Por Najla Passos, maio de 2005
 

É o próprio editorial da revista que anuncia: a Veja desta semana tem 120 páginas de puro conteúdo editorial. São 40 acima da média: 26 reportagens, 38 infográficos e tabelas, 90 fotografias. O motivo? Endurecer o ataque àquele que a revista considera hoje seu principal inimigo: o presidente da Venezuela, Hugo Chaves, tratado pela publicação como o “monstro” que ameaça a tranqüilidade do continente latino-americano. (Ver também o artigo “Quem precisa de Veja?”)

Em meio a informações mentirosas e análises contestáveis, a reportagem da revista também descreve porque a Venezuela deixou de ser uma democracia, colocando em risco as liberdades individuais do seu próprio povo. Matéria da Folha de São Paulo desta terça-feira (03/05) põe por terra 70,5% das críticas empreendidas: é esse o percentual de venezuelanos que aprovam o governo Chaves, conforme instituto de pesquisa credenciado daquele país.

A edição de Veja também não deixa de empreender ataques diretos a vários de seus outros inimigos históricos, como o comunismo de Fidel Castro, o fundamentalismo de Saddam Hussein e a vitalidade contestatória do MST de João Pedro Stédile. Manda recados até mesmo para o presidente Lula que, apesar de estar surpreendendo positivamente a elite internacional com a dita “condução racional da economia brasileira”, ainda não rompeu, em definitivo, as relações com a Venezuela.

Mas para entender, de fato, porque uma revista recruta até mesmo o tradicional espaço reservado à publicidade (leia-se lucro!) para ocupá-lo com matérias, é preciso analisá-la não só pelo que publica, mas também pelo que deixa de publicar. A edição de Veja desta semana deixa de reportar os dois principais acontecimentos na ótica dos movimentos populares: a queda do presidente do Equador, como marco na América Latina, e a Marcha Nacional pela Reforma Agrária, no Brasil.

E não poderia mesmo ser diferente. Conforme Bernardo Kucinsk, Veja funciona como “a usina ideológica dos conceitos e pré-conceitos da classe média”. Como tal, precisa conquistar corações e mentes para combater o que é contrário ao status quo. Ou como costuma avisar o jornalista José Arbex, “Veja é a única revista estadunidense escrita em português”. Como tal, precisa defender os interesses do “império”. Torna-se desnecessário, neste quadro, esclarecer porque a deposição do presidente do Equador e a Marcha dos Sem-Terra no Brasil foram preteridas nas muitas páginas desta edição “mais do que recheada” de Veja.
 

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Najla Passos é jornalista e mestranda em Comunicação Social pela UFMT

Leia também: Quem precisa de Veja?