*No auge das discussões sobre o “Estatuto da Igualdade Racial”, as opiniões contrárias à aprovação do texto pelo Congresso procuram caracterizá-lo como uma ameaça ao convívio supostamente pacífico que reinaria entre os vários
segmentos étnicos da sociedade brasileira. É o caso agora do editorial intitulado “Grave Ameaça”, publicado na edição de 6 de janeiro de O Globo.
No texto, o jornal condena Brasília por “importar modelos aplicados em sociedades diferentes da nossa”, referindo-se aos Estados Unidos, “país símbolo dessas ações ditas afirmativas”, como ressalta. Como se, desde pelo menos a Segunda Guerra, o Estado e a sociedade brasileira não tivessem sido contumazes importadores de modelos emanados da sociedade norte-americana.
ou não quer lembrar que a situação do negro brasileiro hoje é resultante de um processo abolicionista que, ao instituir uma nova ordem social no país, foi jogando na rua da amargura, sem terra, sem moradia e sem trabalho digno, através de gerações, milhões de ex-escravos e descendentes. E que, com relação aos livres ou libertos em 1888, a nova ordem os foi empobrecendo e marginalizando, pela preferência que dirigiu à mão de obra recém chegada, principalmente da Europa. Então, o negro brasileiro, sim, é pobre porque é negro ? a palavra aí entendida como sinônimo de “descendente de africano
escravizado”.
alimentado, vivendo em família abastada, letrada e com bem estruturados hábitos de consumo cultural?
qual se oferecia aos estudantes carentes de diversas origens uma grade curricular dividida em “cultura técnica” e “cultura geral”, que nos propiciava a todos a possibilidade de acesso ilimitado ao mundo do conhecimento. E que, pelo menos no nosso ambiente, guindou da pobreza para o sucesso profissional muitos jovens, hoje sessentões, na época nem tão
brilhantes nem tão disciplinados quanto poderiam ou deveriam ser.
que não nos deixam mentir. Dessa exclusão é que se nutre a violência que abala as grandes cidades brasileiras, a qual se reveste de fortes componentes etno-raciais.