[Publicado em 25.01.2011 – Por Vito Giannoti]

Neste final de Janeiro, assistiremos a uma importante luta entre a classe operária italiana e a Confederação das Indústrias. Se depender da disposição dos metalúrgicos da Fion esta será uma das mais dramáticas batalhas trabalhistas dos últimos 60 anos naquele país. Trata-se da greve contra o acordo dos metalúrgicos da Fiat de Miraflores que trará  conseqüências para a organização sindical na Itália.

O resultado do plebiscito do dia 15 de janeiro na Fiat/Mirafiori foi totalmente diferente do que a empresa e as centrais que assinaram o acordo no dia 23 de dezembro esperavam. As três maiores centrais depois da FIOM, ligada à CGIL, perderam a parada.  O SIM ao acordo por elas firmado ganhou por pouco. Mesmo assim, graças aos votos dos funcionários da administração que concentra os chefes de seção, departamento, etc.                                          

Mesmo com toda a pressão das centrais alinhadas com a Fiat, mesmo com a chantagem da direção da empresa de fechar a fábrica de Turim e se mudar para Detroit, mesmo com o ridículo Berlusconi dizendo que era para fechar mesmo, mesmo com toda a mídia em abertíssima campanha pelo SIM, este só obteve 54% de apoio. A oposição dos operários ao acordo assinado pelas centrais ficou claramente demonstrada. 

A estrutura sindical italiana

Pela estrutura sindical italiana, dentro da fábrica há uma representação Interna, chamada Representação Sindical Unida (RSU). Até 1993, a eleição da RSU era feita com “listas brancas”, isto é, os candidatos eram escolhidos sem serem apresentados por algum sindicato. Bastava só colocar o nome e a seção. Após 1993, os sindicatos passaram a apresentar suas chapas com os nomes dos candidatos. Só podia ser apresentada chapa por sindicatos, nacionais ou locais, que alcançassem 5% de trabalhadores de uma empresa.  Hoje, dentro da Fiat/Mirafiori há quatro centrais maiores que negociam e com as quais a empresa quis assinar o acordo em questão. São estas: a Fiom, ramo metalúrgico da CGIL, a federação metalúrgica da CISL, a federação metalúrgica da UIL e uma Federação de uma sindicato criado pela própria Fiat na década de 1950, um tal de Sida. Todas elas, menos a Fiom assinaram o Acordo que a Fiat apresentou e toda a mídia, toda a direita, o centro direita e o centro-esquerda apoiaram e batalharam para ser implantado com o plebiscito de Mirafiori.                                                                                                                                                  

Hoje, nas várias RSUs da Itália há até sete sindicatos participantes: os das quatro grandes centrais e outros três da área dos Cobas ou sindicatos autônomos. No setor metalúrgico, a Fiom tem, aproximadamente, 30% de filiados.

Na Fiat/Mirafiori existem, hoje: Fiom (Cgil), Fim (Cisl), Uilm (Uil), Ugl (direita), Fismic (ex Sida- da Fiat de Valletta). Todos estes participam das negociações. Existem também os Cobas e a Usb (sindicatos de base) que participaram das eleições das Rsu e elegem delegados, mas não são admitidos nas negociações. Não é suficiente, então, coletar os 5% das assinaturas dos trabalhadores. É preciso também concordar com o caminho da negociação que é decidida pela empresa para poder participar. A Fiom não participou da última fase da negociação do acordo do 23/12, porque entendia que os pressupostos eram os mesmos de acordo da Fiat/Pomigliano, que a Fiom se negara a assinar.

 

Dia 28, uma greve divisor de águas

 

Há uma divisão forte na CGIL, maior Confederação sindical italiana, sobre a política sindical a ser levada. Esta divisão é sobre o papel dos sindicatos, se devem ser instrumentos de luta de classe e de transformação social ou devem procurar um Pacto Social. A maioria da direção da CGIL apoia o Pacto Social e está em desacordo com a política mais à esquerda levada pela sua federação metalúrgica, a Fiom. Na semana passada o site da CGIL não tinha a greve na sua agenda. Nesta semana já tem. A secretária geral da Confederação Susanna Camusso estará na manifestação no dia 27, em Bolonha. 

Com relação ao Acordo de Mirafiori se colocou contra, mas… não demais. Propôs que a Fiom fizesse uma chamada “assinatura técnica”, algo como colocar em baixo “ciente” e com isso não ser excluída das negociações e representação sindical como determina o malfadado Acordo. A Fiom bateu pé e convocou a Greve Geral para derrubar a imposição patronal. Junto com a Fiom estão muitos sindicatos de base, os da área Cobas e outros e vários sindicatos de outras categoria que não aceitam o Acordo de Mirafiori que poderá ser imposto a todos os trabalhadores italianos.

 

Do ponto de vista partidário, todos os partidos italianos com representação no Parlamento estão apoiando a proposta. A direita com seus vários agrupamentos que mudam de nome como de camisa, é a favor total do Acordo FIAT/CENTRAIS colaboracionistas. Os argumentos são vários. Dois são centrais: reduzir o custo do trabalho italiano às custas dos trabalhadores e de embrulho destruir o que sobra de sindicalismo.

