Joel Zito acredita que os filmes trazem a possibilidade de conformar ou transformar os imaginários das pessoas. Para ele, “o cinema padrão de Hollywood foi um cinema de conformação do imaginário, um cinema de criação de atos, de vida, perspectiva, de valores. A novela brasileira é uma novela de conformação de imaginário.”

 

Joel diz gostar de produzir obras que busquem questionar os imaginários e as verdades estabelecidas. E afirma que “se você quer tocar num tema tabu, ou numa visão preconceituosa você tem que mexer com as várias dimensões do ser humano, não só com a racionalidade”.

 

Por Katarine Flor

 

BoletimNPC – Quando o sr. percebeu que o cinema poderia ser um espaço de denúncias?

Joel Zito Araújo – Na minha juventude o cinema tinha essa função. Existia um cinema político na década de 70. O cinema de entretenimento não era parte do contexto do cinema em que eu me formei e que me agradou fazer. Óbvio que eu gosto de todo tipo de cinema. Adoro ver Batman, por exemplo. Mas o tipo de cinema que me encantava fazer era esse tipo de cinema que eu me sentia, que me mobilizava como realizador.

 

Até hoje penso quando vou relaxar e fazer alguma bobagem. Bobagem no sentido de um filme que as pessoas vão entrar no cinema pra rir ou sem querer discutir nenhuma questão política ou humana.

Portanto, a linha de diferença que eu acho entre esse cinema de entretenimento e o cinema que eu gostaria de chamar de cinema de reflexão é essa idéia. Em um você entra com um pote pipoca e 1 litro de guaraná ou Coca-Cola e vai desopilar o fígado. Enquanto no outro tipo de cinema, que me agrada fazer, tem a intenção de fazer o público pensar. Cutucar seu imaginário de certa forma.

 

BoletimNPC – Essa era a marca dos filmes da sua juventude?

Joel Zito – Tinha mais fantasia. Achávamos que os filmes poderiam transformar a realidade. Hoje penso que os filmes não têm tanto impacto assim. Eles têm um impacto sobre a realidade sem dúvida, só que um impacto menor que a gente tinha impressão do que poderia ser.

 

Eu continuo achando que os filmes conformam ou transformam os imaginários das pessoas. O cinema padrão de Hollywood foi um cinema de conformação do imaginário, um cinema de criação de atos, de vida, perspectiva, de valores. A novela brasileira é uma novela de conformação de imaginário. Mas tem um determinado cinema, até mesmo feito Hollywood, que questiona os imaginários e a verdade estabelecida. Esse é o cinema que gosto de fazer e o que aprecio como obra.


BoletimNPC – Nesse contexto a mídia comercial colabora para a conformação da realidade?
Joel Zito – Conformação desses imaginários, na perpetuação da nossa injustiça social. Eu não acho que a grande mídia é negativa em tudo. Acho que ela é monolítica. Nos jornais do Rio de Janeiro e São Paulo há ótimas pessoas com bons pensamentos, mas a linha editorial, a tendência da cobertura das matérias é de reforço desse tipo de imaginário.  Eu não acho que a gente viva a ditadura da mídia. Acho que ela é monolítica e que os vetores de pensamento que determinam a maioria das matérias, dos enfoques são muito conservadores e comprometidos em assegurar que nada mude.

BoletimNPC – O senhor tem medo de cair no estereótipo de cineasta que faz filme de uma determinada temática?

Joel Zito – Não. Porque a minha intenção é tocar de forma sensível o problema. É contestação em si. E obviamente se você quer tocar num tema tabu, ou numa visão preconceituosa você tem que mexer com as várias dimensões do ser humano, não só com a racionalidade. Tem que lidar com a emoção, com os sonhos e as fantasias. Enfrentar essas dimensões, então, é o meu parâmetro de crescimento como artista e isso deve ser cada vez mais capaz de lidar com as outras dimensões alem da racionalidade.