Eu não sei se qualquer um de vocês que são repórteres já cobriram guerras em seus próprios países, mas é realmente estranho, de alguma forma engraçado. Editores que choram enquanto lêem a história de seus repórteres, fotógrafos que não suportam o que vêem, colegas ligando a seus filhos no meio da noite depois de ver fotos do sul, sons estranhos durante os encontros editoriais (você sabe que homens gostam de esconder suas lágrimas e emoções), mulheres usando preto como um reflexo natural, homens criando barbas, nem nosso publisher usa terno mais.

 

Pessoas estão dormindo aqui, em algum lugar do porão. Mulheres dormem em apartamentos mobiliados nos arredores. De manhã, nós não nos cumprimentamos mais; nós apenas nos olhamos fundo nos olhos. Alguns viram as caras, alguns dão sermão sobre a necessidade de ser forte. Nós tocamos um ao outro bastante. Abraços aqui, agarrar de mãos ali, um mero tapa no ombro … você imagine.

 

Pessoas ficam uma perto da outra. Ninguém gosta de ficar sozinho no escritório. Nós pedimos comida e comemos juntos. Mas nós nunca falamos de qualquer coisa referente ao que está acontecendo. Nós assistimos às notícias juntos, choramos, rimos, mas não dizemos nada e aí voltamos ao trabalho.

 

Se alguém sai, a única pergunta que faço quando volta é quantas palavras e quando terminará o texto. Sem detalhes, ninguém quer dizer o que vê. Nós escrevemos chorando, lemos e choramos, mas nunca conversamos sobre isso.

(Leia o artigo completo em www.piratininga.org.br/ na seção Outros Temas)

 

Saada tinha lágrimas nos olhos ontem no escritório. Eu fui conversar com ela e ela respondeu e suas lágrimas continuavam a cair, mas nós duas nos comportamos como se nada estivesse acontecendo. Não vi suas lágrimas e ela não estava chorando.

 

Zeinab me ligou de Tiro ontem. Ela estava no hospital. Ela me dizia alguma coisa sobre sua história e de repente começou a gritar você não pode acreditar no que está acontecendo aqui, você não pode acreditar no que está acontecendo aqui, oh Hanady, por favor, khalas, por favor, não posso mais agüentar. Depois, abruptamente, ela parou e voltou ao seu tom de voz normal e acabou nossa conversa profissional.

 

Ontem, Wajdi e Ali decidiram me levar para os lados da costa. Eles quase me arrastaram do escritório, me colocaram no carro e dirigiram através Hamra até Corniche.

 

Eu olhava para as ruas, as casas, os carros, as lojas como se fosse pela primeira vez. Eu não ia a Hamra desde que isso começou. Eu fui até os subúrbios do sul para checar os estragos, fui a escolas e parques onde os refugiados estão, mas no restante do tempo ficava no escritório e ia para casa.

 

Então, fomos até o Manara Corniche, onde me deram café, sentamos no banco e eles começaram a fazer planos para quando isso acabasse. Eles concordaram que deveriam levar suas famílias para Sharm el Sheikh, no Sinai, Egito. Lá, as crianças nadariam e eles poderiam descansar. Eu disse a eles que todos no jornal deveriam tirar uma semana quando isto acabasse, para descansar. Então eles sugeriram que todos fôssemos juntos a Sharm el Sheikh.

 

Eu disse que estava alugando um andar inteiro em um hospital no Egito para pacientes psiquiátricos, chamados assfouriyeh. Eles sugeriram eu fizesse reservas agora, pois no fim da guerra, o preço dos quartos em Assfouriyeh vão aumentar. Eles falavam como se tivessem certeza de que isso acabaria antes de o verão terminar, como se tivessem certeza de que Sharm el Sheikh ainda existiria, como se tivessem certeza de que fora desse país, a vida ainda continuasse.

 

Sempre achei que tivesse uma mente limitada. Para mim, a vida acontece aqui e agora.