Um artigo de François Ruffin (traduzido por Jô Amado) no Le Monde Diplomatique apresenta exemplos de puro horror. Se o leitor ou a leitora tiver nervos fracos, por favor, leia com cuidado. 

O artigo de Ruffin fala das escolas em geral, mas usa o Centro de Formação de Jornalistas (CFJ), de Paris, como exemplo. 

Veja alguns dos trechos do artigo. 

“Quando [durante uma aula] um estudante propõe essa avaliação, o professor a descarta rapidamente, como se vê por este diálogo:

– Mas, num minuto não dá para dizer nada!…

– Bem-vindo ao mundo da televisão!… – responde, divertido, o professor.”

(…) 

Durante uma aula sobre televisão, por exemplo, Stéphane diz que gostaria de fazer uma reportagem sobre o comércio justo. O professor hesita: 

– Eu preferiria, por exemplo, algo como: “O que tomam os franceses como aperitivo?”

– Mas isso não tem nada a ver…

– Tudo bem, mas será visto por oito milhões de telespectadores. Ao passo que essa sua campanha, sobre a “ética do consumo”, é desconhecida do público.

– Mas é justamente isso que eu quero. Interessar as pessoas, fazer com que descubram…

– É… (E puxa a pálpebra.) Não estão nem aí… As pessoas estão pouco ligando. 

(…)

Como seria possível conceber uma “grande escola”, ainda por cima “de jornalismo”, sem uma biblioteca? Pois o CFJ é a prova de que isso é possível: a exemplo da busca de livros, existe uma “Documentação” – bastante modesta – com algumas revistas, um Quid, alguns dicionários, um manual de pontuação… No máximo, uma centena de obras de consulta e referência. 

(…) 

Segundo o responsável pela documentação: “Quando entram para a faculdade de jornalismo, os estudantes praticamente param de ler livros (…), como se devessem, a partir de então, adquirir e interiorizar os reflexos daquilo que existe nas redações”. 

(…) 

Os alunos já nem chegam a ler os ensaios que devem criticar. Benoît, por exemplo, devia fazer um trabalho sobre a guerra da Argélia. “Continue sua matéria sobre o livro de Jacques Duquesne”, aconselhou-a uma professora, jornalista do programa “France Culture”. “Mas eu nem abri o livro!…”, respondeu Benoît. “Não é preciso. Estamos com pressa. Basta você ler uma crítica do Monde”. 

“É terrível!”, reclama um aluno. “Nesta escola ninguém se sente relaxado”.Divertida, a responsável pelo primeiro ano replica: “E felizmente! Vocês não estão aqui para relaxar. Seria péssimo para vocês mesmos, se relaxassem. Porque mais tarde, quando vocês estiverem trabalhando nas empresas, então vocês terão que se conformar”.Um progresso louvável, esse: os jovens chegam às redações já se dando por vencidos. Eis aí uma forma de poupá-los de futuras ilusões, evitando a seus empregadores conflitos, rebeliões e baforadas de utopia. Eis que estão prontos para uma eternidade de matérias pagas, pois já renunciaram por antecipação. Eis que estão maduros para matérias com chamada de capa sobre o sexo no verão, o salário dos executivos, o mercado imobiliário, a lista dos melhores colégios, a classificação dos melhores vinhos franceses – eles que, mercadores de frases cínicas, conformados antes dos primeiros passos, passarão a viver do comércio das palavras. 

Pois é. Assustador não é? Será que não valeria a pena olhar para nossas escolas também e ver a quantas andam?  

O artigo está na página do Lê Monde em português http://www.diplo.com.br        

                                                                             (Por Sérgio Domingues – conselheiro do NPC)