Com a justificativa de combater “fake news”, mudança no sistema de busca pode restringir o acesso a sites alternativos
[Por Andre Damon e Niles Niemuth, do WSWS, com tradução de Inês Castilho, do Outras Palavras]
Nos últimos três meses, desde que o Google anunciou seus planos de não deixar que usuários acessem “fake news” (notícias falsas), o tráfego global de um amplo leque de organizações de esquerda, progressistas, contra a guerra ou em favor dos direitos democráticos teve queda significativa.
Em 25 de abril, o Google anunciou que havia implementado mudanças em seu serviço de busca para tornar mais difícil acessar o que chamou de informação de “baixa qualidade”, um conceito que inclui as chamadas “teorias de conspiração” e “fake news”. A empresa afirmou, num post de seu blog, que o propósito central da mudança em seu algoritmo de busca era obter maior controle na identificação de conteúdo considerado duvidoso em seus manuais. Declarou que havia “melhorado nossos métodos de avaliação e atualizado os algoritmos” de modo a “evidenciar conteúdos mais autoritários”.
O texto continuava: “No mês passado atualizamos nossas Diretrizes de Avaliação em Qualidade de Busca para fornecer exemplos mais detalhados de páginas de baixa qualidade na web, para que os avaliadores as denunciem adequadamente”. Esses moderadores são instruídos para sinalizar “experiências desagradáveis de usuários”, incluindo páginas que apresentem “teorias da conspiração”, a menos que “a consulta indique claramente que o usuário está buscando um ponto de vista alternativo”.
O Google não explicita o que quer dizer com a expressão “teoria da conspiração”. Usando a categoria ampla e amorfa de “notícias falsas”, o objetivo da mudança no sistema de busca é restringir o acesso a sites alternativos, cuja cobertura e interpretação dos fatos conflitam com as de meios de comunicação do establishment tais como o New York Times e o Washington Post.
Ao sinalizar conteúdos de modo que não apareçam nas primeiras páginas dos resultados de busca, o Google é capaz de bloquear o acesso dos usuários a eles. Dado o fato de que grandes quantidades de tráfego na rede são influenciadas pelos resultados de busca, o Google é capaz de efetivamente esconder ou soterrar o conteúdo divergente, por meio da manipulação de rankings de busca.
Exatamente no mês passado, a Comissão Europeia multou a empresa em 2,7 bilhões de dólares por alterar resultados de busca para dirigir os usuários, de forma fraudulenta, a seu próprio serviço de vendas, o Google Shopping. Agora, parece que o Google está usando esses métodos criminosos para impedir que os usuários acessem visões políticas que a empresa julga indesejáveis.
O World Socialist Web Site (WSWS) foi um dos alvos dos novos “métodos de avaliação” do Google. Enquanto em abril de 2017 as buscas do Google deram origem a 422.460 visitas ao WSWS, este mês o número caiu para cerca de 120 mil, uma queda de mais de 70%. Mesmo usando termos de busca tais como “socialista” e “socialismo”, leitores nos informaram que tiveram cada vez mais dificuldade para localizar o World Socialist Web Site nas buscas do Google.
De acordo com o serviço de “ferramentas do webmaster” do Google, o número de buscas que resultaram em visualizações de conteúdo do World Socialist Web Sitecaiu de 467.890 para 138.275 por dia, nos últimos três meses. A posição média dos artigos nas buscas caiu da 15,9 para a 37,2 no mesmo período.
David North, presidente do Conselho Editorial Internacional do WSWS, afirmou que o Google está engajado em censura política. “O World Socialist Web Site existe há cerca de 20 anos”, disse, “e desenvolveu uma ampla audiência internacional. Durante a última primavera, o número de pessoas que visitaram o WSWS por mês excedeu 900 mil.”
“Embora um percentual significativo de nossos leitores entrem no WSWS diretamente, muitos internautas acessam o site por meio de ferramentas de busca, das quais o Google é a mais usada”, disse David North, que coordena o comitê editorial do site. Ele prosseguiu: “Não há explicação inocente para uma queda tão acentuada no número de leitores provenientes das buscas do Google, quase da noite para o dia.”
“A alegação do Google de que está protegendo os leitores de “fake news” é uma mentira cuja motivação é política. O Google, um grande monopólio, com vínculos muito estreitos com agências estatais e de inteligência, está bloqueando o acesso ao WSWS e outros sites progressistas e de esquerda por meio de um sistema de manipulação das buscas.”
Nos três meses desde que o Google implementou as mudanças em seus mecanismos de busca, menos gente acessou vários outros sites de esquerda e contra as guerras. Com base em informações disponíveis no Alexa Analytics, outros sites que tiveram súbitas quedas no ranking incluem o WikiLeaks, Alternet, Counterpunch, Global Research, Consortium News e Truthout [1]. Mesmo grupos proeminentes em favor de direitos democráticos, como a União Americana de Liberdades Civis (American Civil Liberties Union) e a Anistia Internacional, parecem ter sido atingidos.
De acordo com o Google Trends [ranking de sites mais buscados], a popularidade do termo “fake news” quase quadruplicou no nício de novembro, no período das eleições nos EUA, à medida em que o Partido Democratas, os meios de comunicação do establishment e as agências de inteligência procuraram responsabilizar a “informação falsa” pela vitória de Donald Trump sobre Hillary Clinton.
Em 14 de novembro, o New York Times afirmou que o Google e o Facebook “enfrentaram crescentes críticas porque notícias falsas em seus sites teriam influenciado o resultado das eleições presidenciais” e estariam tomando providências para combater as “fake news”.
Dez dias depois, o Washington Post publicou o artigo “Esforço de propaganda da Rússia ajudou a espalhar ‘fake news’ durante eleição”, Atribuiu a informação a um “especialista”, citando um grupo anônimo conhecido como PropOrNot, que apurou uma lista de sites de “fake news” acusados de espalhar “propaganda russa”.
A lista incluiu vários sites classificados pelo grupo como “de esquerda”. Significativamente, entre eles estava o globalresearch.ca, que geralmente republica artigos do World Socialist Web Site.
Depois da crítica generalizada ao que mais parecia uma lista suja de sites antiguerra e antiestablishment, o Washington Post foi forçado a publicar uma retratação, declarando: “O Post, que não nomeou nenhum dos sites, não confirma a validade das descobertas do PropOrNot”.
Em 7 de abril, a agência Bloomberg noticiou que o Google estava trabalhando diretamente com o Washington Post e o New York Times para “checar os fatos” de artigos e eliminar “notícias falsas”. A isso se seguiu a nova metodologia de busca do Google.
Três meses mais tarde, dos 17 sites declarados como sendo de “fake news” pela desacreditada lista suja do Washington Post, 14 tiveram queda no ranking global. O declínio médio do alcance global desses sites é de 25%. Alguns deles viram seu alcance global cair até 60%.
“As ações do Google constituem censura política e são um ataque clamoroso à liberdade de expressão”, afirmou North. “Num tempo em que a desconfiança em relação à mídia empresarial é generalizada, esse gigante corporativo está explorando sua posição monopolista para restringir o acesso público a um amplo espectro de notícias e análises críticas.”
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[1] O World Socialist Web Site divulgou dados que estimam a queda de 13 sites na busca do Google:
Wsws: – 67%
Alternet: – 63%
Global Research: – 62%
Consortium News: – 47%
Socialist Worker.org: – 47%
Media Matters: – 42%
Common Dreams: – 37%
International Viewpoint.org: – 36%
Democracy Now: – 36%
Wiikileaks: – 30%
Truth Ouut: – 25%
Counter Punch: 21%
The Intercept: – 19%.
Créditos da foto: Reprodução
Fonte Carta Maior: http://bit.ly/2wEpvvw