6 e Meia do NPC: trocando ideias sobre a Comunicação Sindical
O programa 6 e Meia do NPC e apresentado pela jornalista Claudia Santiago e tem o apoio da Fundação Rosa Luxemburgo. Este programa foi ao ar no dia 25 de março de 2021.
Na contra correnteza da avalanche de informações digitais, a comunicação contra-hegemônica de sindicatos buscar abrir brechas no espaço informacional, levando conteúdos que deem conta de duas dimensões principais: formação e informação.
(Rafael Lopes) De acordo com o Relatório de Visão Geral Global de 2020 , as redes sociais contam atualmente com mais de 3,8 bilhões de usuários. Por aqui, no Brasil, mais de 140 milhões de pessoas, ou 66% do total de habitantes, estão conectadas à alguma plataforma de comunicação digital. Ainda de acordo com informações do estudo, o país também ocupa o terceiro lugar quando o assunto é tempo conectado à internet via smartphone: média de 3 horas e 31 minutos, ficando atrás apenas de Filipinas e Colômbia. Já as redes sociais mais acessadas pelos brasileiros são: Facebook, WhatsApp, Youtube e Instagram.
E num mundo cada vez mais mediado por essas ferramentas, com milhões de novas publicações, os algoritmos criam a sensação de que esse terreno funciona com uma lógica democrática e horizontal.
Na contra correnteza da avalanche de informações digitais, a comunicação contra-hegemônica de sindicatos buscar abrir brechas no espaço informacional, levando conteúdos que deem conta de duas dimensões principais: formação e informação.
E foi nesse clima de bate-papo descontraído que o roteirista e diretor de cinema Deivson Fiuza, e a pedagoga Letícia Montandon, pós-graduada em gestão escolar e coordenadora da Secretaria de Imprensa do Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF) falaram sobre os desafios e possibilidades de construção de luta coletiva na era digital.
O trabalho cinematográfico de Fiúza aborda os embates da organização da classe trabalhadora, e entre eles está o longa “Abraço: a única saída é lutar”, de 2019;
Para Fiuza, os principais pontos fracos da comunicação sindical hoje estão no baixo alcance e baixa visualização das postagens. Ele também aponta a falta de engajamento da base dos trabalhadores com as redes sociais dos sindicatos e entidades representativas.
“A CUT é a maior central sindical da América Latina, a quinta maior do mundo, tem quase 4 mil sindicatos filiados. Isso representa 14% do total das entidades. Isso dá em termos de trabalhadores associados aproximadamente 8 milhões. Isso é um número bem grande. Mas quando pegamos os números do Instagram, uma rede em crescimento, a CUT tem pouco mais de 87 mil seguidores”, afirma o cineasta.
Já Letícia aponta como um dos obstáculos envolver a base sindical nas publicações. Mesmo assim, ela percebe que atualmente há um esforço dos movimentos sociais em apresentar conteúdos mais segmentados e que buscam maior interação com os seguidores: “Estão entendendo que precisamos dar um melhor tratamento à informação. Isso é desafiador! Ter que descobrir o caminho. A comunicação sindical precisa sair da bolha. Esse é o desafio. A gente percebe em nossa base que cerca de 80% dela é filiada. Os professores são bem engajados. Temos uns 40 mil. No Insta, por exemplo, batemos 23 mil. No Face temos quase 70 mil. E nós trabalhamos muito com impulsionamento. E agora estamos partindo para segmentação de informação… de saber levar os dados também para os profissionais que estão aposentados”, detalha.
Comunicação além da base
O famoso furar a bolha não é de fato tarefa simples. Toda a engenharia do Vale do Silício rende bilhões para as empresas que disputam esse seguimento. E Zuckerberg e sua turma não iriam privilegiar através dos algoritmos deles conteúdos que colocassem em xeque toda essa indústria da informação.
Existem três fatores principais para que uma postagem ganhe destaque no feed de cada usuário. Temporalidade, engajamento e relacionamento. Resumidamente, esses três pilares vão organizar o que é oferecido a cada pessoa. Então, quanto mais comentários, buscas ativas, compartilhamentos orgânicos um perfil tem, mais ele tende a ver seu conteúdo sair e ser apresentado no feed de seus seguidores.
E, nesse sentido, a análise de Fiuza sobre o baixo engajamento das postagens das páginas e perfis de sindicatos e outras entidades da sociedade civil de esquerda ganha relevância: “Muito sinceramente, a comunicação sindical militante por mais bem feita e por mais estratégica que ela seja, seu efeito em uma sociedade capitalista de direita é baixo. Uma pessoa dificilmente vai mudar de opinião por conta de uma postagem que ela tenha acesso, pura e simplesmente”.
E essa resistência aos conteúdos contra-hegemônicos, também tem relação com a formação do indivíduo dentro da sociedade capitalista. Pois esse processo é sempre atrelado à ideologia dominante. Ainda de acordo com o cineasta, por esse motivo, é preciso ter uma comunicação também que dê conta da dimensão da formação nos conteúdos que são veiculados.
Os sindicatos de esquerda não podem pensar apenas em comunicação de informação. Têm que ter uma comunicação de formação. Uma comunicação de construção de novas visões. Essa comunicação constrói, garante Fiuza, falando de um tipo de comunicação que também está ligada às artes.
Forma, informa e organiza
“Se a gente quer essa mudança de comportamento precisamos de uma comunicação formativa. A gente tem que trabalhar essa comunicação para que a gente faça essa mudança gradativamente. Estamos tentando abrir um caminho”, avalia Letícia, comentando em seguida a experiência com novas formas e formatos em comunicação: “Aqui no sindicato trabalhamos em várias frentes e com várias ferramentas de comunicação. Nas listas de transmissão do Whatsapp, por exemplo, estamos trabalhando com notinhas curtas e incisivas, com a intenção de causar uma reflexão na categoria. Um conteúdo rápido, dinâmico abordando o que tem acontecido no momento. E estamos percebendo que o compartilhamento tem sido maior com esse tipo de conteúdo. Vídeos curtos, com chamadas também curtas”.
Para Fiuza, a formação tem que ser uma preocupação muito maior para a comunicação de esquerda: “A comunicação serve para marcar uma posição. Obviamente que não podemos deixar de fora o poder que as grandes empresas de comunicação possuem na disputa de concepção de mundo e o alcance que possuem para manutenção do status quo. Elas criam, distorcem a realidade sem nenhuma dificuldade”.
- Rafael Lopes é jornalista
- Edição de texto: Moisés Ramalho, jornalista e doutor em Antropologia.