O XXVII Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação (Enecom) aconteceu de 04 a 10 de Setembro, na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), em Maceió, capital alagoana, sob o tema: “Qualidade de formação frente ao coronelismo midiático”. Por Júlia Gaspar, set/2005
 

O XXVII Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação (Enecom) aconteceu de 04 a 10 de Setembro, na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), em Maceió, capital alagoana, sob o tema: “Qualidade de formação frente ao coronelismo midiático”. 

A programação contou com quatro painés; dois Cinecom – que aconteciam simultaneamente às oficias; Grupos de Discussão – que ocorriam ao mesmo tempo em que o Simpecos (Simpósio de pesquisa dos estudantes de comunicação); Núcleos de Vivência (atividades externas); Minicursos – simultâneos à mostra e comparação de grades curriculares de diversas faculdades de comunicação social; Grupos de Estudos e Trabalhos; Plenária de Mulheres; Curtacom (mostra de curtas feitos por estudantes de comunicação); Mostra de vídeos sobre combate às opressões; Plenária conjunta com a mesa sobre combate às opressões.


Grupo de Estudos e Trabalhos sobre
Democratização da Comunicação.

No último dia do evento aconteceu o Conecom (Conselho Nacional de Entidades de Base de Comunicação Social) e ficou decidido que o próximo Cobrecos (Congresso Brasileiro dos Estudantes de Comunicação) será em Recife, que ganhou por um voto a sede do evento disputada com São Paulo.  Também foram apresentadas duas chapas para a disputa da próxima diretoria da Enecos (Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social), uma articulada pela atual gestão da entidade e outra de oposição à atual diretoria.

A discussão sobre o próximo Enecom, que era para ter sido decidida no Conecom, ficou para um Conecom extraordinário que acontecerá no Rio de Janeiro, nos dias 12 e 13 de novembro.  Esta foi a solução depois que um estudante da delegação do Rio Grande do Sul pediu um tempo para formular o projeto, a fim de disputar a sede do Enecom 2006 com a Bahia, que já tinha a proposta pronta.  O argumento dele foi que, como o próximo Cobrecos será em Recife, o Enecom na Bahia representaria três encontros seguidos no nordeste, deixando os estudantes do sul em desvantagem no deslocamento.


Grupo de discussão sobre o Direito Humano
à Comunicação, com Jonas Valente.

O Enecom 2005 teve, em média, 1500 estudantes inscritos.  Porém, muitas atividades encontravam-se esvaziadas pela opção de turismo feita pela maioria.  Os que souberam aproveitar a programação tiraram bom proveito.

A exibição de painéis foi inaugurada com Heloísa Helena (P-Sol), Milton Pomar (jornalista e analista político), João Pedro Stédile (MST) e Paulo Eduardo Gomes (vereador – PT).  O assunto debatido foi a Conjuntura Sócio-Política.

Os palestrantes fizeram uma análise crítica do governo, com uma perspectiva de sua disputa, de seus rumos e de ruptura.  Comentaram a posição dos movimentos sociais e analisaram a mídia enquanto forma de perpetuação das elites no poder.

Paulo Eduardo Gomes afirmou que, no Brasil, em relação à comunicação, copiaram dos Estados Unidos tudo o que não interessa e deixaram de copiar o relevante.  Exemplificou, comentando que, aqui, o mesmo grupo pode participar de vários meios de comunicação, enquanto em outros lugares, isso é proibido, o que possibilita a democracia na comunicação, ao passo que facilita uma diversidade de empresas de comunicação veiculando seus programas, já que uma mesma não poderá pertencer a vários veículos.  Esta medida evita o oligopólio.  João Pedro Stédile acrescentou ao lamentar a mídia brasileira como partido ideolígico.

Heloísa Helena abriu o verbo.  Denunciou que, no dia dos políticos corruptos distribuírem dinheiro público privado, contratavam meninas em Brasília para dançarem em cima das mesas e pegarem dinheiro com a boca.  Lamenta ao afirmar que a esquerda precisa de, no mínimo mais 15 anos de trabalho e desacredita que estará viva para ver a Revolução Socialista, mas diz lutar para viabilizá-la. 

Porém, Milton Pomar acredita haver uma conspiração contra o PT.  E que, quando este sair do poder, virá um partido pior.

O segundo painel do evento contou com a presença de Bia (Centro de Mídia Independente – CE), Gustavo Gindre (jornalista e mestre em Comunicação – UFRJ), Taís Ladeira (jornalista, Associação Mundial de Rádios Comunitárias – AMARC) e Jonas Valente (Intervozes e Carta Maior).  Os palestrantes debateram com os estudantes sobre “Políticas públicas e uma perspectiva para uma comunicação alternativa”.  Abordaram o direito à comunicação e a disputa contra-hegemônica, políticas públicas e  meios alternativos de comunicação.


Segundo Painel, com Bia, Gustavo Gindre,
Taís Ladeira e Jonas Valente.

Jonas Valente afirmou ser a mídia uma má escola, que reproduz preconceito e desigualdade.  Abriu os olhos dos estudantes para a concentração dos meios de comunicação em apenas nove famílias brasileiras, impossibilitando o trabalho pelo interesse público.

