Boletim NPC: Quantos indígenas participaram da produção do vídeo (incluindo aqui todas as etapas)? Quando foi feito, e como foram as aulas/oficinas?
Elton Rivas: Ao todo, foram 15 indígenas envolvidos na produção do vídeo, entre realizadores, atores e participantes da oficina. O vídeo foi produzido neste ano (2009) em três momentos:
– Em janeiro, houve uma semana de oficina de produção de roteiro, onde o argumento foi desenvolvido e tivemos a primeira versão da história. Nessa oficina assistimos a outros vídeos e discutimos as características básicas do texto para roteiro (ação, ganchos, personagens, desenvolvimento da trama).
– Em março, gravamos as imagens na Reserva Indígena de Dourados, ao longo de cinco dias. Nesse momento, trabalhamos outras questões relativas à produção (elenco, fotografia e direção).
– No mês de abril, um dos jovens indígenas envolvidos editou o material em uma versão de 15 minutos, que foi discutida com o grupo e reduzida à versão final de 10 minutos.
Boletim NPC: Como surgiu essa proposta de produção de audiovisual pelos índios? Qual o objetivo?
Elton Rivas: A AJI, Ação de Jovens Indígenas de Dourados, trabalha com jovens Guarani-Kaiowá, Guarani Ñandeva e Terena das aldeias Bororó e Jaguapiru em Dourados, Mato Grosso do Sul. Os indígenas envolvidos produzem um jornal impresso de circulação bimestral e mantêm um blog e um fotolog da organização. Eles também realizam oficinas de fotografia e vídeo na aldeia, que geraram a publicação de um livro e a realização de vídeos nos gêneros documentário e ficcional.
Já passaram por lá outros dois realizadores que capacitaram os jovens em diferentes aspectos da produção audiovisual. O diferencial desse vídeo é que todo o processo foi conduzido pelos indígenas, da criação à edição do material. Foi também a primeira vez que eles trabalharam com a criação de roteiros.
Boletim NPC: Você disse em seu blog que o vídeo faz parte de sua pesquisa para o Doutorado. Pode falar um pouco sobre sua pesquisa?
Elton Rivas:
O objetivo da pesquisa é verificar como a apropriação da linguagem audiovisual disponibiliza aos indígenas conhecimentos e instrumentais para superar o status de sujeito puramente receptor de produtos audiovisuais. Aí passam a ser atores/realizadores/emissores de conteúdo, o que garantiria o acesso a outros padrões de sociabilidade e comunicação, tanto interna como externamente.
Boletim NPC: Você diz também que espera que cada vez mais os indígenas utilizem essa ferramenta. Por que acha isso importante?
Elton Rivas: A aquisição de um novo instrumental técnico desenvolve nas comunidades uma capacidade crítica, além de impactos sociais, políticos, cognitivos e, sobretudo, comunicativos na organização da vida cotidiana. A conquista da linguagem audiovisual e o acesso aos meios materiais e humanos que permitem o exercício dessa linguagem potencializam a capacidade desses grupos de defender seu ponto de vista diante das diferentes visões que os circundam. A conquista da linguagem pode ser considerada a conquista de uma nova relação com o mundo.
Já ouvi de alguns indígenas que agora eles não lutam com flechas, mas com palavras e imagens. Acho que a democratização desses materiais e tecnologias dá poder às populações e grupos sociais que as utilizam.