Sem desconhecer a contribuição específica e a estatura profissional de cada um dos mais de 20 convidados, quase todos, direta ou indiretamente, acabaram referindo-se à internet ou respondendo perguntas a ela relacionadas durante os quatro dias de debates promovidos pela Fundação Joaquim Nabuco em Recife, de 17 a 20 de junho.

No seminário que homenageou Barbosa Lima Sobrinho e teve como objetivo refletir sobre a história do jornalismo brasileiro, o que predominou mesmo foi certa perplexidade sobre o momento de transição pelo qual passa o jornalismo impresso e, sobretudo, a indefinição sobre o seu futuro e o das profissões a ele vinculadas.

Questões sem resposta

O que acontecerá com os jornais impressos diante do jornalismo online? Os jornais conseguirão sobreviver publicando hoje o que todo mundo já sabe desde ontem? Sobreviverão com o formato atual? Com o mesmo modelo de negócios? Serão gratuitos?

Os blogs de notícias reproduzem o jornalismo da grande mídia? O que os blogueiros fazem é jornalismo? Como fica a obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão no espaço-livre da internet?

Quais as implicações dos e-mails, sites interativos, comunidades virtuais etc. para a sociabilidade humana? Como fica a preservação da memória nos tempos do jornalismo online? É possível construir com segurança a memória do espaço virtual?

Afinal, quantas pessoas têm acesso à internet no Brasil? Qual a distribuição dos internautas por classe, escolaridade, níveis de renda, padrões de consumo? A internet é elitista e excludente?

A internet tem algum poder de influência no resultado eleitoral no Brasil? E em outros países? Existe alguma forma de se controlar a propaganda eleitoral na internet? Esse controle é feito em outros países? Qual a avaliação que se pode fazer das decisões do TSE sobre o assunto no Brasil?

Qual a distribuição comparativa do investimento publicitário na internet? Quais as projeções para os próximos anos? Quem controla a internet?

Evidentemente, não há respostas consensuais sobre essas questões nem elas surgiram no seminário de Recife.

A crise dos jornais

A Fundação Joaquim Nabuco certamente não pretendeu reduzir o debate ao jornalismo impresso. As condições históricas do nosso país sempre fizeram com que os jornais tivessem tiragem reduzida e circulassem quase exclusivamente no espaço público de uma elite letrada. É verdade que nos últimos anos o ligeiro crescimento da tiragem dos jornais brasileiros expressa a entrada no mercado das novas classes C e D. Apesar disso, não há dúvida que o rádio e a televisão são os dois veículos de maior penetração na população brasileira.

O que vem acontecendo aos jornais impressos, no entanto, não é um fenômeno exclusivamente brasileiro. Ao contrário. Pesquisas recentes indicam que, nos Estados Unidos, por exemplo, somente 19% da população entre 18 e 34 anos se declara leitora de jornais – que, aliás, desde 2004, ocupam o último lugar entre as fontes de notícia preferidas pelos leitores mais jovens. Esses dados não são novidade para aqueles que acompanham o setor, como não é novidade que a principal causa apontada para explicar a situação presente é o surgimento e o vertiginoso crescimento da internet. Daí porque a presença da internet como questão recorrente em um seminário sobre imprensa não chega a ser surpresa.

Riscos da concentração

Um dos riscos que se corre, no entanto, foi apontado pelo professor Sérgio Amadeu, da Fundação Casper Líbero, um dos especialistas convidados. Ele mostrou a contradição existente entre as duas principais tendências que dominam a consolidação das chamadas sociedade em rede: a redistribuição do poder comunicacional que a digitalização possibilita através das novas tecnologias de informação e comunicação (TICs) e a concentração e o controle de toda a infra-estrutura necessária nas mãos de poucas corporações globais.

Será que as promessas democratizantes da internet correm o risco de se frustrar pelas mesmas razões que têm provocado, por exemplo, a contaminação de coberturas jornalísticas – o chamado jornalismo sitiado produzido dentro de megaestruturas empresariais e, portanto, permanentemente sujeito às interferências diretas ou indiretas de interesses (não-jornalísticos) de seus controladores?

De qualquer maneira, o importante é que as questões sejam propostas e debatidas. E é isso que eventos como o promovido pela Fundação Joaquim Nabuco oferecem: oportunidade para se buscar e, eventualmente, encontrar diretrizes para uma imprensa e uma internet livres e democráticas, a serviço apenas do interesse público. 

Artigo publicado no Observatório da Imprensa