Núcleo Piratininga é referência em comunicação sindical e popular

Cursos têm o objetivo de criar autonomia e independência a quem quer fazer sua própria comunicação

 Por Camila Araujo / O Prelo (Nº 41 / Janeiro 2016)

Uma jornalista e um metalúrgico. Duas profissões totalmente diferentes que se encontraram num ambiente de lutas sociais. Claudia Santiago e Vito Giannotti se apaixonaram à primeira vista na década de 1990 e foram unidos não só pelo amor genuíno que os embalou na época. Eles compartilhavam um sonho: transformar a sociedade em um espaço justo e democrático. Como? Fazendo comunicação do povo e para o povo. Desse sonho nasceu, em 1992, o Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC), com o objetivo de convencer os trabalhadores a disputar a hegemonia na sociedade, através da Comunicação.

“Nós fazíamos praticamente a mesma coisa. Eu era Assessora de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores do Rio de Janeiro (CUT) e ele, como Dirigente Sindical da CUT de São Paulo, fazia boletins informativos para os trabalhadores. A gente tinha muita vontade de que a principal preocupação dos sindicatos fosse a comunicação, porque é através dela que se convence os trabalhadores a lutar por um mundo com justiça e sem exclusão. Juntamos nossas experiências e começamos a expor nossas ideias pelo Brasil afora”, conta Claudia Santiago coordenadora do NPC.

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Com o tempo, as atividades do Núcleo Piratininga foram se acumulando e em 1997, se formalizou como uma organização civil sem fins lucrativos. E foi assim, dando cursos, palestras, seminários, publicando livros e prestando assessoria, que o NPC se tornou referência em comunicação sindical no país.

Contudo, a atenção se voltou para a comunicação das favelas em 2003, após o brutal assassinato de quatro jovens na Chacina do Borel, na Zona Norte da cidade. Naquele momento, Claudia e Vito perceberam que não eram só os sindicatos que precisavam melhorar sua comunicação, mas urgia das favelas cariocas uma necessidade de expressar as vozes de seus moradores. “Todas as matérias que eram publicadas naquele momento, eram na tentativa de criminalizar as vítimas de uma chacina: jovens, negros e pobres. Não havia a versão dos familiares e nem do povo da favela”, aponta Sheila Jacob, jornalista e professora do NPC.

A partir daí é criado o Curso de Comunicação Popular, com o objetivo de incentivar as classes populares a produzir seus próprios meios de comunicação e expressar seu ponto de vista, criando autonomia e independência.“A ideia é fazer com que as pessoas que sofrem violência e preconceito no seu dia a dia e o desrespeito com seus direitos mais básicos, se tornem comunicadoras populares. É dar voz àqueles que não tem voz, para que se compartilhe não só as angústias e os sofrimentos, mas também as coisas boas, a cultura, a música e a arte”, ressalta Sheila.

Hoje, o curso é feito com apoio da Fundação Rosa Luxemburgo, parceira do NPC. Todo ano, entre os meses de maio e outubro, se reúnem estudantes, professores, ativistas e trabalhadores das mais diversas categorias profissionais para aprender a fazer comunicação comunitária. Os alunos têm aulas práticas de redação, diagramação, oratória, fotografia, internet e principalmente, aulas de formação política. “Uma preocupação marcante é a formação política dos alunos para qual tipo de comunicação queremos. É a da classe trabalhadora, a comunicação dos oprimidos”, enfatiza Sheila Jacob.

Mais de 400 alunos já passaram pelo curso. Para a jornalista e professora universitária Ana Maria Reis, o encontro de pessoas de variadas origens sociais, permite além da troca de experiências, novas aprendizagens. “Eu fiz o curso em 2013. Com essa experiência, pude conhecer vários e diferentes coletivos de luta popular do estado. No fim das atividades do curso, eu e mais algumas alunas construímos um núcleo de comunicação similar na Zona Oeste pobre do Rio, em Campo Grande: o Núcleo Oeste Carioca de Comunicação Popular (NOC) que nos aproximou de vários movimentos locais da educação, da arte e da cultura”, conta.

Ao final de todas as aulas, os alunos escrevem suas próprias matérias e publicam no jornal Vozes das Comunidades, que é distribuído no dia 7 de setembro, data da manifestação popular conhecida como o ‘Grito dos Excluídos’. O jornal também possui uma versão online, onde alunos e ex-alunos colaboram.

