[Por Jéssica Santos] “Eu não estou camelô, eu sou camelô”. Após 28 anos trabalhando nas ruas do Rio de Janeiro, Maria do Carmo, conhecida como Maria dos Camelôs, celebra sua história de luta e resistência. Sendo camelô, ela não só sustentou a família e criou quatro filhos, como traçou uma trajetória de luta por moradia digna, direito ao trabalho e pelo fim da violência da Guarda Municipal contra ambulantes, da qual ela mesma já foi vítima.  Mãe, feminista, trabalhadora e coordenadora do Movimento Unido dos Camelôs (MUCA), Maria dos Camelôs foi a entrevistada do programa Quintas Resistentes que foi ao ar dia 16 de março.

Maria afirma que, mesmo com as mudanças de governo, a forma como o trabalho dos camelôs é tratado continua se repetindo. “A gente vive o contexto de retirar a gente da rua. Nós somos o lixo da cidade. Nós contribuímos para a economia, mas não existimos como trabalhador”, afirma. Entre as principais barreiras que acompanham os camelôs, estão justamente quem deveria levantar soluções para os trabalhadores. “O nosso principal problema sempre foram os prefeitos”, conta Maria, complementando: “Para mim, o prefeito que será bom para os camelôs é o prefeito que der autorização, organizar e não vai deixar outra pessoa chegar e desorganizar o que ele fez. Vai ser o prefeito que irá reconhecer os camelôs como trabalhadores, dando licença, fazendo depósito e criando feiras. Protegendo a gente de um jeito que não vai deixar outro chegar e tirar os nossos direitos”.

Em um contexto de desemprego e precarização do trabalho, muitos são obrigados a atuar na informalidade para sobreviver. No entanto, para alguns, ser camelô é uma forma de trabalhar e viver. “A gente não escolheu vir para a rua, ninguém saiu de um trabalho formal e disse: ‘Eu ganho muito bem e hoje eu quero ir para a rua trabalhar como camelô’. Mas depois que a gente vem, a gente não quer mais sair. Eu não estou camelô, eu sou camelô. Estou há 28 anos e quero estar aqui”, afirma. Ainda assim, conta Maria, é um trabalho com muitos desafios e dificuldades. “A minha jornada de trabalho não é menor que a de ninguém, eu trabalho muito”, destaca. Mesmo sendo um trabalho que ela gosta de desenvolver, Maria afirma que a precarização torna tudo mais difícil e por isso a luta pela garantia de direitos é tão importante.

Com o tema da informalidade na ordem do dia devido as discussões relacionadas aos entregadores e aplicativos, Maria lembra que essa questão sempre foi a realidade dos camelôs. “Estamos discutindo hoje a questão da informalidade e do aplicativo, mas os camelôs já estão na informalidade há muito tempo, já estamos nessa briga há muito tempo,” lembra. Para encarar tantos desafios, Maria acredita na força da união. “Eu acredito na construção coletiva da sociedade. Morei em uma ocupação e para mim foi a melhor época da minha vida. Na ocupação Chiquinha Gonzaga aprendi a viver coletivamente, a viver junto com pessoas, com trabalho coletivo e que você só vai chegar a algum lugar se tiver junto, se construirmos juntos”, ressalta.

Confira a entrevista: