[Por Claudia Santiago] Atire a primeira pedra quem nunca cometeu um “erro de português”. Quem nunca trocou um z por um s? Quem nunca falou acumpuntura ao invés de acupuntura? É sobrancelha ou sombrancelha? Tirando aqueles que tiveram o azar de não fazer mais nada na vida a não ser estudar, todo mundo erra. Sim, porque obviamente embora o conhecimento seja uma coisa muito boa, jogar pelada num campinho de várzea, se empanturrar de churrasco e caiprinha nos finais de semana, fazer sexo e tomar banho de mar ou de rio não são coisas de se jogar fora.
Bom, mas voltando ao erro de português. Todo mundo comete, mas quando o presidente Lula dá uma escorregada, o mundo vem abaixo. Tive inúmeras briguinhas com colegas de faculdade, sim, sou jornalista de formação, mas estou fazendo outra graduação, porque seres mal saídos dos cueiros linguísticos faziam troça do jeito de o metalúrgico falar.
Pois é, no sábado, dia 4 de junho, o professor Eraldo Maia, de Arraial do Cabo (RJ), uma das cidades praianas mais bonitas do Brasil, falou bonito à coluna “Gente Boa” do jornal O Globo. “Não existe fala errada. Há, sim, variedades dialetais e de registro, mas nenhum falante fala errado”. Sobre o uso de “cidadões” pelo presidente Lula, registrado como erro pela coluna, Eraldo explica: resulta de uma analogia com o plural em ões, o mais comum nas palavras terminadas em ão. O plural de verão seria verãos, mas o verões foi legitimado, o que não aconteceu com cidadões, embora seja assim que até o presidente fale.
Não é só o presidente não. Já vi muita gente boa se enrolar toda nessa hora. Ah!, mas seria tão bom se estivéssemos aqui debatendo sobre o significado da palavra cidadão, sua origem e quantos podem ser considerados cidadãos no mundo, e não a grafia de seu plural. Ou será que, no fundo, é este exatamente o debate que nos traz o professor Eraldo? Será que Lula é tão vigiado em sua língua e seus hábitos (não nos esqueçamos jamais da emblemática reação midiático-burguesa ao isopor nas costas) porque, no Brasil, trabalhadores braçais ainda não são considerados cidadãos, nem mesmo quando chegam ao mais alto cargo do país. Pode ser.