Gizele Martins, do Complexo da Maré conta como o curso popular contribuiu para sua experiência. “Fiz os cursos de comunicação popular do NPC umas quatro ou cinco vezes, o que melhorou bastante minha formação crítica, meus textos e também a minha oratória, já que eu tinha muita vergonha de falar o que eu pensava. Além disso, o curso me serviu como exemplo para fazermos algo parecido no Jornal O Cidadão da Maré. Já fizemos três edições do curso de comunicação comunitária espelhados no NPC”, relata a jornalista e comunicadora comunitária.

Curso anual

Além do Curso de Comunicação Popular, o Núcleo Piratininga também realiza todo ano o Curso Anuel, que reúne dirigentes sindicais, jornalistas, pesquisadores e estudantes de todo o Brasil. Para cada edição é escolhido um tema central rerefente à comunicação. Ao longo de cinco dias, uma série de palestras debatem uma série de questões relacionadas a uma temática geral. Em 2015, o tema foi ‘A Mídia de Esquerda no Combate ao Conservadorismo no Brasil’.

O Curso Anual começou em 1994, em São Paulo, com um público de aproximadamente 30 pessoas. Hoje, ele acontece no centro do Rio de Janeiro e já está em sua 21ª edição, com cerca de 300 participantes. “A ideia desse curso é propor diferentes debates e um diálogo sobre como os sindicatos e os movimentos sociais podem agir diante da nossa realidade social e política”, salienta Sheila.

Outras atividades

Por atuar em várias frentes na comunicação contra-hegemônica, o NPC conquistou o Prêmio Pontos de Mídia Livre do Ministério da Cultura, alcançando o quarto lugar na categoria nacional. Além dos cursos oferecidos, o Núcleo Piratininga dissemina as ideias que o move através da Livraria Antonio Gramsci. Criada em 2011, a livraria é uma referência de esquerda no Rio de Janeiro. Lá, é possível encontrar autores clássicos como Marx, Engels, e até passear pela cultura brasileira com o livro “A República Cantada – do choro ao funk, a história do Brasil através da música”, de André Diniz e Diogo Cunha.

É lá que acontece, desde 2013, o evento Quintas Resistentes, que recebe convidados para falar sobre as diversas formas de luta e resistência que viveram no período da ditadura civil-militar brasileira. Com o objetivo de manter viva a memória daquele período, são entrevistadas pessoas que se destacaram nesse combate, seja na luta armada ou na retaguarda.

Outra forma de resgatar as histórias de luta dos trabalhadores no Brasil e no mundo é com os livro-agendas produzidos anualmente pelo Núcleo. Em 2016, o o tema é Lutadores e Lutadoras na História do Brasil. Fruto de densa pesquisa, a agenda traz todo dia, a trajetória de homens, mulheres, negros, negras, indígenas, camponeses, estudantes, operários e outros lutadores que sonharam e ousaram lutar por um país melhor para a maioria.

Na capa, está Vito Giannotti, in memoriam, um dos grandes idealizadores destas agendas e do NPC. Italiano de sangue e brasileiro de coração, Vito lutou até seu último dia de vida por aquilo que acreditava e sonhava. Ele faleceu no dia 24 de julho de 2015, mas até hoje, permanece vivo nas atividades do NPC e nos corações e mentes que o conheceram.

Mais informações

O NPC possui dois boletins informativos, um com novidades da Livraria Antonio Gramsci e outro com informes de eventos e atividades do Núcleo. Para recebê-los, basta acessar o site e se inscrever.

 

Serviço

 Núcleo Piratininga de Comunicação

Endereço: Rua Alcindo Guanabara, 17, sala 912, Cinelândia

Telefones: (21) 2220-5618 / 2220- 4895

Site: www.nucleopiratininga.org.br

Facebook: facebook.com/npcinstitucional

 

Blog Vozes das comunidades

www.vozesdascomunidades.org

 

Livraria Antonio Gramsci

Endereço: Rua Alcindo Guanabara, 17, térreo, Cinelândia

Telefone: (21) 2220 4623

Email: livraria@piratininga.org.br

Site: www.livrariagramsci.com.br