Por Júlia Gaspar (*), junho de 2005
 

Nos outdoors do Rio de Janeiro, esta é a mensagem: “Todo o mundo PODE, todo o mundo USA”. Os grifos em “pode” e “usa” não são meus, é assim que a Mercatto, comércio de roupas define a sua marca. 

Nesta exibição está evidente a proposta da publicidade, convencer o receptor da obrigatoriedade de consumir. Todo o mundo pode? Pode o que? Estourar os cartões de crédito? No folder da coleção outono/inverno da mesma empresa a média de preços é trezentos reais e a peça em promoção custa noventa e nove reais. O trabalhador que recebe um salário mínimo por mês não pode, o pai de família atolado em impostos e comprometido com a educação dos filhos também não pode, muito menos os 56,9 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza – informação obtida pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). 

Desculpe, propaganda, há um engano, não é todo o mundo que pode. Faz-se necessário uma errata. Preocupante também é uma empresa brasileira dizer que todo o mundo USA. United States of América? 

Nem todos têm a mesma capacidade de entendimento de uma informação. Muito menos vêem o mundo sob a mesma perspectiva. Cada indivíduo tem a sua história cultural, que possibilita compreender, decifrar e representar códigos de diferentes formas.

A partir disso atua a entropia. O quanto uma pessoa “gasta” para compreender uma mensagem, ou seja, as perdas necessárias até que o código se identifique em um determinado paradigma. Porém, os paradigmas mudam de mente para mente. O que representa algo para um indivíduo, não diz, necessariamente, a mesma coisa para outro, depende da experiência de vida de cada um. E nesta “experiência de vida” dos brasileiros está a forte influência da mídia, que passa a ser a ditadora do que é bonito e do que é feio.

Falsas verdades

A estrutura consolidada da comunicação massiva testa-se como instrumento disciplinador à potência máxima absorvível pela prática midiática (Rego Monteiro, Cristina. A Fênix em Chamas). Este trecho reflete o tipo de ligação da mídia com a população.

Mas, se uma pessoa será capaz de utilizar a percepção para não cair nas armadilhas do jogo, dependerá das suas tendências sensitivas. Há os que decifram a informação com elevado grau de percepção sensorial, entendem as reais intenções manipuladoras e não de se deixam enganar. Infelizmente, a maior parte da população não possui este “dom adquirido” e é amarrada por representações de falsas felicidades.

No mundo de hoje, não importa o valor do acontecimento, mas o drama, porque é disso que a mídia vive. As fantasias e as tragédias são o combustível.

A ilusão de que as sandálias da Xuxa tornam as crianças mais próximas da fama obriga os pais a comprarem um calçado pouco duradouro. O exagero de imagens de prédios desabando e parentes desesperados pelo ataque às Torres Gêmeas, em Nova Iorque, não explicou o por quê da situação atingir tal nível. Não se falou dos abusos dos Estados Unidos, ao contrário, este foi eterna vítima. É disto que vive a sociedade, de representações da realidade, que torna pessoas escravas de um sistema e com falsas interpretações do mundo.

Desde um simples objeto comercial até uma forte hegemonia, os indivíduos são manipulados pela mídia. Basta a sensibilidade de cada um para ficar a salvo, interpretando o real significado do que acontece, ou se deixar levar por falsas verdades que representam falsas felicidades e inclusão num sistema de dominação em massa.
 


(*) Estudante de Jornalismo das Faculdades Integradas Hélio Alonso, Rio de Janeiro. Publicado no Observatório da Imprensa dia 14/6/2005