pré-vestibular

Por Leon Diniz*

Quando eu entrei na faculdade de geografia, em 1987, não sabia bem o que queria exercer como profissão. Só sabia que queria mudar o mundo. Eu era a pessoa mais tímida da face da terra, então, na minha cabeça, não havia a menor possibilidade de ser professor. Logo comecei a participar do movimento estudantil na UFRJ e me vi obrigado a falar nas reuniões de departamento. Aquela timidez começou a abrandar. Em 1990, pouco antes de me formar, meu amigo Paulinho Chinelo me convidou para dar aula no Pré-Vestibular da Mangueira (Associação Mangueira Vestibulares), o primeiro pré-vestibular comunitário da cidade do Rio de Janeiro. Topei o desafio na hora, e só saí de lá quando o pré acabou.

Desde então, estou nessa militância. O pré funcionava na Escola Ernesto Faria, e inicialmente tinha como professores boa parte daqueles que já trabalhavam nessa escola. Na medida em que as pessoas foram se formando, foram se somando à equipe de professores e o perfil dos docentes foi mudando, o que é muito bonito de se ver. Esse pré, infelizmente, teve que sair desse espaço e não continuou com suas atividades por falta de lugar. No entanto, ele não acabou completamente. Teve frutos, como o Vila Isabel Vestibulares (Vive), onde dei aula até o final de 2017. Também dei aula no Pré-Vestibular do CEASM, na Maré, e nesses últimos anos vi, com alegria, o surgimento de muitos outros pré-vestibulares comunitários pela cidade.

Essa experiência foi fundamental pra mim, porque eu, de certa forma, me desencantei com o modelo da escola formal pública e particular. O pré-vestibular comunitário foi, então, o meu grande encontro com a educação. Nós, professores, discutimos o que vamos fazer, os alunos estão ali porque querem, preparamos aulas conjuntas sobre temas como ditadura, mulheres… São aulões de três, quatro horas, com vídeos, textos, fotos, vários professores planejando e atuando juntos. Então, o pré concretiza a possibilidade de uma educação diferente. E proporciona debates internos interessantes, porque há os professores que querem dar aulas preparatórias para o vestibular, e ponto. Já outros estão mais interessados com a questão da cidadania, da formação crítica. Eu sempre fiz os dois. Eu quero que o aluno entre na faculdade, mas também quero que ele reflita sobre a vida, sobre o coletivo, sobre a sociedade e sobre o seu papel nisso tudo.

Atuar em um pré-vestibular comunitário é ter a oportunidade de fazer o trabalho de base que muitos criticam a esquerda por ter deixado de lado. Significa trabalhar em coletivo, se organizar e ter liberdade para pôr em prática a educação em que acreditamos. Muitos alunos saem da escola pública sem qualquer perspectiva. Acham que a universidade não é para eles, que devem entrar logo no mercado de trabalho. E, com o pré-vestibular comunitário, muitas vezes eles voltam a ter a possibilidade de acreditar em si. De achar possível entrar em uma universidade, melhorar a sua vida e a das pessoas ao seu redor. Para mim, o verdadeiro sentido desse trabalho é esse. É colocar em prática uma educação que possa devolver a essas pessoas o que foi roubado delas: a capacidade de sonhar.

 

*Professor de geografia do Centro Educacional Anísio Teixeira (CEAT) e idealizador do Projeto Domingo É Dia de Cinema