Este texto é versão resumida e modificada de algumas idéias e passagens de meu livro Neoliberalismo – de onde vem, para onde vai?,editora Senac, 2001, São Paulo, parte I)
( Reginaldo C. Moraes )
I. Neoliberalismo é …
-
uma corrente de pensamento e uma ideologia, uma forma de ver e julgar o mundo social;
-
um movimento intelectual organizado;
-
um conjunto de políticas adotadas pelos governos neoconservadores e propagadas a partir de organizações multilaterais (Banco Mundial e FMI).
O liberalismo clássico, dos séculos XVIII-XIX, era a ideologia do capitalismo comercial e manufatureiro.
O neoliberalismo, em nossos dias, é a ideologia do capitalismo na era de máxima financeirização da riqueza, a era da riqueza mais do que líquida, a ideologia dos senhores do capital volátil e especulativo. Constitui, basicamente, um ataque às formas de regulação da economia como
-
o socialismo,
-
o reformismo keynesiano,
-
o Estado-de-bem-estar,
-
o terceiro-mundismo e o desenvolvimentismo latino-americano.
II. O liberalismo clássico
As idéias básicas do liberalismo foram marcadas por Adam Smith, no livro A Riqueza das Nações, de 1776. Seu credo político pode ser resumido no seguinte mandamento: desregulamentar e privatizar as atividades econômicas, reduzindo o Estado a três funções:
-
a manutenção da segurança interna e externa,
-
a garantia da propriedade, dos contratos e
-
a responsabilidade por serviços essenciais de utilidade pública.
Para os liberais, a ordem social não deveria ser regulada pela economia, mas pelo movimento espontâneo do mercado. E o mercado é resultado das iniciativas individuais livres, da procura do lucro. A motivação do interesse próprio
-
estimula o empenho, incita ao trabalho
-
estimula o engenho, a criatividade, a inovação
-
recompensa a poupança, a abstinência presente,
-
remunera o investimento.
Segundo os liberais, quais são os inimigos dessa ordem eficiente, justa e equilibrada?
-
Os regulamentos estatais
-
As corporações profissionais e os grupos de interesse organizado
III. E o Neoliberalismo – o que é e de onde vem?
Como ideologia, isto é, como doutrina, surge logo no início do século XX.
Como movimento intelectual organizado, porém, vai deslanchar em 1944, com a publicação do livro de Friedrich von Hayek, O Caminho da Servidão, o manifesto-fundador do neoliberalismo. Um pouco mais tarde, em 1947, na Suíça, Hayek liberou a fundação da Sociedade do Mont Pèlerin, uma espécie de Internacional Neoliberal.
Já o terceiro aspecto, as políticas de governos neoconservadores, deveriam esperar um pouco mais. As datas importantes são 1980, com a chegada de Reagan ao governo dos EUA, e 1979, com Margaret Thatcher no governo britânico. Mas experiências neoliberais bastante duras haviam sido feitas no terceiro mundo. Em 1973, no Chile, com a política econômica e social do governo Pinochet. E em 1976, na Argentina, com a ditadura do general Videla.
A partir do início dos anos 1980, planos de “ajuste neoliberal” foram aplicados em vários países, particularmente na América Latina.
Em que conjuntura o neoliberalismo chega ao poder?
Fundamentalmente, a conjuntura é marcada pela crise das regulações, crise do chamado “Consenso keynesiano” do pós-guerra, uma política de intervenção reguladora do Estado visando:
-
a criação de pleno emprego,
-
a moderação de desequilíbrios sociais excessivos e politicamente perigosos,
-
o socorro a países e regiões economicamente deprimidas,
-
a manutenção de uma estrutura de serviços de bem-estar (habitação, saúde, previdência, transporte urbano, etc),
-
a gradual implantação de políticas sociais que moderassem desigualdades materiais.
IV. As orientações políticas do neoliberalismo
AS orientações estratégicas do neoliberalismo podem ser indicadas em duas palavras-de-ordem:
-
privatizar empresas estatais e serviços públicos;
-
“desregulamentar” a economia, isto é, diminuir a interferência dos poderes públicos sobre os empreendimentos privados.
Essas são as grandes diretrizes estratégicas do neoliberalismo. Mas elas são popularizadas em temas mais cotidianos, que acompanhamos pelos jornais e pela TV, quando vemos:
-
os protestos de empresários contra pressões fiscais “insuportáveis”;
-
as denúncias de políticos conservadores contra as políticas redistributivas, que eles chamam de paternalistas, demagógicas e contraproducentes;
-
as campanhas de organizações empresariais contra “o tamanho do Estado”.
