Gaudêncio Frigotto* fala sobre Dicionário de Politiquês

A ideia chave do Dicionário de Politiquês é que o intelectual, como o artista, para cumprir seu papel tem que estar onde o povo trabalhador está e efetivamente comunicar-se com ele. Vito  Giannotti, um intelectual que provém da classe trabalhadora e vivencia as suas lutas, experiências, saberes, limites e dificuldades, como poucos entendeu a importância da mensagem de Gramsci sobre a necessidade de elevação moral e intelectual dos trabalhadores para sua organização e luta por seus interesses.

Como aquele intelectual militante Vito também entende que mais valem pequenas descobertas ou verdades compreendidas e partilhadas por uma grande multidão de pessoas do que grandes idéias e descobertas que ficam circulando apenas em pequenos grupos de mentes que se julgam superiores. A história nos mostra que as grandes transformações sociais são feitas pela massa de trabalhadores que ao entender quais são os seus verdadeiros interesses já não se contentam por migalhas de pão ou assistencialismo, mas lutam por seus direitos.

A metáfora “muralhas da linguagem” foi utilizada como título de um livro anterior seu no qual diagnostica que a utilização de uma linguagem técnica e academicista por pesquisadores, cientistas sociais e educadores, jornalistas, líderes sindicais e políticos que buscam atuar na defesa e na organização dos trabalhadores, acaba gerando um bloqueio de comunicação que anula suas intenções e esforços. Não se trata, todavia, de um livro contra o rigor científico.

Pelo contrário, a questão é como traduzir numa linguagem acessível para a grande massa de trabalhadores, num país de brutais desigualdades sociais e educacionais, pouco letrado e de cultura oral, as descobertas e resultados de estudos e pesquisas científicas em todas as áreas para que as mesmas sejam entendidas e ganhem sentido de transformação política.

O Dicionário de Politiquês de Vito Giannotti e Sérgio Domingues é continuidade e consequência de Muralhas da Linguagem. Se naquele livro o leitor fica convencido que a linguagem é um poderoso instrumento de educação e de luta política ou uma matéria prima da luta hegemônica, o Dicionário é uma primorosa, original, claríssima e convincente aula de como se derruba a muralha e se cria elos claros de comunicação. Fruto de uma longa vivência, sensibilidade popular, leituras, olhos e mente abertos e compromisso humano e político, Vito e Sérgio garimparam centenas de palavras utilizadas em debates, cursos, conferências, noticias, etc com trabalhadores rompem o muro que engendram e as traduzem para seu sentido político seja entendido. Tratase, como eles assinalam, de traduzir as palavras complicadas, muitas tidas como simples, mas que não são, em fermento, força e convencimento político na defesa dos direitos e interesses dos
trabalhadores.

Em cada palavra traduzida um elo que amplia a luta hegemônica e um impar exemplo de compromisso com a transformação radical da sociedade que explora, mutila e avilta os trabalhadores.

* Gaudêncio Frigotto. Professor da UERJ (Fac. de Educação) e Titular (aposentado) na UFF.  Membro do GT Educação, Políticas e Movimentos Sociais do CLACSO e do Conselho Acadêmico do IPECAL, com sede na cidade do México. É sócio-fundador da ANPED.