[Por Marina Schneider]

Renato Rovai, Katia Marko e Leandro Fortes

Renato Rovai, Katia Marko e Leandro Fortes

No início da tarde de sexta-feira (23.11), o tema discutido no 18o Curso Anual de Comunicação do NPC foi o uso de plataformas da internet como blogs, sites e mídias sociais no jornalismo. Participaram do debate os jornalistas Renato Rovai, editor da revista Fórum e Leandro Fortes, repórter da Carta Capital.

Renato Rovai

Renato Rovai

Rovai traçou um cenário do acesso à internet no Brasil e do comportamento do brasileiro na rede hoje, com base principalmente em uma pesquisa de 2010 realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil. Segundo ele, apesar de desatualizada – já que estes dados se alteram com muita rapidez -, a pesquisa permite estimar que hoje provavelmente metade da população brasileira tenha computador em casa (em 2010 eram 39%, sendo 27% destes computadores residenciais conectados à internet). Outro dado que o jornalista deu a partir de uma pesquisa do Meio & Mensagem foi que 70% dos brasileiros costumam acessar blogs, enquanto no resto do mundo a média de acesso a este tipo de ferramenta é de 50%. De acordo com Rovai, a internet hoje atinge um terço da população mundial, o que caracteriza uma mudança de época e uma mudança no jornalismo. “Isso gerou, por exemplo, o Wikileaks, um jornalismo sem mediação; gerou o Annonymous, grupo de ativistas que protestam por diversas razões e não mostram a face”.

Na opinião dele, não importa a plataforma utilizada pelos comunicadores para divulgar informações, mas sim a quantidade de pessoas que ela atinge. “Internet não é mídia. É uma plataforma que permite que mídias sejam abrigadas nela”, explicou, destacando que não chama estas mídias de redes sociais e sim de plataformas de redes sociais já que as redes sociais na realidade são muito anteriores à internet. “Há quem atribua, por exemplo, o movimento no Egito ao Facebook, mas o Facebook foi apenas a plataforma. As redes sociais somos nós”, ressaltou. Rovai vê estas ferramentas como positivas e democratizantes. “Os jornalistas saem da zona de conforto, suas matérias passam a ser contestadas, desmentidas e comentadas na rede”, avaliou. Segundo ele, o capital já entendeu o que a internet significa e conquista cada vez mais espaço nela, daí a importância de movimentos sociais e sindicatos se apropriarem destas ferramentas de divulgação.

Internet provocou mudanças positivas no jornalismo

Leandro Fortes

Leandro Fortes

Leandro Fortes fez um contraponto complementar à fala de Renato Rovai discutindo a questão interna da reportagem. Para ele, os jornalistas de certa forma se tornaram um pouco mais preguiçosos porque têm hoje certas facilidades trazidas pela internet. Ele aponta que com o advento da internet os jornalistas começaram a perder o monopólio da mediação da informação com o cidadão. Segundo ele, essa perda da mediação exclusiva foi uma coisa boa. “Isso está nos obrigando a pensar nossa profissão e pensar sobre aquilo que nós fazemos de outra forma”, ressaltou. Para ele, o jornalismo é uma profissão muito nobre, embora em muitos momentos seja aviltada por maus profissionais. “O que nós fazemos é, diariamente, acordar, decodificar o drama humano, transformá-lo numa linguagem que seja acessível a qualquer pessoa e oferta-la generosamente para que ela possa compreender a dimensão do mundo em que vive. E não é qualquer pessoa que sabe fazer isso. Por isso essa perda de mediação não significa que haja uma decadência no jornalismo”, avaliou. Para Leandro, a decadência, na verdade, é no controle ético da atividade jornalística e na maneira como o jornalismo se submeteu a interesses que nada tem a ver com o jornalismo. “Neste ponto, a intervenção das redes sociais, a ação da internet e a intervenção do cidadão comum no trabalho do jornalista é extremamente positiva”, opinou.

Leandro contou que é um ativista de Facebook e costuma escrever seus artigos diretamente nesta ferramenta para depois publicá-los no blog ou em outros locais, trilhando um caminho inverso do que normalmente acontece. “Eu hoje recebo muitas pautas de cidadãos do Brasil inteiro, checo estas pautas e transformo muitas delas em matérias da Carta Capital”, relatou. Ele informou que a redação da Carta Capital sempre foi enxuta, hoje é formada por apenas 11 pessoas e a revista tinha uma visibilidade muito restrita não só pelo fato de não pertencer a uma grande corporação de mídia, mas também porque a distribuição de revistas e jornais no Brasil é controlada pelas grandes corporações. “Com a utilização correta da internet, não apenas da empresa, mas de nós jornalistas, nós conseguimos subverter ligeiramente o que sempre se chamou de mídia alternativa para o que chamamos agora de ‘alternativa à mídia’. Conseguimos de forma exponencial disseminar a produção informativa da revista na rede”, explicou.

O repórter avaliou que o movimento sindical organizado com uma estratégia de comunicação pensada e, se possível, de forma unificada pode modificar completamente o sistema de comunicação no Brasil. “É aí que entra o trabalho do repórter, do jornalista”, pontuou. Segundo ele, com a queda da obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão começou a se disseminar uma falsa noção de que qualquer pessoa pode fazer jornalismo. “Colocar uma informação na rede não é fazer jornalismo. Republicar uma informação do Wikileaks não é jornalismo. É um direito à informação. Processar a informação é o trabalho do jornalista, e esse é um trabalho de uma vida toda”, disse. Para Leandro, o profissional tem que ser treinado pra isso, estudar e fazer isso a vida inteira para achar, em algum momento, que está fazendo bem o trabalho. Segundo ele, as grandes empresas também não querem o diploma porque desejam formar seus jornalistas de forma doutrinária, daí a existência de vários cursos de trainee que tiram a visão holística do jornalismo já no profissional recém-formado.

Leandro concordou com a visão geral compartilhada por boa parte dos palestrantes do curso de que a mídia brasileira, com raras exceções, hoje se tornou instrumento orgânico da direita. “A mídia no Brasil é uma mídia de opinião voltada para os interesses do grande capital e do latifúndio”, ressaltou. “Uma das saídas é começarmos, no meio sindical, por exemplo, a formar jornalistas do movimento sindical para informação no movimento sindical”, sugeriu. Pessimista, avaliou que que a função social do jornalismo hoje está se perdendo. “Vivemos um mau momento, mas temos núcleos importantes de resistência, só que esta resistência não pode ser feita só por jornalistas. Aí sim entra o conceito de rede social. No Facebook eu não me sinto jornalista, me sinto alguém que contribui e recebe contribuições para melhorar o jornalismo”, concluiu.