-
a resistência contra a regulamentação dos contratos particulares (leis trabalhsitas, controle de mensalidades escolares e aluguéis, etc).
V. Cenários do inferno produzido pela intervenção estatal – segundo os liberais:
-
a regulação legislativa, a atuação do Estado-empresário e a oferta de bens públicos e os serviços de proteção social
-
confundem o mercado,
-
levam ao emprego irracional dos recursos
-
desestimulam e deseducam os indivíduos;
-
Estado se torna instrumento de grupos de pressão, de privilégios
-
Generaliza-se o discurso demagógico das políticas sociais, como forma de esconder privilégios
-
Crescem as despesas públicas e as necessidades financeiras dos governos (endividamento, emissão monetária, inflação);
-
Cresce a tributação, que acaba por desestimular o trabalho e a atividade produtiva, provoca evasão, fraudes fiscais e o desenvolvimento de economia subterrânea (informal).
VI. Terremotos no mundo do trabalho
Segundo o consultor de empresas William Bridges, no livro Mudança nas Relações de Trabalho, a desregulamentação da economia iria levar a uma forma mais moderna e dinâmica de organização social, caracterizada pelo fim..
-
do assalariamento clássico,
-
da lógica do emprego permanente,
-
dos acordos e regulamentos protetores,
-
dos salários calculados automaticamente a partir de convenções coletivas detalhadas.
Um novo mundo trabalhista surgiria, caracterizado por
-
autonomia
-
gestão e contratação flexíveis
-
ajustes permanentes na duração e na qualidade do trabalho
-
salário ajustado ao desempenho
-
individualização das remunerações
-
fim das profissões padronizadas: ziquezagues na história de vida profissional.
Nesse maravilhoso mundo novo, teriamos uma infinidade de “patrões de si mesmos”. As empresas seriam mais “enxutas”, cercadas por indivíduos e pequenos grupos de “parceiros”, terceirizados.
VII. Os bens públicos e as políticas sociais.
Os neoliberais partem de uma constatação. Os bens e serviços produzidos na sociedade são definidos por dois mecanismos de manifestação e agregação das preferências:
-
o Mercado – ondem reinam as escolhas individuais, as iniciativas descentralizadas. No mercado predominam as relações do tipo cliente-fornecedor,
-
a Política – em que as escolhas e decisões são coletivas, as iniciativas são centralizadas e grande número de bens e serviços são compartilhados ou consumidos em comum.
Os neoliberais dizem o seguinte, com relação aos serviços sociais: em muitos casos pode-se individualizar o usuário (consumidor ou cliente) e cobrar pelo acesso ao bem. Um exemplo é o caso dos “serviços educacionais”. Ao invés de uma política pública de educação, os neoliberais dizem que devemos deixar que os indivíduos façam a sua própria política de educação, no mercado de serviços escolares. O economista norte-americano Milton Friedman, por exemplo, prega a distribuição de ‘cupons’ aos pais de crianças, dando-lhes a oportunidade de escolher e comprar serviços educacionais fornecidos pela iniciativa privada, comentando: “os pais poderiam expressar sua opinião a respeito das escolas diretamente, retirando seus filhos de uma escola e mandando-os para outro — de modo muito mais amplo do que é possível agora. Em geral, eles agora só podem tomar tal atitude arcando com os elevados custos de colocar os filhos numa escola particular ou trocar de residência. Quanto ao resto, só podem expressar seus pontos de vista através de complicados canais políticos.”
Uma outra alternativa é construir verdadeiras simulações do mercado, mesmo em atividades em que a propriedade e a operação sejam públicas. Por exemplo: descentralizar esses serviços, tornando locais (municipais, regionais) a produção e/ou distribuição de determinados bens e serviços antes oferecidos num âmbito nacional. Com isso se visaria tornar mais “competitiva” a oferta dos bens e serviços. O cidadão seria convertido em cliente ou consumidor. Escolheria entre municípios-fornecedores. Desse modo, a reforma do setor púlbico criaria situações que permitam a resposta a este tipo de alternativa: “se você quiser esta cesta de bens, a este preço, vá para aquela cidade X, se quiser outra configuração vá para a cidade Y”. Enfim, produziriamos uma espécie de simulação do mercado, a existência de estruturas, regras e processos que emulem processos de mercado (ou análogos ao mercado) na esfera que antes era pública, ou política.
