Por Douglas Pego

Cláudio é a principal liderança e um dos fundadores do Pré-vestibular Comunitário de Manguinhos (PVCM). Manguinhos é uma região de comunidades carentes que fica no bairro de Benfica, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Lá também fica a Fiocruz e a refinaria de Manguinhos.

Cláudio Luiz Barreto Nascimento é carioca. Tem 44 anos, é casado, pai de duas filhas. Um trabalhador que exerceu a profissão de ferroviário pela Flumitrens e é técnico de enfermagem. Atualmente é coordenador do PVCM e grande incentivador da educação em Manguinhos. Para Cláudio o pré-vestibular tem dois grandes objetivos: tirar o medo que o jovem pobre tem do vestibular e criar noções de cidadania.

BoletimNPC – Por que foi criado o PVCM?
Cláudio Barreto. Havia alguns grupos em Manguinhos, que se reuniam para debater sobre a política da comunidade. Um dos grupos idealizou uma forma de aprendizado que não tivesse algum vinculo com o Estado. A idéia de criação do Pré foi fortalecida em uma assembléia, na qual participaram a Fiocruz, a Educafro (uma rede de pré-vestibulares) e lideranças da comunidade como o professor Luís Antônio e sua mãe dona Penha. Uma pessoa analfabeta, mas que analisou a principal via de mudança sócio-político da comunidade. A educação.

BoletimNPC – Qual a política do PVCM? E como ela funciona?
Cláudio. A política do PVCM é tentar acabar com o mito dos jovens e adultos que entraram para o pré com a idéia de impotência frente ao vestibular. Contudo, os coordenadores e professores mostram que esta política do Pré-Manguinhos vai muito além de apenas entrar para universidade, mas quer criar uma noção de cidadania em um novo espaço acadêmico.

BoletimNPC – Os professores do PVCM são remunerados?
Cláudio. Não, pois eles têm uma visão sócio-político sobre a situação dos alunos do pré, não querendo receber nenhuma gratificação. Assim sentem uma gigantesca satisfação e vontade de transferir suas experiências para os alunos e coordenadores.

BoletimNPC – Quais são os cursos que os alunos mais visam na universidade, quando entram no PVCM?
Cláudio. A maioria não sabe ainda o que escolher. No entanto, alguns alunos já têm uma escolha formada e seguem para a área de humanas, pois há um pensamento coletivo de que as matérias da natureza (exatas) são objetos utópicos para eles e criam uma rejeição para essas matérias.

BoletimNPC – Quantos alunos passaram pelo PVCM?
Cláudio. Hoje estamos na quarta turma. 150 alunos chegaram até o final do curso.

BoletimNPC – Quantos alunos conseguiram entrar para universidade?
Cláudio. Em quatro anos de Pré, 26 alunos entraram para a universidade, sendo que a metade está nas públicas (UERJ e UFRJ) e o restante está nas particulares (FACHA e PUC).

BoletimNPC – Como é a relação entre a comunidade de Manguinhos e o Pré-vestibular?
Cláudio. É um vinculo que está crescendo. Nós tentamos mostrar para a comunidade que o projeto Pré-vestibular é um êxito, pois buscamos o que tem de melhor de Manguinhos, a energia e a força dos jovens. Fizemos um outro projeto paralelo, o Sarau Poético, que incentiva e desenvolve o imaginário dos alunos por meio da leitura e da escrita para melhorar a forma de vida da comunidade.

BoletimNPC – Quantas edições já aconteceram deste projeto, Sarau Poético? E como é falar de poesia em Manguinhos?
Cláudio. Já são oito edições. A forma que o Pré adotou para falar de poesia foi mostrar aos alunos que esta linguagem ajudaria no acesso para universidade. O idealizador deste projeto foi o professor Alexandre Faria que mostrava em suas aulas a necessidade da criação e organização do pensamento no papel, para desenvolver um repertório maior de argumentação no vestibular. Destes sarais saíram muitos poetas. Um deles se destaca pela sua facilidade, concisão e clareza ao mostrar sua realidade e vontades em folhas de A4. É o André Luiz Gomes.

BoletimNPC – Os alunos que entraram para as universidades conseguiram entrar para o mercado de trabalho?
Cláudio. Sabemos que o mercado está difícil. Isso não acontece apenas em Manguinhos, mas também em outros lugares do país. No entanto muitos universitários da comunidade conseguem vencer a filtragem do mercado e literalmente nadaram contra a correnteza da “globalização”.
 

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Douglas é estudante de Comunicação Social e participou da primeira turma do curso de Comunicação Comunitária promovido pelo NPC no ano passado. Douglas é morador e ex-aluno do Pré-vestibular de Manguinhos. Entrevista de julho de 2005.