgiu o livro. Para a edição que sai em breve não foi possível fazer uma atualização porque seria uma nova pesquisa. Mas as coisas que escrevi lá não deixaram de ser atuais. Discuto a relação da comunicação com o trabalho de organização da militância tentando entender de um ponto de vista dialético. Analisei a relação da prática, da luta, da militância, da organização [da obra] do Lênin.
NPC – Quais as principais dificuldades do dia-a-dia da imprensa sindical que você diagnosticou naquela época e que se mantém?
Luiz Momesso – Tentei ver possibilidades e elementos que dessem uma visão mais materialista: não se separa comunicação da luta. Essa é uma tendência muito forte do jornalista. Uma preocupação minha era mostrar que é possível o jornalista influenciar os diretores do sindicato. O jornalista tem que estar sintonizado com os diretores e entendendo que o trabalho dele não ser realiza sem a militância e o trabalho de “pé de ouvido”, como se chama na fábrica.
Quando a dinâmica do movimento cai você pode manter uma publicação em grande quantidade, mas ela vai se distanciar da prática. Vai haver uma distonia com a vida sindical. Isso é uma das coisas que ficou muito clara na pesquisa. Outra coisa foi que os partidos de esquerda sempre criaram jornais como polos de aglutinação. O PT e a CUT nunca conseguiram criar porque a forma de organização deles é diferente… Por causa da disputa entre as correntes nunca conseguiram fazer um jornal.