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[Por Rosângela Ribeiro Gil – De São Paulo] A presidente do Conselho Curador da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), Rita Freire, foi eleita em novembro de 2015 para um mandato que terminava em 2017. Ela, no entanto, foi cassada por Michel Temer, tão logo este assumiu a Presidência da República após Dilma Rousseff ser afastada do mandato para o qual foi eleita. Nesta entrevista especial ao Boletim NPC, ela mostra como a sociedade brasileira está sendo prejudicada com o desmonte da comunicação pública.

Em 1º de setembro último, o governo editou a Medida Provisória 744 que alterou a Lei no 11.652, de 7 de abril de 2008, criadora da EBC. “Numa canetada só ele comete um crime contra a sociedade brasileira, desmontando toda uma estrutura democrática e plural de comunicação”, indigna-se Freire.  Para ela, a MP significa que a sociedade perdeu a voz e está sob censura.

Em tempos estranhos como o que o Brasil vive, é importante explicarmos o que é a comunicação pública e o que ela difere da oficial ou estatal. Pode falar sobre isso?

Rita Freire – Primeiramente, precisamos explicar que a comunicação pública é um direito assegurado pela Constituição, que definiu que o país deveria ter um sistema de comunicação em complementaridade ao regime privado, estatal e público. Ou seja, é quando a comunicação não está submetida aos ditames e ordens do governo de plantão, de partidos políticos e do mercado. É um sistema que existe a partir da gestão soberana da sociedade, com participação em caráter deliberativo para que seja realmente um sistema público.

Como estava estruturada a EBC, depois de oito anos de existência?

Rita Freire – Além de ser uma empresa com vários veículos, com nove rádios, a TV Brasil chegava à Amazônia e ao Tocantins. Tinha uma agência de notícias que atendia a mídia estatal, privada, livre e alternativa; e uma rádioagência que distribuía conteúdo para rádios comunitárias. Além de todo esse conjunto, a empresa tinha um papel de organizar toda a rede nacional de comunicação pública, que envolve as mídias dos estados, universitárias e, do ponto de vista do nosso entendimento, as comunitárias e alternativas.

Não é uma comunicação oficial, de governo ou governista. Não é uma comunicação de mercado.
Rita Freire –
Exatamente. É isso que define uma comunicação pública. Em vários países do mundo essa comunicação está sob a gestão de conselhos que representam a sociedade. E era essa a condição da EBC até sair a MP 744, que afastou a sociedade da gestão da empresa ao extinguir o Conselho Curador, acabou com a sua autonomia ao determinar que a presidência da empresa pode ser trocada a qualquer tempo pelo Presidente da República. Isso significa que, se ela não estiver atendendo aos interesses do presidente ou do governo de plantão, ela muda de gestão. O Conselho Curador foi substituído por um conselho de administração formado por ministros do governo, que passa a definir todo o conteúdo a ser gerado e distribuído.

Um atentado à liberdade de expressão?

Rita Freire – Total. Com uma canetada esse governo se sentiu no direito de tirar das mãos da sociedade o seu sistema de comunicação pública. A EBC era o coração desse sistema público e democrático de comunicação, que tinha a responsabilidade, ainda, de fomentar a produção independente e regional. Ela nasceu como uma contribuição de fomento à radiodifusão pública. Foi um erro não fortalecer a comunicação pública, restringindo, inclusive, o envio de recursos públicos para a EBC. Atacar a EBC é desmontar esse sistema. Passamos a uma fase de resistência agora.

Como era formado o Conselho Curador?

Rita Freire – Ele era integrado por 22 membros, sendo 15 da sociedade civil, dois do Congresso Nacional, um da área dos trabalhadores e quatro do governo. O conselho poderia até destituir o presidente da EBC [que tinha mandato de quatro anos]. Destaco uma ação importante do nosso Conselho que era o de assegurar conteúdo infanto-juvenil de qualidade. Éramos a única TV aberta com essa programação diferenciada, feita para a criança e o jovem do País. Esse governo já cortou recurso que garantia esse conteúdo. Na verdade estamos vivendo um estado de exceção, vivendo fraudes dentro da vida institucional brasileira. A EBC está sendo tratada como um prêmio de consolação para o deputado Eduardo Cunha [cassado no dia 13 de setembro último] por ter iniciado o processo de impeachment contra a presidente eleita Dilma Rousseff, indicando o presidente da empresa, que fez muitos estragos quando também esteve à frente do setor de comunicação da Câmara dos Deputados. Se a EBC não for aniquilada, nas condições impostas pela MP, cumprirá apenas um papel de assessoria de imprensa do governo.