Gustavo Gindre assustou a platéia ao afirmar que a TV como conhecemos está em vias de desaparecer nos próximos 20 anos.  Ele acredita num casamento entre TV digital e internet, que resultará numa TV interativa (digital).  Mas, lamenta o ministro das Comunicações Hélio Costa optar por comprar o modelo japonês ao invés de apostar no brasileiro.  Desta forma, a TV digital terá a mesma cara que a TV analógica.  Ao final de sua fala, alertou que essas questões estão sendo discutidas agora e que a sociedade civil deve(ria) intervir.

Taís Ladeira falou sobre rádios comunitárias e a disputa pela hegemonia.  Sensibilizou os estudantes com uma pergunta:  “Vocês fazem comunicação para disputar qual projeto de Brasil?”.

Bia incomodou os estudantes ao afirmar a apatia dos mesmos e das pessoas em geral.

No terceiro painel do evento o tema abordado foi cultura popular, com os palestrantes Walter Lima (professor de filosofia da UFAL), Sávio Almeida (doutor em história), Mestre Benon (líder do grupo Treme Terra de cultura regional) e José Roberto (professor de história), que delimitaram o tema de cultura popular falando sobre o etnocentrismo, a identidade cultural e a transformação social. Porém, antes do início do debate, os estudantes tiveram uma surpresa: Uma apresentação de Guerreiro, dança de cultura regional, com o grupo Treme Terra, liderado pelo Mestre Benon, que explicou que esta dança nasceu em 1923.


Apresentação da dança Guerreiro de cultura
regional, com o grupo Treme Terra.

Após a apresentação, os painelistas debateram sobre o assunto proposto.  José Roberto lamentou os grupos de cultura popular que passam fome pelo processo de imposição cultural.  Sávio Almeida completou ao afirmar que a diferença é o que faz a vida interessante.  Walter Lima abordou os estudantes sobre a prática de obediência estabelecida pela oligarquia da produção midiática no Brasil.

Enfim, no quarto e último painel do evento, os assuntos abordados foram: Qualidade de Formação do Comunicador; Reforma Pedagógica dos Cursos de Comunicação Social; Reforma Universitária e Avaliação Institucional.  Como painelistas convidadas estavam Sue (Enecos – SP), Angelita Pereira (coordenadora do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Goiás – UFG) e Milena Martinez (ANDES – Associação Nacional dos docentes de ensino superior).

Sue defendeu uma formação que tenha mais contato com a sociedade, saindo da sala de aula.  Angelita Pereira debateu sobre como garantir qualidade na formação com a redução de carga horária e a flexibilização imposta pelo MEC na Reforma Curricular.

Milena Martinez foi enfática em sua oposição à Reforma Universitária, na qual é estudada a implementação de um ciclo básico comum para todos os cursos, com duração de dois anos.  Caso o aluno abandone a faculdade após este período, terá um credenciamento.  Milena é contra esta possibilidade de formação sem uma especialidade e considera um problema no desenvolvimento do conhecimento.  Outra proposta à qual Milena faz oposição é à regulamentação da educação à distância, que também é pensada para mestrado e doutorado.

Cinecom

O Cinecom foi uma mostra de cinema alternativo.  No primeiro foram exibidas montagens como Quadrilha, do poeta Carlos Drummond de Andrade.  Também um filme sobre a vida e obra de Arthur Ramos, antropólogo que se correspondia com Freud e lutava pela preservação da memória social. 

E o filme mais aplaudido, feito por um ex-aluno da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), foi O Broto da Cana, cujas imagens eram construídas por uma sequência de fotos. O vídeo mostra cortadores de cana infantis com imagens fortes de meninos que, por alguns trocados, trabalham duro cortando mais de uma tonelada de cana por dia. O filme é uma reconstrução do real, passado na Zona da Mata Alagoana, onde crianças são consumidas pelo sistema canavieiro em desrespeito à dignidade humana.

Menores de 10 anos saem de casa em jejum e, no intervalo do trabalho, se alimentam de uma mistura de farinha com caldo de cana, ou apenas chupando cana, na falta da farinha.  Claro que não pelo sabor, mas pela necessidade orgânica.  

No final dos vídeos, Almir Guilhermino (professor de Cinema da UFAL) e Joaquim Alves (jornalista), debateram com os estudantes sobre as exibições e sobre cinema.

No segundo Cinecom foram exibidos dois curtas.  O primeiro foi História Brasileira da Infâmia parte I, de Werner Salles, que conta a história baseada em fatos reais de 90 sobreviventes de um naufrágio devorados por nativos.  Entre as vítimas estaria o primeiro bispo do Brasil, D. Pedro Fernandes Sardinha.  O filme conta também o comport
amento nada cristão deste bispo e a
lei que escravizou índios de várias tribos.

O segundo curta foi Almirante Mercado, de Hermano Figueiredo.  Que conta sobre estar no mundo das pessoas, de forma simples e profunda.
 
 

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Júlia Gaspar é estudante de jornalismo das Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA), Rio de Janeiro.