Para ele, é necessário repensar a qualidade de formação do comunicador porque “os cursos ficaram muito técnicos e abandonaram uma formação mais humanista e mais crítica”. Ele lembra que Haddad havia se pronunciado a favor de uma especialização, e não uma graduação. “Fomos totalmente contra essa posição. Defendemos, aí sim, uma dupla graduação – pode ser jornalista e também economista, historiador e advogado, por exemplo. Só tem a acrescentar. Mas defendemos uma formação completa em jornalismo”.
Torves disse ainda ter expectativa com essa comissão. “Entendemos que é urgente uma melhor formação do comunicador. Não queremos apenas atributos técnicos – como saber lidar com câmera ou web. Queremos uma formação mais consistente na área cultural, econômica, política e social. Esperamos que o MEC adote as nossas contribuições e faça sua reavaliação dos cursos”.
Por uma formação mais crítica
O jornalista e professor de comunicação do UBM (Universidade de Barra Mansa), Álvaro Brito, lembra que a revisão das linhas pedagógicas do curso de jornalismo surge no momento em que está em alta a questão da obrigatoriedade ou não do diploma para exercer a profissão. “Creio que essa proposta do MEC de rever as diretrizes curriculares, que valem desde 2001, é menos por necessidade do que para dar uma resposta à discussão da exigência ou não do diploma de jornalista”. E completa: “É óbvio que é positivo rever e repensar o currículo sempre que possível, mas creio que foi mais para dar uma resposta do que uma demanda de professores e estudantes”.
Em entrevista ao BoletimNPC, Álvaro afirmou: “a proliferação dos cursos de comunicação afetou a qualidade. Houve estímulo do MEC, autorizando e validando esses novos cursos, mas não houve um esforço para fiscalizar. Então foram surgindo muitos cursos, e hoje a maioria do ensino é privado. A principal questão é que os cursos privados, ao contrário de alguns públicos, têm apenas o compromisso com o lucro. Formam um profissional exclusivamente para o mercado. Nelas existe pouco acúmulo crítico, e não são estimuladas outras discussões teóricas no campo da comunicação – ao contrário do que ocorre, por exemplo, em algumas universidades públicas”.
Desta maneira, os jornalistas, sem uma visão crítica da comunicação, acabariam saindo das faculdades para reproduzir o modelo que está consolidado. “E isso é muito complicado no quadro da comunicação em que vivemos: de concentração dos meios, monopólio, a serviço da manutenção da ideologia dominante e criminalizando cada vez mais os movimentos sociais”, analisa.
Brito ainda se manifestou contrário à desvinculação de jornalismo de comunicação social, pois teme que se abra a possibilidade de adequação à lógica do mercado. Mas disse estar aberto ao debate, pois admite que essa não é, inclusive, a posição da Fenaj.
Estudantes querem estudar também filosofia
A Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos) também defende a manutenção de jornalismo como uma das habilitações de comunicação. Segundo o coordenador geral da entidade, Vinicius Oliveira, em entrevista ao Observatório do Direito à Comunicação, o jornalista precisa ter o arcabouço teórico da comunicação.
“A formação puramente jornalística não é suficiente para fazer com que o profissional tenha uma visão mais ampla da comunicação, do seu papel na sociedade. O profissional deve compreender todo o processo, estando preparado para responder às necessidades técnicas do jornalismo, mas também às filosóficas do campo da comunicação”, afirma o estudante.
Professora da UFF questiona acusação de deficiências nos cursos
A jornalista e também professora de Comunicação Sylvia Moretzsohn, da UFF, fez um comentário à entrevista pelo professor Luiz Gonzaga Motta, membro da Comissão de Especialistas formada pelo MEC. A professora questionou o texto de abertura da entrevista. “as deficiências graves na boa prática do jornalismo” apontadas na apresentação desta entrevista decorrerão mesmo da má qualidade dos nossos cursos? Aliás, serão, de fato, “deficiências”? Ou o mau jornalismo que tanto criticamos (pelo menos nos bons cursos, de maneira muito bem fundamentada) decorre de uma opção editorial? O jornalismo “Homer Simpson” resulta de quê? ….”
A professora pergunta se “Uma formação melhor seria capaz de evitar o enfoque preconceituoso em relação aos marginalizados e o apoio às campanhas de “choque de ordem”? Reduziria o grau de frivolidade do noticiário cotidiano?” Para ela, “a melhor formação do mundo é incapaz de confrontar-se com uma política editorial orientada para silenciar o discurso crítico. Por isso não se pode falar em relação direta entre boa formação e bom jornalismo. Por isso, também, seria tão importante que nossas representações acadêmicas se manifestassem mais enfaticamente diante das muitas barbaridades que os jornais produzem todos os dias”.