Em entrevista exclusiva para o Terra Sem Males, o pré-candidato do PSOL à presidência do Brasil, Guilherme Boulos, falou sobre sua recente visita à Palestina, sobre a resistência dos movimentos sociais e partidos de esquerda diante da atual conjuntura, o cenário eleitoral e propostas para governar. Confira:
Terra Sem Males – Gostaríamos de saber como foi sua viagem à Palestina e se ela faz parte da campanha eleitoral?
Guilherme Boulos: Eu estava nos territórios palestinos, para prestar solidariedade ao povo palestino, me reuni com várias organizações de movimentos sociais e de resistência palestina. Visitei lugares muito simbólicos e importantes. Envolve sim a pré-campanha, faz parte de um calendário de viagens internacionais e começamos pela Palestina, que é um lugar, para nós, bastante relevante no cenário internacional e na resistência popular e democrática.
A questão da moradia entrou no cronograma de conversas durante essa viagem?
Lá eu pude presenciar demolições de casas pelo exército de Israel de forma totalmente arbitrária, retirando os palestinos dos seus territórios, mesmo da Cisjordânia, território que que é reconhecido internacionalmente pela ONU como palestino. Estive então com representantes dessas comunidades.
Falando em moradia, hoje, infelizmente temos essa triste notícia do desabamento de um prédio ocupado por moradores do Movimento MLSM, em São Paulo.
No caso do acontecimento de hoje é um absurdo pois estão culpando os moradores pela tragédia. Então, nós estamos acompanhando o caso, vamos exigir apuração e auxilio às famílias. Ninguém que ocupa quer estar lá. Mas o que não pode acontecer é que os moradores, que são vítimas de uma falta de política de habitação, sejam criminalizados. Isso é um completo absurdo.
Como estão as famílias da Ocupação Povo Sem Medo, de São Bernardo do Campo, após o acordo de desocupação?
A ocupação de São Bernardo saiu do terreno há duas semanas, depois de sete meses, sendo a maior ocupação do Brasil, com oito mil famílias. A ocupação com tanta gente assim é simbólica do que estamos enfrentando no país, uma grande crise social. O que faz tanta gente se reunir em um terreno buscando casa, é o aumento do desemprego, a piora da renda dos trabalhadores e milhares de pessoas nas periferias urbanas todo fim de mês escolhendo se vão comer ou pagar o aluguel. Estes fatos movem ocupações, além da falta de alternativa habitacional. Programas habitacionais no país estão parados, como o Programa Minha Casa Minha Vida sofreu um desinvestimento com as políticas de ajuste fiscal. De qualquer forma quero reafirmar que a Ocupação de São Bernardo é uma mostra de que quando se tem luta, tem conquista.
Nas últimas campanhas muito se ouviu falar sobre pactos de governabilidade para poder governar, e a isso seguiam-se alianças com partidos de direita e com o mercado. Qual é a estratégia de governo do PSOL?
O que foi feito até agora foram políticas vindas de cima para baixo, sem o envolvimento e a mobilização popular. Acontece é que a democracia vai até as eleições. Tem o voto e as 17 horas do dia da eleição, isso acaba. O povo não participa mais. Então a estratégia eleitoral é democracia, é respeitar a Constituição fazendo os plebiscitos. Desde que a nossa constituição foi aprovada, que está lá a realização de plebiscitos. Sabe quantos aconteceram até hoje? Dois. Por exemplo, reformas, como a Reforma Política, que é uma urgência, precisam ser debatidas e decididas via plebiscitos. Sobre a aliança com o mercado, não vamos entrar numa disputa para ganhar e depois entregar o governo, as políticas sociais que devem ser definidas realmente com a população, (entregar) para o mercado. Daí não vale a pena.
De que forma isso vai se dar, de que forma os movimentos vão participar?
Nós não vamos participar deste processo para pensar na próxima eleição. O que vamos fazer é apresentar um projeto para a próxima geração. Por isso, a campanha que já está acontecendo é construída com mobilização calcada num trabalho porta a porta junto aos movimentos sociais. Nós não vamos ser daqueles que dizem em campanha que tem que ter reforma política, enfrentar os privilégios na mão de 1% da população, mas ter campanha financiada por grandes empresas e bancos. Nossa campanha é uma campanha de mobilização popular.
Qual sua opinião sobre essa conjuntura atípica e as eleições no Brasil?
Eu sou pré-candidato a presidente. Estamos pelo Brasil inteiro falando sobre o nosso projeto para o Brasil. Agora, veja bem, nenhuma candidatura se sustenta se não tivermos um ambiente verdadeiramente democrático. Nem eleições justas acontecerão. Portanto a atual conjuntura envolve a luta pela democracia e não invalida a apresentação de candidaturas. A prisão do Lula e a clara tentativa de tirá-lo das eleições é um atentado à democracia. Por isso, não é uma questão do PT ou de quem goste do Lula. Trata-se de uma questão daqueles que defendem a democracia no Brasil. Das pessoas que entendem que quando o judiciário resolve fazer política isso é muito grave para a sociedade brasileira. Porque é o judiciário escolhendo quem pode participar das eleições e ao mesmo tempo proteger um grupo. Não vimos até hoje nenhum grande político tucano ser preso pela Lava Jato.
Sem dúvida o que vivemos hoje é uma ditadura de um judiciário partidarizado, vivemos um pós golpe parlamentar e tudo isso fez com que os partidos e movimentos unificassem de forma emergencial a luta. Acredito que tudo o que vem acontecendo tem recebido forma de resistência. O acampamento é uma prova, as ações do MTST…o Ato do 1 de maio com as seis centrais unificadas, é o Dia Primeiro de Maio da Resistência. Agora, existe sim ainda a falta de envolvimento da população que não está organizada. Concordo que exista uma certa apatia também provocada por uma série de golpes nos direitos das pessoas. O que eu acredito que é preciso fazer é o que a mídia popular já vem fazendo, que é informar. É fazer novamente o trabalho de base, de porta a porta, na rua.
Por Ana Carolina Caldas
Fotos: Annelize Tozetto
Terra Sem Males