VIII. Três lemas das políticas públicas na era dos “ajustes estruturais”: focalizar, descentralizar, privatizar.
Focalizar, quer dizer substituir a política de acesso universal pelo acesso seletivo. O acesso universal quer dizer: todo cidadão, indiscriminadamente, tem direito ao serviço. O acesso seletivo permite definir mais limitadamente e discriminar o receptor dos benefícios. Por isso, em muitos países submetidos a programas de ajuste neoliberal, as políticas sociais são praticamente reduzidas a programas de socorro à pobreza absoluta.
Descentralizar operações — o que não quer dizer necessariamente desconcentrar o poder, as decisões políticas mais estratégicas, a gestão dos grandes fundos públicos.
Privatizar – o que pode ser feito de diversas maneiras:
-
transferir ao setor privado a propriedade das empresas estatais e das agências de políticas sociais, tais como saúde, educação, moradia, assistência social, etc.;
-
transferir ao setor privado a operação ou gestão desses serviços. Como?
-
delegando competências ao setor privado ou ao chamado “terceiro setor”;
-
mantendo as competências na esfera pública-estatal, mas submetendo esses entes estatais a controles de mercado ou que simulem mercados. Em outras palavras, criando em certas esferas dos serviços públicos sistemas de avaliação que simulem a relação fornecedor-cliente.
IX. Diagnóstico, prognóstico, terapêutica – ou: queda, penitência e salvação das almas, segundo o evangelho neoliberal
Diagnóstico. As massas pobres — incompetentes ou indolentes, mal-sucedidas na competição pela vida – ganharam, infelizmente, o direito de votar, de organizar-se e de atuar na política. Exerceem esse poder “roubando” os ricos e proprietários – esforçados, criativos e bem-sucedidos. Esse “confisco” de suas propriedades ou das rendas por elas gerados é feito através de impostos e taxações progressivas.
Prognóstico. A criação de políticas redistributivas, políticas sociais do Estado, voltadas para os pobres, é o resultado dessa democracia sem limites, irresponsável. Esse regime político gasta cada vez mais (e mal) e taxa cada vez mais (e mal). Além disso, as políticas sociais em expansão criam também, inevitavelmente, uma burocracia estatal poderosa e irresponsável. Previsão do tempo futuro, feita pelos sábios neoliberais: tirania estatal, arbitrariedades e incerteza, degradação dos valores empreendedores, a “ditadura das maiorias”, a estagnação econômica. Apocalipse! E qual o caminho da salvação? O remédio amargo, a penitência, dura mas necessária…
Terapêutica. Cortemos o mal pela raiz, dizem nossos neoliberais. E qual é a raiz? É preciso salvar o mundo político da influencia perniciosa das massas pobres, incompetentes, mal-sucedidas. Reduzir as ações do poder público, do Estado. Desregulamentar, privatizar, emagrecer o Estado. Livrar da influencia das massas os funcionários que que controlam botões decisivos da política pública, como as finanças e a aplicação da justiça. Para que eles não sejam vulneráveis à voz das urnas e das ruas, inconsequentes, volúveis e insaciáveis. As massas ganharam o direito ao voto – pois então tratemos de esterilizar o voto. Mas isso é insuficiente. A participação extra-eleitoral das massas também tem de ser contida. Por isso, nos processos de “ajuste” neoliberais é importante quebrar a espinha dos sindicatos e das entidades trabalhistas em geral..
X. Epílogo
Os propagandistas do neoliberalismo volta e meia insinuam que a história chegou ao fim, com a vitória do capitalismo global e dos valores do mundo livre, da civilização ocidental.
Porém, a história, rebelde, resiste a confirmar essas afirmações e volta e meia explodem contradições que colocam a nu a verdadeira moral da “estória” neoliberal:
“Daqueles que nada têm ainda mais lhes será tirado; para aqueles que tudo têm, ainda mais lhes será dado” (Mateus, 13, 12)
Fundamentalmente, a conjuntura é marcada pela crise das regulações, crise do chamado “Consenso keynesiano” do pós-guerra, uma política de intervenção reguladora do Estado visando:
-
a criação de pleno emprego,
-
a moderação de desequilíbrios sociais excessivos e politicamente perigosos,
-
o socorro a países e regiões economicamente deprimidas,
-
a manutenção de uma estrutura de serviços de bem-estar (habitação, saúde, previdência, transporte urbano, etc),
-
a gradual implantação de políticas sociais que moderassem desigualdades materiais.