 

Desde a década de 1990, a Itália, com quase todo o mundo entrou na era neoliberal. O outrora Partido Comunista Italiano (PCI), o mais poderoso do Ocidente, que chegou a ter mais de 30% de votos, se derreteu e dissolveu. Seu espólio foi tomado em grandíssima maioria pelo Partido da Esquerda (PDS), hoje chamado de Partido Democrático (PD). Uma parcela menor se agrupou no Partido da Refundação Comunista (PRC), e uma pequena parcela criou agrupamentos menores. O antigo Partido Socialista (PSI) foi enterrado debaixo de toneladas de corrupção mafiosa. Hoje, a esquerda, não considerando o PD como esquerda e sim como um partido socioliberal, não conseguiu eleger um único deputado ou senador.

 

O Partido Democrático (PD) esquecendo sua antiga origem no PCI também, na sua linha socio-liberal ou liberal-democrática, não gosta do Acordo da Fiat/Mirafiori, mas defende o Pacto Social. É totalmente contra a Greve Geral, obviamente.

 

O Partido da Refundação Comunista condena o Acordo, apóia a Greve Geral convocada pela Fiom e condena o Pacto Social. Outros agrupamentos menores que na Itália chamam de “extrema esquerda” também estão com os trabalhadores que disseram NÃO.

 

A Greve Geral do dia 28

 

O que está em jogo na vida sindical italiana é uma virada histórica que seria a maior desde o fim da Segunda Guerra Mundial. É uma mudança total dos princípios e dos valores construídos em 60 anos de lutas da classe operária italiana.

As grandes conquistas frutos de milhares de greves, manifestações, piquetes e com dez
enas de mortos, podem ser resumidas a três. Durante décadas a Itália foi campeã mundial de mobilização operária com milhares de greve, dezenas de Greves Gerais e centenas de manifestações. Tudo isto sempre importunou enormemente os patrões da Confindustria. Seu plano sempre foi o de acabar com todas estas conquistas.

 

A direita toda, em peso, através de seus aparelhos ideológicos e de poder está em campanha para que o Acordo que o diretor da FIAT, Marchionne, combinou com as federações metalúrgicas parceiras dentro da Fiat e com a Crhysler, a nova sócia internacional da Fiat, desde janeiro, seja implantado. Ou seja, está em campanha mortal para que a greve seja um fracasso e com isso se abra caminho para a destruição das quatro maiores conquistas  dos operários italianos.

 

– 1- Contrato Coletivo de Trabalho para cada categoria que regulamenta toda a contratação (salários, horários, condições de trabalho, etc. etc..)

-2 – Direito de representação sindical, isto é participação das centrais (através de suas federações) nas negociações por categoria.

– 3 – Impossibilidade de acordos que retirem direitos. Nenhuma empresa fazer acordos inferiores ao Contrato Coletivo.

– 4 – Estatuto do Trabalhador. Toda uma série de normas do trabalho estabelecidas em lei e com poder normativo, reconhecidas na Constituição. (desde o direito irrestrito de greve, até a saúde e segurança no trabalho)

O que está em jogo nesta Greve Geral

 

Na avaliação de muitos especialistas e lutadores sindicais este é o momento mais crítico para o sindicalismo italiano, desde 1945.

A Confindustria está em campanha para que o Acordo da Fiat seja aplicado e estendido a todas as empresas de qualquer categoria.  Com isso eliminaria o Contrato Nacional das categorias que passaria a ser optativo. As empresas que quiserem aplicá-lo o aplicariam, as outras não. E sobretudo a Confindustria se livraria de toda a tradição de luta do sindicalismo italiano.

 

Várias categorias estão se preparando para tornar o dia 28 um dia de luta pela garantia dos direitos dos trabalhadores e pela sobrevivência dos sindicatos. Estudantes, movimentos sociais, organizações da sociedade civil não anestesiadas pela direita, estão se mobilizando pela greve do dia 28.

A greve do dia 28 na Itália não será fácil. A mídia está quase totalmente controlada pela direita. O primeiro Ministro é dono de quase toda a mídia italiana: A rede Mediaset compreende, entre outros, os três canais televisivos Canale 5, Rete 4 e Italia 1. Além da TV, Berlusconi controla a RAI, três canais de Tv pública e dois jornais diretamente e as principais editoras. Berlusconi tem ainda ampla maioria no Parlamento que aponta os membros do conselho da RAI. Toda a direita, da moderada à extrema, estão em campanha pelo
fracasso da greve. A chantagem da Fiat de fechar sua fábrica de Turim e levar a Confindustria a fazer o mesmo em muitas outras é uma arma poderosíssima numa Itália com um desemprego dos maiores da Europa (30% dos jovens entre 14 e 29 anos estão desempregados). Neste quadro se dará a greve do dia 28 de janeiro.