Por Altamiro Borges
O Observatório da Imprensa publicou na semana passada reveladora entrevista com o jornalista Marcelo Beraba, ombudsman da Folha de S.Paulo, que encerrará a sua função no cargo no próximo domingo, 8 de abril. Após cumprir três mandatos anuais, monitorando a cobertura deste veículo da famiglia Frias, ele se mostra pessimista com relação ao futuro dos jornais brasileiros.
Em síntese, Beraba avalia que a imprensa cobriu mal as últimas eleições no país, o que feriu ainda mais a sua já combalida credibilidade, e que as redações passam por um processo de esvaziamento, o que resulta na piora de qualidade do jornalismo.
Cobertura partidarizada – Mesmo resistindo à idéia de que há uma “conspiração da mídia” contra o governo Lula e as esquerdas, o ombudsman considera que falta equilíbrio à imprensa nacional. “A cobertura crítica que a Folha imprimiu nessas duas eleições em relação ao governo federal e ao PT foi compreendida por parte dos leitores como um posicionamento pró-tucano, pró-PSDB, anti-PT e anti-Lula.
Em vários momentos eu considerei que o jornal não estava tendo o equilíbrio que deveria ter e apontei isso. Mas apontei também que esse problema não era restrito à Folha. Acho que vários outros jornais tiveram problema parecido”, revela Beraba.
De forma cuidadosa, ele mesmo confirma que a mídia blindou o candidato da direita, Geraldo Alckmin. “Terminamos a eleição presidencial e não se viu um balanço sério, profundo, do que foi o governo Alckmin em São Paulo. E, no entanto, são jornais de São Paulo, Folha e Estadão.
O balanço que se tem do governo federal, crítico, está correto. Mas tinha que se fazer também do governo estadual. E não só para contrabalançar a outra cobertura. Trata-se do maior estado do Brasil, onde está concentrado o segundo orçamento do país”. Apesar disto, Beraba insiste que não houve uma “conspiração da mídia”.
Jornalismo de má qualidade – Além da cobertura partidarizada, o ex-ombudsman do principal veículo da famiglia Frias também critica a piora de qualidade da mídia. Para ele, as redações hoje esvaziadas são reféns de Comissões Parlamentares de Inquérito, da Polícia Federal e do Ministério Público.
“Quando se faz boa cobertura, de investigação própria, se tem material bom. Mas isso está cada vez mais raro. Os jornais viraram caixas de ressonância do Ministério Público, da PF, da CPI, portanto da oposição”, critica. Esta dura avaliação reforça a tese do professor Venício de Lima, no livro “Mídia, crise política e poder no Brasil”, de que a imprensa adotou a postura fascistóide da “presunção da culpa” para detonar a reputação e desqualificar as esquerdas no país.
Bastante cético, Marcelo Beraba avalia que o jornalismo brasileiro vive um de seus piores momentos. “As redações ficaram muito debilitadas com essa crise toda dos últimos anos. Não estão paralisadas, não estão estagnadas, mas a mudança é pontual, é reposição de peça”.
Ele inclusive questiona recentes pesquisas do Ibope, que apontam a mídia como segunda ou terceira colocada entre as instituições mais respeitadas pela opinião pública. “Eu acho que isso se dá principalmente por causa de um entendimento do passado. Tem-se um percentual muito pequeno de leitores de jornal.
Os três grandes jornais perderam nos últimos cinco anos aproximadamente um terço da circulação. Isso equivale a dizer que um deles já teria acabado”.
Um diagnóstico revelador – A perda de credibilidade da mídia impressa, conforme constatação do ombudsman da Folha de S.Paulo, é hoje uma realidade mundial. Ela se dá por distintas causas: crescente rejeição às manipulações da ditadura midiática; taxas declinantes de crescimento da economia, que tornam os jornais mais inacessíveis; intenso processo de monopolização e internacionalização do setor; com a asfixia de inúmeros veículos; avanços tecnológicos na área da comunicação, em especial com a feroz concorrência da internet; entre outros.
O resultado tem sido a expressiva queda nas tiragens dos jornais e mesmo a morte de vários veículos, o que confirma uma crise da mídia hegemônica e abre espaço para formas alternativas de comunicação.
Artigo da revista inglesa The Economist, de setembro passado, intitulado “Quem matou o jornal diário?”, chegou a prever o fim desta mídia num curto espaço de tempo. Num levantamento detalhado, comprovou que a circulação dos jornais na maior parte do mundo – com exceção da China, Índia e Japão – tem caído de forma acelerada.
Entre 1990 e 2004, houve um corte de 18% no número de trabalhadores da indústria gráfica dos EUA. Já o pesquisador Phillip Meyer, autor do livro “O desaparecimento dos jornais”, chegou a datar, em 2043, o desaparecimento dos jornais nos EUA. Até o editor de um dos principais veículos deste país, The New York Times, afirmou recentemente que não sabe se a edição diária continuará sendo impressa daqui a cinco anos. Como salvamento, pregou “a transição da folha impressa à internet”.
(Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB, editor da revista Debate Sindical e autor do livro “Venezuela, originalidade e ousadia” (Editora Anita Garibaldi, 3ª edição).