[Por Fernando Brito · 26/08/2018] Na Folha, sou atraído pelo texto – não dá para chamar de reportagem” que diz que “Justiça descobre dois apartamentos atribuídos à mulher de Cabral no Rio“.
Fiquei na esperança de entender, afinal, o que é um imóvel ser “atribuído” a alguém.
Mesmo que este “alguém” seja uma figura deplorável que, tanto quanto o marido, por que eu nunca tenha tido senão desprezo, seria, afinal, uma chance de compreender o que querem dizer em relação ao imóvel que serviu de pretexto para a condenação de Lula.
Aí, li o escrito.
Os apartamentos tinham sido comprados pela tal Adriana Ancelmo e isso estava registrado em escritura pública.
Então, vírgula, não tem “atribuído” nenhum, está assinalado em um documento público, lavrado em cartório com fé publica. E mais, estão declarados à Receita Federal.
O que não havia era a anotação da aquisição no Registro Geral de Imóveis, o que não é raro ocorrer e, aliás, impediria a sra. Ancelmo de vendê-lo, porque é obrigatório que se apresente, para lavrar uma escritura de compra e venda, a certidão do RGI, e bem recente (menos de 30 dias).
Então, o “atribuído” é só uma “esperteza” da neolinguagem do jornalismo de histeria, buscando atrair similaridade naquilo que não existe, porque não existe um papelucho sequer – menos ainda uma escritura pública – que torne “propriedade” de Lula o imóvel judicial.
Mas não termina aí o estrago da neolíngua lavajatense.
A Justiça “descobriu”?
Como “descobriu” se o próprio texto diz que a relação de bens da referida senhora feitas pela Receita Federal , com os dois imóveis, foi juntada ao processo bem antes?
A única coisa que se “descobriu” foi que o promotor que pediu a penhora dos bens e o juiz que a concedeu não leram o processo, porque o relatório da Receita “foi juntado à ação penal contra a advogada”. A informação, portanto, estava lá e não foi considerada.
Os fato de o casal Cabral ser um par de escroques não desobriga a ninguém de ser claro e preciso quando descreve um processo judicial num jornal que usa e abusa de regras de como se deve fazer jornalismo.
Não se descobriu, pois estava lá, nem se atribuiu, porque a escritura formalizava a propriedade. E nem novidade é, porque está sanado o erro do MP e do juiz desde abril.
Mas este tipo de construção de notícias ajuda na formação da histeria geral.
E isso é o que vem ao caso.