[Por Gabriela Ferreira*]

O programa Quintas Resistentes iniciou sua segunda temporada com novidades e foi repaginado. Podemos esperar a participação de convidados cativantes e temas provocantes. Na super-reestreia, no dia 3 de junho de 2021, o programa contou com a participação de Paulo Joanil da Silva, mais conhecido como Padre Paulinho. Membro da Congregação Missionária Oblatos de Maria Imaculada (OMI), agente da Comissão Pastoral da Terra do Pará (CPT-PA), assessoria regional das Cebs e da assessoria do Instituto de Pastoral Regional (IPAR), além de participar da formação dos leigos. 

Natural do Sul de Minas Gerais, o mineiro inicia o bate-papo relembrando sua infância, seus pais, e o início de sua vida na CPT. O padre relembra os valores que herdou de sua família e, principalmente de pai — que define como um “revoltoso”, desde sempre inconformado com as injustiças sociais que vivia e presenciava. Assim, juntamente com seus irmãos, foi bastante influenciado pela figura paterna. Paulinho se deu conta então que deveria estudar para não se tornar um escravo no “cabo duma enxada” de um patrão. O jovem Paulo diz que participou da luta estudantil pelo fim da ditadura militar, da luta operária, por moradias dignas, entre outras causas e manifestações estudantis quando ainda fazia parte do seminário. A região Sul do Pará, por ser um local de diversas manifestações e conflitos, o atraiu ainda jovem, quando foi para lá e de onde nunca mais saiu, permanecendo até hoje.

Padre Paulinho recorda sua vivência com Irmã Dorothy, Irmã Rebeca, padre Josimo, Gabriel Pimenta, entre tantas outras figuras que “incomodavam o sistema dos latifundiários” e que ele considera como heróis do povo, mártires da luta pela terra e da reforma agrária.  A esses, ele soma os camponeses, trabalhadores rurais, sindicalistas, militantes, lideranças leigas que foram ameaçados e assassinados pelo latifúndio e que são verdadeiras inspirações para ele. Incontáveis denúncias contra os poderosos latifundiários e grileiros da região foram feitas, mas nada acontece, segundo o religioso.

“O evangelho é subversivo”

A CPT foi criada apoiando-se no princípio de que a terra existe para nos dar sustento e não pode ser reduzida à condição de mercadoria, a Comissão Pastoral da Terra tem como principal missão a luta por acesso à terra e à moradia adequada para todos. Com relação à questão da propriedade privada da terra e de sua concentração nas mãos do latifúndio, padre Paulinho afirma: “É antibíblico e anticristão!”, e continua: “Assim, precisamos levantar essa bandeira, a missão de conservar a subversão da profecia evangélica, o aspecto revolucionário do evangelho: Nós somos discípulos de um revolucionário político. Nós somos parte da terra. Para nós, a terra não é um negócio, não é propriedade privada, não é para ser explorada”, afirma. 

A CPT, juntamente com outros grupos e movimentos sociais, realizou diversas ações contra a fome no período da pandemia, quando foram distribuídas cerca de 6 toneladas de alimentos doados para quem passa fome na região de Belém. Alimentos sem agrotóxico, doados pelo MST. E ações solidárias como essas foram praticadas em muitos estados brasileiros. Para o padre, o produto da reforma agrária é para ser distribuído e a ordem é ninguém passar fome. Portanto, para padre Paulinho, a reforma agrária é o caminho: “A concentração da terra é o pecado mais grave contra Deus! Por isso, nós lutamos contra o latifúndio e contra a apropriação ilegal criminosa”, declara.

Teologia da terra 

O religioso recorda ainda a Campanha da Fraternidade do ano de 1986, cujo tema era “Terra de Deus, terra de irmãos”, que já falava sobre a questão da terra no Brasil a ser solucionada evangelicamente, ou seja, dentro da justiça e da fraternidade. “Nenhum livro da Bíblia justifica a concentração de terra e a propriedade exclusiva, sempre há um bem comum”, diz.

Quando questionado como está a luta pela terra no momento atual e qual a situação dos que lutam por esse direito no país, ele afirma: “enquanto a terra for concentrada, não existe democracia verdadeira. Enquanto o pão, o alimento desse país estiver nas mãos do agronegócio e de grandes grupos econômicos que só veem o financismo, não existe democracia.”

Padre Paulinho denuncia que cada vez mais aumenta a concentração de terras no Brasil. O produto dessa situação é o avanço do agronegócio, a exploração ilegal de recursos, a violência no campo contra indígenas, quilombolas, camponeses, ribeirinhos e a qualquer um que lute contra esse sistema que ele chama de “agromorte”. Dos anos 90 até os dias atuais, os povos do campo e das florestas batalham contra novos inimigos e são cercados por novos perigos: os grandes projetos, as hidroelétricas, as ferrovias, os agrotóxicos etc. 

Apesar das injustiças sociais criadas no campo e nas cidades pelo modelo econômico adotado no Brasil, descaradamente a favor dos grandes latifúndios e empresas e contra os mais pobres, o padre declara que precisamos de esperança. Para ele, a luta pela terra não tem fim e quem têm o poder são os oprimidos. “Nós temos esse legado, somos o povo da resistência agora, nessa utopia”: “Nenhuma família sem casa, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos”, conclui padre Paulinho, citando essa fala do Papa Francisco.

A CPT, necessita de apoio pois conta com agentes voluntários, em sua maioria. Portanto, para contribuir com o trabalho, acesse o site: https://www.cptnacional.org.br/index.php/acoes/campanhas/campanha-permanente-de-solidariedade

SUGESTÃO:

Leia a carta aberta do encontro dos bispos da Amazônia ao povo brasileiro:

“Bispos da Amazônia, em carta, afirmam que os olhares ambiciosos se voltam sobre o bioma e lançam sobre ele a depredação que ameaça a vida.”

SUGESTÃO DE FILME:

O Anel de Tucum

Veja a edição completa do Quintas Resistentes:

* Gabriela Ferreira é jornalista e faz parte da Rede de Comunicadores do NPC.

Edição e revisão: Moisés Ramalho – jornalista e antropólogo