IV. As orientações políticas do neoliberalismo
AS orientações estratégicas do neoliberalismo podem ser indicadas em duas palavras-de-ordem:
-
privatizar empresas estatais e serviços públicos;
-
“desregulamentar” a economia, isto é, diminuir a interferência dos poderes públicos sobre os empreendimentos privados.
Essas são as grandes diretrizes estratégicas do neoliberalismo. Mas elas são popularizadas em temas mais cotidianos, que acompanhamos pelos jornais e pela TV, quando vemos:
-
os protestos de empresários contra pressões fiscais “insuportáveis”;
-
as denúncias de políticos conservadores contra as políticas redistributivas, que eles chamam de paternalistas, demagógicas e contraproducentes;
-
as campanhas de organizações empresariais contra “o tamanho do Estado”.
-
a resistência contra a regulamentação dos contratos particulares (leis trabalhsitas, controle de mensalidades escolares e aluguéis, etc).
V. Cenários do inferno produzido pela intervenção estatal – segundo os liberais:
-
a regulação legislativa, a atuação do Estado-empresário e a oferta de bens públicos e os serviços de proteção social
-
confundem o mercado,
-
levam ao emprego irracional dos recursos
-
desestimulam e deseducam os indivíduos;
-
Estado se torna instrumento de grupos de pressão, de privilégios
-
Generaliza-se o discurso demagógico das políticas sociais, como forma de esconder privilégios
-
Crescem as despesas públicas e as necessidades financeiras dos governos (endividamento, emissão monetária, inflação);
-
Cresce a tributação, que acaba por desestimular o trabalho e a atividade produtiva, provoca evasão, fraudes fiscais e o desenvolvimento de economia subterrânea (informal).
VI. Terremotos no mundo do trabalho
Segundo o consultor de empresas William Bridges, no livro Mudança nas Relações de Trabalho, a desregulamentação da economia iria levar a uma forma mais moderna e dinâmica de organização social, caracterizada pelo fim..
-
do assalariamento clássico,
-
da lógica do emprego permanente,
-
dos acordos e regulamentos protetores,
-
dos salários calculados automaticamente a partir de convenções coletivas detalhadas.
Um novo mundo trabalhista surgiria, caracterizado por
-
autonomia
-
gestão e contratação flexíveis
-
ajustes permanentes na duração e na qualidade do trabalho
-
salário ajustado ao desempenho
-
individualização das remunerações
-
fim das profissões padronizadas: ziquezagues na história de vida profissional.
Nesse maravilhoso mundo novo, teriamos uma infinidade de “patrões de si mesmos”. As empresas seriam mais “enxutas”, cercadas por indivíduos e pequenos grupos de “parceiros”, terceirizados.
VII. Os bens públicos e as políticas sociais.
Os neoliberais partem de uma constatação. Os bens e serviços produzidos na sociedade são definidos por dois mecanismos de manifestação e agregação das preferências:
-
o Mercado – ondem reinam as escolhas individuais, as iniciativas descentralizadas. No mercado predominam as relações do tipo cliente-fornecedor,
-
a Política – em que as escolhas e decisões são coletivas, as iniciativas são centralizadas e grande número de bens e serviços são compartilhados ou consumidos em comum.
Os neoliberais dizem o seguinte, com relação aos serviços sociais: em muitos casos pode-se individualizar o usuário (consumidor ou cliente) e cobrar pelo acesso ao bem. Um exemplo é o caso dos “serviços educacionais”. Ao invés de uma política pública de educação, os neoliberais dizem que devemos deixar que os indivíduos façam a sua própria política de educação, no mercado de serviços escolares. O economista norte-americano Milton Friedman, por exemplo, prega a distribuição de ‘cupons’ aos pais de crianças, dando-lhes a oportunidade de escolher e comprar serviços educacionais fornecidos pela iniciativa privada, comentando: “os pais poderiam expressar sua opinião a respeito das escolas diretamente, retirando seus filhos de uma escola e mandando-os para outro — de modo muito mais amplo do que é possível agora. Em geral, eles agora só podem tomar tal atitude arcando com os elevados custos de colocar os filhos numa escola particular ou trocar de residência. Quanto ao resto, só podem expressar seus pontos de vista através de complicados canais políticos.”
Uma outra alternativa é construir verdadeiras simulações do mercado, mesmo em atividades em que a propriedade e a operação sejam públicas. Por exemplo: descentralizar esses serviços, tornando locais (municipais, regionais) a produção e/ou distribuição de determinados bens e serviços antes oferecidos num âmbito nacional. Com isso se visaria tornar mais “competitiva” a oferta dos bens e serviços. O cidadão seria convertido em cliente ou consumidor. Escolheria entre municípios-fornecedores. Desse modo, a reforma do setor púlbico criaria situações que permitam a resposta a este tipo de alternativa: “se você quiser esta cesta de bens, a este preço, vá para aquela cidade X, se quiser outra configuração vá para a cidade Y”. Enfim, produziriamos uma espécie de simulação do mercado, a existência de estruturas, regras e processos que emulem processos de mercado (ou análogos ao mercado) na esfera que antes era pública, ou política.
VIII. Três lemas das políticas públicas na era dos “ajustes estruturais”: focalizar, descentralizar, privatizar.
Focalizar, quer dizer substituir a política de acesso universal pelo acesso seletivo. O acesso universal quer dizer: todo cidadão, indiscriminadamente, tem direito ao serviço. O acesso seletivo permite definir mais limitadamente e discriminar o receptor dos benefícios. Por isso, em muitos países submetidos a programas de ajuste neoliberal, as políticas sociais são praticamente reduzidas a programas de socorro à pobreza absoluta.
Descentralizar operações — o que não quer dizer necessariamente desconcentrar o poder, as decisões políticas mais estratégicas, a gestão dos grandes fundos públicos.
Privatizar – o que pode ser feito de diversas maneiras:
-
transferir ao setor privado a propriedade das empresas estatais e das agências de políticas sociais, tais como saúde, educação, moradia, assistência social, etc.;
-
transferir ao setor privado a operação ou gestão desses serviços. Como?
-
delegando competências ao setor privado ou ao chamado “terceiro setor”;
-
mantendo as competências na esfera pública-estatal, mas submetendo esses entes estatais a controles de mercado ou que simulem mercados. Em outras palavras, criando em certas esferas dos serviços públicos sistemas de avaliação que simulem a relação fornecedor-cliente.
-
IX. Diagnóstico, prognóstico, terapêutica – ou: queda, penitência e salvação das almas, segundo o evangelho neoliberal
Diagnóstico. As massas pobres — incompetentes ou indolentes, mal-sucedidas na competição pela vida – ganharam, infelizmente, o direito de votar, de organizar-se e de atuar na política. Exerceem esse poder “roubando” os ricos e proprietários – esforçados, criativos e bem-sucedidos. Esse “confisco” de suas propriedades ou das rendas por elas gerados é feito através de impostos e taxações progressivas.
Prognóstico. A criação de políticas redistributivas, políticas sociais do Estado, voltadas para os pobres, é o resultado dessa democracia sem limites, irresponsável. Esse regime político gasta cada vez mais (e mal) e taxa cada vez mais (e mal). Além disso, as políticas sociais em expansão criam também, inevitavelmente, uma burocracia estatal poderosa e irresponsável. Previsão do tempo futuro, feita pelos sábios neoliberais: tirania estatal, arbitrariedades e incerteza, degradação dos valores empreendedores, a “ditadura das maiorias”, a estagnação econômica. Apocalipse! E qual o caminho da salvação? O remédio amargo, a penitência, dura mas necessária…
Terapêutica. Cortemos o mal pela raiz, dizem nossos neoliberais. E qual é a raiz? É preciso salvar o mundo político da influencia perniciosa das massas pobres, incompetentes, mal-sucedidas. Reduzir as ações do poder público, do Estado. Desregulamentar, privatizar, emagrecer o Estado. Livrar da influencia das massas os funcionários que que controlam botões decisivos da política pública, como as finanças e a aplicação da justiça. Para que eles não sejam vulneráveis à voz das urnas e das ruas, inconsequentes, volúveis e insaciáveis. As massas ganharam o direito ao voto – pois então tratemos de esterilizar o voto. Mas isso é insuficiente. A participação extra-eleitoral das massas também tem de ser contida. Por isso, nos processos de “ajuste” neoliberais é importante quebrar a espinha dos sindicatos e das entidades trabalhistas em geral..