O diretor do documentário “A Morte do Operário”, o austríaco Michael Glawogger, segue as “mulas humanas” do vulcão indonésio Kawah Ijen, os trabalhadores do matadouro do mercado de carne de Port Harcourt (Nigéria), os desmontadores de petroleiros de Gaddani (Paquistão), os operários metalúrgicos chineses e mineiros clandestinos ucranianos para denunciar que os trabalhos mais miseráveis não desapareceram do planeta.
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“Uma das coisas mais tristes é que a única coisa que um homem pode fazer durante oito horas, dia após dia, é trabalhar. Não se pode comer durante oito horas, nem beber oito horas, nem fazer amor oito horas… A única coisa que se pode fazer durante oito horas é trabalhar. E esse é o motivo pelo qual o homem se torna tão desgraçado e infeliz a si mesmo e os demais”, dizia o escritor norte-americano William Faulkner. É com essa reflexão que começa “Workingman’s Death” (A Morte do Operário) – filme completo com legendas no final do artigo – , um impressionante documentário que percorre metade do mundo para denunciar a existência de trabalhos miseráveis que, na sua face mais desumana, praticamente desapareceram dos países ricos.
O diretor do documentário, o austríaco Michael Glawogger, segue as “mulas humanas” do vulcão indonésio Kawah Ijen, os trabalhadores do matadouro do mercado de carne de Port Harcourt (Nigéria), os desmontadores de petroleiros de Gaddani (Paquistão), os operários metalúrgicos chineses e mineiros clandestinos ucranianos para denunciar que os trabalhos mais miseráveis não desapareceram do planeta, apenas se tornaram invisíveis para os olhos dos cidadãos dos países industrializados.
“O trabalho pode ser muitas coisas. Com frequência mal é visível. Às vezes é difícil de explicar. E, em muitos casos, impossível de retratar. Mas o duro trabalho manual é visível, explicável e retratável. É por isso que com frequência penso que é o único trabalho real”, opina Glawogger, que ganhou o Prêmio Especial do Júri no Festival de Cinema de Gijón (Espanha) por Workingman’s Death.
FILME ONLINE: https://www.youtube.com/watch?v=1wC21KrGEJc
LEGENDA: http://img854.imageshack.us/img854/5664/r99n.jpg
Conheça as atividades denunciadas no documentário. Longe de acabar, elas continuam a degradar a condição humana:
1. “Mula humana” no vulcão
Todos os dias, por umas miseráveis moedas, dezenas de homens sobem ao vulcão indonésio Kawah Ijen para, asfixiados por fumos tóxicos, arrancar enormes blocos de enxofre das suas entranhas. Sobem ao vulcão entre cantos e tosses, mas descem carregados como mulas, com mais de 100 quilos de mineral deformando às suas costas. Numa cena do filme “Workingman’s Death”, um mineiro, possivelmente a gozar, conta a outro como beijou uma mulher francesa que tinha acabado de conhecer. “Eu estava com o nariz sujo por causa dos vapores do enxofre, mas ela deixou-me beijá-la. Foi muito bom.” É cada vez maior o número de turistas que vêm ao vulcão para tirar fotos ao lado das “mulas humanas”.
2. Trabalhador do matadouro numa cidade petroleira
O nigeriano Isaac Mohammed levanta-se todos os dias às cinco da manhã para ir ao matadouro da sua cidade degolar cabras e vacas. Trabalha no mercado de carne de Port Harcourt, uma cidade do delta do rio Níger na qual convivem a pobreza extrema com a ostentação das petroleiras ocidentais, como a Shell. Durante a sua jornada, os trabalhadores do matadouro arrastam pesadas cabeças de vaca pela lama para leva-las até à fogueira, onde são cozidas para venda. E, no final do dia, se não levaram uma chifrada de um bovino, muitos completam o seu miserável salário com outros trabalhos, como conduzir um táxi-mota.
3. Desmontadores de navios petroleiros
Muitos pastunes (etnia) são pobres. Por isso acabam por procurar ganhar a vida em lugares como Gaddani, um porto no Paquistão convertido em cemitério de barcos gigantescos. Em Gaddani, milhares de trabalhadores desmontam cargueiros e petroleiros para convertê-los em placas de aço. “Um passo em falso e é uma queda de 80 metros. Ou te cai um pedaço de aço na cabeça. Ou o óleo e os gases residuais incendeiam-te. Temos a morte sempre presente”, explica um trabalhador em “Workingman’s Death”. Eles trabalham durante um ano e depois, com sorte, poderão voltar durante um mês a casa. “O pagamento nunca foi suficiente, nem antes nem agora”, lamenta um homem que trabalha na área desde 1991. “Alá encomendou-nos esta tarefa”, proclama outro.
4. Metalúrgico na China
A província de Liaoning, no nordeste da China, acolhe alguns dos maiores altos-fornos do país e do mundo. Enquanto a Alemanha converte algumas das suas antigas fundições em parques temáticos para crianças, como fez a cidade de Duisburg com as suas gigantescas siderúrgicas em 1985, a China faz o movimento contrário e expande os seus altos-fornos para fornecer ferro e aço ao mundo. Nas fundições, os operários chineses trabalham de sol a sol em condições penosas, como faziam os empregados de Duisburg há mais de meio século.
5. Mineiro na ratoeira nevada
“Temos sempre medo. Um desmoronamento de 10 centímetros e é o fim. Não há forma de nos tirarem daqui”, confessa um mineiro ilegal ucraniano no filme de Michael Glawoggfer. Junto com outros companheiros da bacia de Donbass (região ucraniana), procura carvão em filões aos quais os seus avós chamavam “ratoeiras”. Fora da mina, as mulheres carregam o carvão no meio da neve, até duas toneladas por dia cada uma. Em frente à câmara, os mineiros gozam com Aleksei Stajanov, o famoso mineiro transformado em ídolo pela propaganda soviética em 1935, depois de extrair mais de cem toneladas de carvão numa só jornada. “Nós não somos movidos pelo entusiasmo. Aquilo foi uma palhaçada.”