[Por Emilio Azevedo*] No Brasil de tantos conflitos sociais, a dura batalha contra a violência no campo teve um ponto alto na última quarta feira, dia 22 de agosto, em dois eventos ocorridos no Maranhão, nas cidades de São João Batista e São Luís. Na primeira, ocorreu o julgamento e condenação de um dos responsáveis pela morte do líder quilombola Flaviano Pinto Neto. Enquanto isso, na capital do estado, estava sendo realizado o Seminário Vidas Ameaças, que prestou homenagens a Josimo Tavares, Dorothy Stang e outros mártires da luta pela terra.
Num Maranhão de oligarquias – onde a impunidade para beneficiar a estrutura oligárquica é a regra – a condenação do pistoleiro foi marcada por festa e emoção. Em São João Batista, do lado de fora do fórum, havia gente que chegou de vários pontos do estado, entre quilombolas, indígenas e quebradeiras de coco. Mais de 200 pessoas acompanharam da praça um julgamento 10 horas. Começou às 9 da manhã e encerrou às 7 da noite.
Após a sentença, muitos se ajoelharam, cantaram, se abraçaram ou correram eufóricos. Em meio a esse clima, a sobrinha de Flaviano, Zilmar Mendes, afirmou muito emocionada que seu tio estava presente. “Ele esteve entre nós! Ele veio!” Ele veio!
Ao falar das palavras de Zilmar, a quilombola Emilia Leitte, articuladora da Teia de Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão, disse que “foi um momento muito lindo”. O fato narrado pela sobrinha da vítima ganhou muita importância entre os presentes, com várias outras pessoas repetindo a avaliação de Emilia e dizendo: “Foi lindo!”.
Flaviano Pinto Neto foi executado, com sete tiros na cabeça, em 30 de outubro de 2010, no município de São Vicente Férrer, na baixada maranhense. Foi um crime de encomenda. Ele lutava, ao lado de sua comunidade, pela posse do Território do Charco, localizado no mesmo município. O crime repercutiu.
Quase cinco anos depois da tragédia, no dia 23 de junho de 2015, após muita mobilização, com sucessivas ocupações em prédios públicos, foi publicado no Diário Oficial da União o decreto federal, assinado pela então presidenta Dilma Rousseff, autorizando a Superintendência Regional do Incra a executar a desapropriação de uma área de 1347 hectares, em favor da comunidade do Charco. Foram beneficiadas 137 famílias. Elas hoje são as legítimas donas do território onde sempre viveram e trabalharam.
Agora, no último dia 22 de agosto, o tribunal do júri condenou a 18 anos de prisão, o ex-policial militar Josuel Sodré Sabóia, um dos envolvidos no assassinato. Ele foi intermediário entre o latifúndio e o pistoleiro. Falta agora a punição dos mandantes! O fazendeiro Manoel de Jesus Martins Gomes, conhecido como “Manoel de Gentil”, chegou a ser preso em 2011, acusado de ser um dos autores intelectuais do crime. Por decisão judicial, ele também iria a júri popular, junto com seu irmão, o também fazendeiro Antônio Martins Gomes. No entanto, o Tribunal de Justiça do Maranhão agiu em favor dos dois.
Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), no Maranhão, entre os anos de 1985 e 2014, foram assassinados 144 camponeses. Em nenhum desses episódios o mandante foi julgado. A expectativa é que o caso Flaviano possa inaugurar um novo momento.
*Emilio Azevedo é do Jornal Vias de Fato (MA) e colaborador do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC).