(Os comentários em vermelho são do autor Schwinden, divulgados pela lista astedile)  

1996, um ano histórico

Autor: LUÍS NASSIF

Editoria: DINHEIRO Página: 2-3

Edição: Nacional Dec 22, 1996  

Na política econômica, 1995 foi o ano de semear ventos, com os atropelos cambiais e monetários do primeiro semestre, o imobilismo e a inadimplência generalizada. As tempestades foram colhidas em 1996, criando um paradoxo. Apesar da euforia, 1995 foi um desastre.

Apesar do baixo astral, 1996 será reconhecido como um dos anos de maiores transformações na história do país. (A palavra transformação pode ser traduzida no caso por neocolonização).

Foi o ano em que foi definido o novo modelo de Estado (ou seja, implanta-se o modelo do estado-mínimo, só não se pode falar em estado-zero, porque ele continuou sendo o guardião do sistema financeiro, não deixando nunca que faltasse pelo menos uns 60% da arrecadação total para pagamento dos juros), com a colocação em prática de idéias há longo tempo discutidas. (As tais idéias, discutidas no famoso endereço: 1818 H Street N W, Washington, DC)

Uma breve retrospectiva das mudanças (feita com a ajuda do ex-ministro Marcílio Marques Moreira)(foi ministro da Fazenda e, naturalmente, ganhou passe em pelo menos oito conselhos de multinacionais e a vice-presidência de um banco estrangeiros, grande ideólogo dos primeiros momentos do neoliberalismo):

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Definição do sistema elétrico, com a criação do Anell (o órgão regulador) e as privatizações de distribuidoras, com participação de operadores estrangeiros. (Resultado: racionamento, apagão, tarifas voando nas alturas,investimento zero)

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Definição da regulamentação do setor de telecomunicações, inclusive com o início da privatização da telefonia celular. (Maravilha: financiada pelo BNDES a compra do BNDES  teve a participação de alguns grupos mafiosos que hoje fazem a tarifa mais alta do mundo e o telefone celular transformou-se em verdadeiro confisco de renda das camadas mais pobres da população, que introjetaram a idéia de que o celular é mais importante que água, luz, comida)

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Reorganização do sistema ferroviário e início da privatização, com participação de operadores estrangeiros. (Maravilha: uma verdadeira revolução, a economia brasileira corre  doidivanas pelos trilhos, o colunista e o ex-ministro estão convidados a embarcar no trem de alegria da modernidade inaugurada no ano da graça de 1996)

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Início da privatização do sistema portuário. (Outra maravilha: custos baixaram, houve modernização fantástica, vendo Santos e Paranaguá dá até pena de Rotterdan)

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Estadualização das rodovias federais e início das concessões ao setor privado. (Revolução: aumentou o número de mortos e o pedágio entre Joinville e Belém, com caminhão carregado de geladeira Cônsul, chega a custar mais de 30% o valor do frete).

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Privatização de estatais estaduais e início da privatização dos bancos estaduais. (Sem comentários)

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Nova lei de patentes, dirimindo pendências que vinham se arrastando há anos. (O Brasil, ao lado do México foi o único país do mundo a reconhecer patentes para medicamentos, alimentos e química fina. Os medicamentos em dois anos subiram em dólar por volta de 200%. Os laboratórios nacionais foram todos fechados. Fantástico) 

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Isenção do ICMS para exportação e agricultura, dando início efetivo à reforma fiscal. (Só contaram para o colunista, porque os agricultores, continuam esperando a tal isenção)

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Fim da visão fiscalista sobre pequena e microempresa, com a aprovação do Simples, o imposto único para o setor. ( O Simples, boa obra do marketing tucano, cobre menos de 30% das categorias de micros e pequenas empresas)

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Fim do monopólio do resseguros e abertura do mercado de seguros à competição externa. (Maravilha: competição externa, sem qualquer controle. Farra da grossa)

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Abertura da navegação de cabotagem à competição. (Menos de cinco deputados e senadores sabiam o que era cabotagem quando aprovaram. Enquanto os países europeus e os Estados Unidos fechavam mais sua costa e sua navegação interior, o Brasil abriu geral para a pirataria internacional. Será que o grande Nassif sabe mesmo o que é cabotagem?)

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Mudanças relevantes na área trabalhista, com a flexibilização do contrato temporário de trabalho. (O trabalhador sem garantias fica também sem emprego. Foi uma vitória dos trabalhadores que, afinal, vão viver como sempre quiseram, de papo pro ar)

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Definição de um modelo gerencial de implementação de política econômica, com a criação do sistema informatizado de acompanhamento das 41 metas do Brasil em Ação. (Êpa, opa, essa nem o FHC ficou sabendo. Ele chegou a ouvir falar em Brasil em Ação, mas era uma fatura da publicidade cobrada pela grande mídia) 

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Aprovação da Lei do Arbitramento, instrumento fundamental para dirimir conflitos, sem afogar o Judiciário. (Terceirização da Justiça do Trabalho, picaretagem tomou conta do pedaço. Os tais árbitros chegam a cobrar hoje uns 60% sobre o que o trabalhador desempregado levaria de ganho na sua ação trabalhista. Isto é que é fazer história….)

