Por Loianne Quintela e Rose Veronez, do Portal Andifes, setembro de 2004

A criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ) vem sendo muito debatida, especialmente depois que o Projeto de Lei, elaborado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), foi enviado ao Congresso, no dia 09 de agosto, pelo Presidente Lula. Os principais objetivos do Conselho serão conferir o registro profissional, fiscalizar o exercício ético da profissão e acompanhar a formação do futuro profissional. Algumas entidades representativas da classe vêem isso como a imposição de limites à atividade jornalística, como é o caso da Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Para contribuir com essa discussão o Portal Andifes entrevistou o presidente da Fenaj, Sérgio Murillo de Andrade, e o presidente da ABI, Maurício Azêdo.


Sérgio Murillo de Andrade, presidente da Fenaj

Portal Andifes – Quais são as principais propostas do CFJ?

Sérgio Murillo – Temos quatro motivos para se ter o Conselho: regrar o acesso a nossa profissão; fiscalizar o exercício profissional – hoje isso é feito pelo Ministério do Trabalho; defender, lutar por um bom ensino de Jornalismo e zelar pelo cumprimento da ética profissional.

P.A. – A Fenaj afirma que as discussões sobre a criação de um Conselho Federal de Jornalismo são muito antigas e o projeto deste Conselho, com o texto e este formato, surgiu em 1996. Por que, então, só agora o projeto foi enviado para o Congresso?

Sérgio – Enviamos o Projeto agora ao Congresso, porque a discussão foi quase toda realizada no ambiente sindical, o que, para nós, jornalistas, foi muito difícil. A criação do Conselho é como se estivéssemos amputando um de nossos braços, porque estaremos criando outra entidade, com algumas funções que eram nossas, como por exemplo a defesa de um ensino de qualidade em Jornalismo. Desde 1997, a Fenaj vem atuando com o programa de estímulo à qualidade do ensino em Jornalismo. A questão da ética também, temos uma comissão de ética dentro da Fenaj, mas não é o ambiente adequado.

PA- O senhor afirmou que nenhuma mudança no texto do projeto foi feita pelo governo, só pela própria Fenaj. Mas quais foram essas mudanças?

Sérgio – O Conselho é uma entidade livre, autônoma, não tem nenhuma ligação com o Governo. Isso está claro no texto. O Presidente da República apenas enviou o Projeto de Lei ao Congresso, porque Conselhos Federais são autarquias e, por isso, só o Presidente da República pode apresentá-lo para votação.

A mudança feita pela Fenaj está no Artigo 1º que dispõe sobre as atribuições da entidade, acrescentando que os Conselhos Federal e Regional devem orientar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de jornalista e da atividade de jornalismo. Queremos preservar o profissional de jornalismo, zelar pela sua ética. Por enquanto, o jornalista tem respondido isoladamente na sua atividade. Qualquer ato irregular será investigado, por meio do Conselho, e todos os envolvidos deverão ser punidos.

PA- Apesar de todo o barulho feito pela mídia, o senhor acha que o CFJ será implantado?

Sérgio – Quanto à aprovação do Projeto, estou confiante nisso. A poeira está abaixando, estamos conseguindo mais espaço para explicar melhor o projeto no Congresso, a origem de quem o propõe, realizando audiências públicas, tirando a discussão do ambiente da mídia somente. Assim podemos avançar. Claro que o texto deverá ser melhorado, aperfeiçoado, e estamos trabalhando para isso. Tenho certeza que até o final do ano que vem estaremos com o Conselho formado.

Mas é bom destacar que isso é só uma parte da nossa luta, que há anos travamos em busca de um maior zelo pela nossa ética, é uma questão de necessidade regrar a profissão. A grande resistência se faz pelo medo das regras, as pessoas tem mêdo de regras.

Maurício Azêdo, presidente da ABI

Portal Andifes – Como a ABI vê a criação do CFJ, por meio do Projeto de Lei que foi encaminhado ao Congresso?

Maurício Azêdo – A ABI considera que este processo é altamente nocivo, anti-democrático e inconstitucional. A criação deste Conselho agride a constituição de 1988, ao se pretender introduzir na atividade profissional dos jornalistas elementos de coerção e de condicionamento, que vulneram de forma grave uma disposição claríssima da Constituição, parágrafo único do artigo 220, segundo o qual a lei não poderá impor embaraço de qualquer natureza à liberdade de imprensa.

PA – Quais são as principais críticas ao projeto?

Maurício – Nesse projeto, notamos a abstração que a Fenaj formulou e que o Governo aceitou, q

ue é a idéia de que esse Conselho vai orientar, disciplinar e fiscalizar a atividade profissional dos jornalistas. Chama-nos a atenção especialmente estes termos: disciplinar e orientar. Como se vai orientar uma atividade que interfere nas idéias, por meio da introdução do pensamento único? Essa é uma possibilidade: orientar para estabelecer propósitos, caminhos, marcos e signos que sejam seguidos pelo conjunto dos meios de comunicação.

Por outro lado, a expressão disciplinar, prevendo-se inclusive a cassação de registro profissional, e do direito de exercer a profissão, embora contido no projeto. No momento em que o país vive sob estado democrático de direito, consignado na constituição de 1988, o emprego dessa forma disciplinar faz lembrar os luminosos tempos dos ministros da Justiça Gama e Silva e Armando Falcão, que introduziram e consolidaram no país uma política de submissão dos meios de comunicação, para os interesses de uma política que conflitava com os interesses nacionais, com o interesse do povo brasileiro.

P.A. – Frente ao Projeto que foi apresentado, o que o senhor propõe?

Maurício – Estou incitando a todos para estudarem esta questão, analisarem do ponto de vista da aspiração comum, em manter no país uma sociedade democrática, respeitando a Constituição de 88 que, apesar das mutilações que vem sofrendo, ainda é a expressão da aspiração e da luta do povo brasileiro para estabelecer em nosso país um sistema democrático de relações sociais e de relações entre o governo e o conjunto da sociedade.