Por Pedro Henrique Neves, Tribuna da Imprensa (www.tribuna.inf.br), 16/4/2005
 

A popularidade que alguns dos personagens de Henfil – como a Graúna, o Capitão Zeferino e o Orelhão – alcançaram dentro do imaginário brasileiro é inegável. No entanto, somente depois de 17 anos de sua prematura morte, vítima da Aids, o desenhista ganhará a primeira retrospectiva de sua carreira, na exposição “Henfil do Brasil”, que será inaugurada na próxima terça-feira (19/4) no Centro Cultural Banco do Brasil.

“Daria para fazer algumas exposições com o material que ele produziu. Deixamos muita coisa de fora e, mesmo assim, vamos apresentar 500 trabalhos dele, todos vindos do acervo do Ivan, filho do Henfil”, resume Júlia Peregrino, que assina a curadoria da mostra ao lado do crítico de arte Paulo Sergio Duarte.

“A geração de hoje não conhece o Henfil, o que é lamentável. Acho importante também um centro cultural acolher uma exposição de desenhos, que ainda são considerados por muitos como uma arte menor”, analisa.

Júlia não se preocupou em organizar os trabalhos cronologicamente. Preferiu colocar o foco nos personagens que Henfil criou, dividindo a mostra em seis blocos – “A turma da caatinga”, com Capitão Zeferino, Bode Orelana, Graúna, Onça Glorinha e Grauninha, os Fradinhos, Ubaldo, o paranóico, e o Orelhão. Outro bloco será destinado aos personagens que fizeram sucesso nas páginas de esporte, como o Bacalhau, o Delegado Flores e o Urubu. As charges – a maioria com forte cunho político – estarão no último bloco.

Dentro do contexto

Apesar de muitos acharem que a obra de Henfil está repleta de referências às lutas políticas em que se envolveu – a maior dela nos anos de chumbo e, posteriormente, nas campanhas pela anistia e por Diretas-Já, a curadora garante que os desenhos não são datados.

“Quando analisamos tudo, vimos que se tratava de uma produção absolutamente contemporânea. É claro que muitos jovens que irão à mostra não sabem o que foi o AI-5, por exemplo. Então terá algo escrito, para contextualizar. Fora isso, alguém que não conhece o trabalho dele poderá identificar tudo na hora. Todos vão entender a piada”, afirma.

Apesar da sagacidade do humor do artista ser atemporal, o fato é que a exposição também terá um sabor de revival das décadas de 60 e 70, quando boa parte da produção do desenhista se estabeleceu, elegendo os problemas brasileiros como tema preferido. Prova de que o País não mudou de lá pra cá, algumas de suas tiras – como a da Graúna – ainda são publicadas em diversos jornais.

Saudade dos amigos

A vida abreviada pelo vírus da Aids – contraído por transfusão de sangue, em decorrência da hemofilia – não impediu Henfil de se transformar em uma espécie de unanimidade nacional ainda em vida. Esta popularidade pode ser comprovada nos depoimentos contidos no catálogo da mostra, em que alguns amigos do desenhista prestam saudosos depoimentos.

“Ele nos obrigou a olhar o Brasil do jeito que ele era. E é. Foi um diabo de um humorista um anjo muito puro que passou por aqui feito um vendaval escaldante, mas deixando tudo arejado, ventilado”, diz Cássio Loredano. “Idiotas, já conheci milhares. Talentos, muitos. Grandes talentos, poucos. Gênios, só dois: Garrincha e Henfil”, arremata o Jaguar.

HENFIL DO BRASIL – Retrospectiva da carreira do desenhista. Inauguração na terça-feira. Centro Cultural Banco do Brasil (R. Primeiro de março, 66 – Centro). Tel: 3808-2010. De terça a domingo, de 10h às 20h. Entrada Franca. Até 26/6.