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A medida provisória que eliminou privilégios absurdos na aposentadoria pública. (Então – caro jornalista – as denúncias de hoje da grande imprensa de aposentadorias milionárias é só ficção. Só argumento armado para privatizar a Previdência )

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Aprovação do novo Imposto Territorial Rural (ITR), como instrumento para acelerar a reforma agrária, bandeira defendida desde os anos 60. (Espera aí, ilustríssimo pena-paga, o ITR é do tempo do Figueiredo, lembra do Estatuto da Terra?)

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Definição do novo papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), como órgão indutor de investimentos privados e internacionais. (O BNDES foi transformado em Santa Casa de multinacionais e estatais estrangeiras. Para infrae-estrutura como energia, saneamento, ou mesmo para pequenas e médias empresas rurais e urbanas, o BNDES se transformou em madrasta)

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Definição dos elementos da nova política industrial, com base no chamado “adensamento da cadeia produtiva”. (Que é que é isso??? É brincadeira, né!?.)

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Avanço significativo na indústria de fundos, com a criação do fundo de capitalização individual, e com a criação de normas de controle sobre o setor. (Indústria de fundos? Capitalização individual? O jornalista andou trocando chá de funcho por cannabis…) 

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Nova Lei das Sociedades Anônimas. (Explica como ficou o acionista minoritário, explica? Vai…!!!!)

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Mudanças nas formas de crédito aos pequenos empresários, com a criação do Fundo de Securitização de Recebíveis. ( Suspende o pó. Securitização pode ser traduzida como o mico da carteira hipotecária- chamada de podre pelos bancos privados. E quanto ao crédito aos pequenos empresários, uma fábula. De todos os empreendimentos nascidos em 1997, 96% fecharam até o final daquele ano, por falta de crédito ou por crédito de agiotagem)

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Reestruturação do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, que passaram a atuar competitivamente no mercado. (Arrumando a vida do dono da Encol,  dos Canhedo, dos grandes latifundiários, vendendo dólar para segurar a paridade, etc. Grande reestruturação)

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Conjunto de reformas no Ministério da Educação e Desportos, definindo o novo modelo do setor _descentralização da operação, e reforço do papel avaliador da União. (Definitivamente, o rapaz despirocou…Será que ele está falando da Lei Zico, da Lei Pelé ou eleição do Eurico Miranda para deputado federal?)

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Definição do novo modelo de políticas sociais, com o programa “Alfabetização Solidária“.(Aqui se justifica, o colunista é o cavalheiro: um agrado na dona Ruth. Mas os 21 milhões de analfabetos oficiais continuou igual, segundo o mesmo MEC do ministro irmão do lobista da Microsof)

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Definição de uma política ambiental, com a nova Lei de Mananciais, em tramitação, e a decisão do BNDES de condicionar financiamentos a laudos ambientais. (Dizem que o RIMA – relatório de impacto ambiental – no financiamento da Ford (US$ 1,9 bi) resolveu todos os problemas de meio ambiente na saúde financeira da multinacional)

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Definição de um modelo de reforma administrativa. (Essa só lendo de novo. Modelo de reforma. Ou seja, uma espécie de ensaio via MP)  

Poderia ter sido melhor? Poderia, é claro. A inércia em se resolver a questão da inadimplência, as dificuldades em se estancar o déficit público, as taxas de juros alimentando passivos monumentais e a demora em resolver a situação de bancos em dificuldades perfazem uma lista considerável de obras não realizadas.Mas, no futuro, se perceberá que, após Collor arrombar a porta, o rumo do país foi definitivamente traçado nesse pouco reconhecido ano de 1996.

(Com esse “rumo definitivamente traçado no “histórico 96”, o Brasil quebrou duas vezes, bateu todos os recordes em desnacionalização, fez a dívida pública multiplicar por 10, fez o desemprego se transformar em tragédia nacional, a infra-estrutura foi totalmente sucateada, o roubo comeu solto, o capital de motel entrou e saiu  em alta rotatividade deixando cada dia mais buraco no Tesouro Nacional, que mais que aconteceu, grande Nassif?

Pelo menos, uma verdade verdadeira: Collor, o Fernando I foi o pioneiro. Fernando II, sempre muito vaidoso, tinha que forçar a barra para não ficar para trás.

Em tempo: era FHC tivemos uma produção muito maior de adjetivos, embora a qualidade não tenha melhorado em relação ao conde das Alagoas.