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[Por Sheila Jacob – NPC] O professor Reginaldo Moraes (Unicamp e NPC) e o economista Márcio Pochmann (IPEA) comentaram sobre o mais recente livro “Capitalismo, Classe Trabalhadora e Luta Política no Início do século XXI”. A publicação é assinada por ambos e foi lançada durante o 23º Curso Anual do NPC. Eles apontaram algumas mudanças no perfil da classe trabalhadora no mundo e refletiram como as suas organizações de representação tradicionais, como os sindicatos, não têm acompanhado essas transformações. E ressaltaram que é necessário conhecer esse novo cenário para poder transformá-lo. O livro pode ser acessado na página da Fundação Perseu Abramo.

O professor Reginaldo Moraes destacou a onda conservadora que parece tomar cada vez mais força no Brasil. Segundo ele, estamos convencidos de que a classe trabalhadora está se voltando cada vez mais para a direita. Questionando essa percepção, ele destaca que sempre houve eleitorado conservador forte nesse país. “Não há essa guinada para a direita. O problema é o sentimento de ‘tanto faz’, de apatia e distanciamento das classes populares da política”. Segundo ele, isso sim é vitória da direita, a opção dos trabalhadores de votar em branco e se abster. “Quer dizer que conseguiram avançar a tese de que política não vale a pena, o que resulta em uma despolitização da vida cotidiana”, ressaltou.

Refletindo sobre por que isso está acontecendo, Moraes destacou as mudanças no perfil da classe trabalhadora no mundo. Uma delas tem a ver com a terceirização da economia. Um indicador forte é o crescimento do setor de serviços, o que quer dizer que os trabalhadores não estão mais identificados com uma categoria e, consequentemente, com os sindicatos. “Uma classe social não se reconhece porque está em uma função ou uma faixa de renda. Ela só é classe quando reconhece seu opositor. Quando essa identificação desaparece, ela deixa de existir politicamente. Isso muda o comportamento político, hábitos e valores”. Segundo ele, os EUA são um laboratório das mudanças que se anunciam para o mundo. Algumas características são a flexibilização da legislação trabalhista no sul, para onde as indústrias foram migrando. “A base operária acaba enfraquecendo nesses lugares. Consequentemente, os sindicatos e o partido democrata foram perdendo eleitores”, destacou. Por outro lado, os serviços foram sendo feitos principalmente por migrantes latino-americanos, em regime de salário precário, sem contratos, sem direitos e sem representação pelos sindicatos.

Nesse cenário de classe trabalhadora fragmentada, desorganizada moral, ideológica e politicamente, o cientista político destacou ser necessário pensar em alternativas, já que os modelos tradicionais de organização não estão funcionando. “Temos que entender nossas dinâmicas para não acreditarmos no discurso deles. Eles querem nos convencer de que somos como eles querem. Devemos prestar menos atenção neles, e procurar nos entender melhor”.

Igrejas neopentecostais estão fazendo o trabalho de base

O economista Márcio Pochmann seguiu o mesmo caminho do professor Reginaldo Moraes. Destacou como as organizações dos trabalhadores precisam se atualizar devido às mudanças do perfil da classe, especialmente nos países de capitalismo avançado. No Brasil, ele destacou que o sistema produtivo brasileiro se alterou drasticamente. O peso da indústria no PIB, por exemplo, caiu gravemente. E isso gera impacto na conformação da classe trabalhadora. “Devemos nos perguntar por que, por exemplo, a mudança na lei trabalhista não teve a reação esperada. Foi porque grande parte da classe trabalhadora acha que sua condição vai melhorar. As mudanças vão representar precarização sim, mas só para quem estava empregado de acordo com a lei. Hoje os índices de desemprego e de terceirização no Brasil são muito altos. Se o subproletariado, sem experiência anterior, passa a ter emprego, para ele não houve precarização, mas sim ascensão”, ressaltou.  

Ele disse ainda que é importante reconhecer – e aprender com – o sucesso das igrejas. “O fundamental é o que estão fazendo, construindo a capacidade de identificar o seu opositor. Ou seja, criam um sentimento de identidade, de sociabilidade, de natureza mais comunitária, além de estarem espalhadas pelos bairros. E os sindicatos? Muitos ficam no centro das cidades, não próximo das pessoas, o que é fundamental em uma sociedade urbana”, destacou.

Ele também reconheceu a capacidade de as igrejas prestarem serviços em um momento de “dramática situação de desemprego”. E os partidos e sindicatos não estão tratando disso. “As igrejas recepcionam essas pessoas. Acolhem, abraçam, entendem que o problema é coletivo. Falam de esperança, de confiança. Eles estão fazendo política. Política é isso, é gerar convencimento de que é possível mudar”. Para finalizar, ele ressaltou que a estrutura sindical representa o passado. “Ela é conservadora. É como dirigir um carro olhando apenas para o retrovisor. Para mudar, as instituições de organização dos trabalhadores devem se adequar a essas novas configurações. Pensar seu funcionamento, as formas de financiamento, a democratização de sua estrutura… Temos que entender a realidade para conseguir mudá-la”.